É “manifesto” que a situação em Lisboa e Vale do Tejo é neste momento “distinta” da encontrada no resto do país ... embora não se perceba porquê. Até aqui, o Governo insistia na tese de que o aumento de testes veio destapar mais casos, mas os especialistas já esclareceram que além disso há mesmo um agravamento da situação sanitária. Agora, há um ajuste no discurso oficial para garantir que não se está a “desvalorizar” a situação e um lote de medidas para garantir que Lisboa não fica descontrolada.
Foram sete horas de reunião de Conselho de Ministros, no Palácio da Ajuda, e um retrato da situação em que o país se encontra, quase dois meses depois de ter começado a desconfinar.
“Estabilidade” foi a palavra de ordem: apesar do aumento de casos na região da grande Lisboa, o primeiro-ministro, na conferência de imprensa que se seguiu à reunião, quis lembrar as boas notícias - o alto número de recuperados, o baixo número de óbitos e o aumento da quantidade de testes realizados - para assegurar que a situação está sob controlo. E foi por isso que Costa lembrou: o aumento de casos era “expectável” assim que se começasse a desconfinar. Só que isso não só aconteceu com os números de Lisboa - na região com mais casos novos nas últimas semanas, os números preocupam.
Costa admitiu, aliás, que continua a não saber qual o motivo para os contágios terem aumentado na Grande Lisboa: as informações da reunião desta quarta-feira no Infarmed, entre especialistas e políticos, não foram “concludentes”, assumiu o primeiro-ministro. “Temos de ter alguma atenção e não pedir aos cientistas para responderem ao que ainda não sabem. Isto é uma investigação em tempo real”, e por isso existem, mesmo nas reuniões quinzenais do Infarmed, “opiniões divergentes e até contraditórias” e conclusões que não permitem ter “grande segurança” na hora de tomar opções políticas, reconheceu.
Três níveis de medidas e de preocupação
Mas foi isso que o Governo teve de fazer e começou por apertar mais nas 19 freguesias de Amadora, Odivelas, Sintra, Loures e Lisboa identificadas como as mais afetadas, neste momento, pelos surtos ativos. Estas continuarão a estar abrangidas pelo estado de calamidade, o que dá ao Governo um quadro legal mais amplo para reforçar os poderes de fiscalização. Enquanto este vigorar, o executivo poderá voltar a impor recolhimento e, para já, ficam proibidos ajuntamentos com mais do que cinco pessoas, uma das medidas que não será imposta no resto do país.
Será também nestes focos que será aplicado o novo programa Bairros Saudáveis, coordenado por Helena Roseta, com o objetivo de higienizar e promover boas práticas nos bairros em causa recorrendo a uma dotação de dez milhões de euros. Ficando uma questão no ar: dado que os especialistas apontam para a coabitação e o ambiente laboral, que implica muitas vezes uma deslocação de transportes públicos, como fatores principais de propagação do vírus, não faltarão medidas mais concretas para responder a esses casos?
As medidas irão impor-se num degradé decrescente, dos casos mais graves para os mais controlados. No resto da área metropolitana de Lisboa irá imperar o estado de contingência, de gravidade menor do que o de calamidade, ficando proibidos os ajuntamentos de dez ou mais pessoas e o consumo de álcool na via pública. Os estabelecimentos, como se sabia desde o início da semana, terão de fechar às 20h, mas há exceções - incluindo os supermercados, que ficarão abertos até às 22h.
O “movimento” em direção ao desconfinamento é maior ao sair da região de Lisboa: o resto do país ficará em estado de alerta, o estado de menor prontidão na Lei da Proteção Civil, apenas submetido às regras gerais (como a proibição de ajuntamentos de mais de vinte pessoas).
Apesar de ter insistido nas boas notícias e na segurança para avançar com o desconfinamento, o primeiro-ministro assumiu que com mais “liberdade” virá mais “responsabilidade” mas também mais poder para as forças de segurança, que passarão a aplicar multas a quem aplicar as novas regras e deixarão de ter “uma ação meramente pedagógica”. A ideia é tirar o gás aos novos surtos e voltar à imagem positiva que Portugal conservava até há semanas, incluindo fora de portas.
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