O Futuro do Futuro

Joe Paton e a Inteligência Artificial: “Estes algoritmos são muito poderosos, mas isso não é o mesmo que ser inteligente”

O cérebro humano precisa apenas de 10 Watts para usar 100 mil millhões de células, mas os novos modelos de inteligência artificial precisam de muitos mais Watts para operarem - e mesmo assim, não entendem os textos e as imagens produzidas pelos humanos, afirma Joe Paton, coordenador do programa de Neurociências da Fundação Champalimaud. Para o cientista é chegada a hora de os algoritmos aprenderem com a Inteligência Natural, mas é também chegado o momento de termos mais cuidado com as redes sociais, que já conseguem decifrar o pensamento dos humanos sem terem de incorporar implantes cerebrais

Joe Paton, coordenador do programa de neurociências da Fundação Champalimaud, considera que a Inteligência Artificial sai beneficiada dos ensinamentos da neurologia, mas também deixa o alerta para a forma como as tecnologias já conseguem decifrar o pensamento humano
NUNO FOX

A Inteligência Artificial (IA) pode ter alcançado o topo da atualidade, mas será que é mesmo inteligente como o nome indica? Em entrevista ao podcast Futuro do Futuro, Joe Paton, coordenador do programa neurociências da Fundação Champalimaud, aproveita para fazer uma retificação: “Estes algoritmos não são muito inteligentes: são muito poderosos, mas isso não é o mesmo que ser inteligente”.

Os novos modelos de IA generativa, que abriram caminho a plataformas como ChatGPT, Midjourney, Bard ou Dall-e, usam uma combinação de redes neuronais e estatística para trabalhar textos e imagens, “mas não entendem o que significam essas imagens ou palavras”, reitera o cientista americano.

Hugo Séneca e Joe Paton nos estúdios da Impresa durante a gravação de mais um episódio do podcast Futuro do Futuro
NUNO FOX

Para Paton, muitos destes novos grandes modelos de linguagem poderiam sair beneficiados com os ensinamentos e descobertas que vêm da neurociência. Tendo em conta que há 100 mil milhões de células com múltiplas funções e formas de interação diferentes, o processo revela especial complexidade. Mas Joe Paton não desarma: “Não sei se vamos reproduzir todos os mecanismos dentro de uma célula, mas podemos reproduzir os princípios”.

No sentido contrário, as tecnologias já começaram a desenvolver mecanismos que ajudam a desvendar o que se passa no cérebro humano. A ponto de ameaçarem alguns dos segredos guardados na profundeza do pensamento.

Os implantes que aumentam a capacidade cognitiva ou memória ainda parecem vir da ficção científica, mas Joe Paton admite que são tecnicamente viáveis. Lembra também que há tecnologias não invasivas que conseguem interceptar o pensamento de cada pessoa. E dá como exemplo o que se passa em redes sociais como Facebook.

“Já existe, de certa maneira, capacidade de saber o que uma pessoa está a pensar”, afirma. “Temos de vigiar o que está a ser desenvolvido nas tecnologias e regular de acordo com os nossos valores”, defende de seguida.

As mais recentes notícias sobre medicamentos que atrasam substancialmente os efeitos do Alzheimer é vista com otimismo cauteloso. Joe Paton admite que a terapia definitiva do Alzheimer já não deverá demorar muito a chegar, mas recorda que essa opção só é viável nos casos em que não houve uma perda de células considerável.

“Embora estes novos medicamentos sejam realmente muito bem-vindos, o efeito produzido é, de facto, menor que os efeitos comportamentais, como dieta, stress, interação social ou estimulação cognitiva”, explica o cientista, dando a prevenção como a melhor receita para evitar os danos gerados pelo Alzheimer.

Fotograma de uma animação produzida com a ajuda de Inteligência Artificial durante a mostra Metamersion, na Fundação Champalimaud
DR

No primeiro desafio deste episódio, Joe Paton trouxe uma imagem produzida por IA durante a mostra artística e tecnológica Metamersion, que foi levada a cabo em maio do ano passado.

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O segundo desafio, que se pode ver no quadro acima, está igualmente relacionado com a mostra Metamersion e remete para um som que foi produzido em co-autoria por humanos e IA - e que aqui aparece associado a um videoclip.

Tiago Pereira Santos

Hugo Séneca conversa com mentes brilhantes de diversas áreas sobre o admirável mundo novo que a tecnologia nos reserva. Uma janela aberta para as grandes inovações destes e dos próximos tempos

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: senecahugo@gmail.com

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