Negação, raiva e cenas, por Luís Pedro Nunes
A tecnologia é boa para o amor, mas inútil nas separações. No 47.º aniversário do Expresso, a Revista dedica uma edição especial à década que aí vem — e com uma versão áudio
A tecnologia é boa para o amor, mas inútil nas separações. No 47.º aniversário do Expresso, a Revista dedica uma edição especial à década que aí vem — e com uma versão áudio
Temos que aceitar com a tolerância que se tem com as coisas modernas que as relações e a intimidade têm hoje variantes que podem parecer patéticas mas que só são criticáveis porque tem um coração empedernido e/ou não é dado a questões tecnológicas. Ou ambas. Tomei conhecimento que casais separados geograficamente, ou que tenham uma relação amorosa mas vivam em casas separadas (namoradinhos), estão a aderir à moda de dormir, a noite toda, com o FaceTime (ou similar) ligado. Ou seja, de certa forma dormem ‘juntos’ cara com cara no ecrã. Isto é impossível de inventar. Estou a ler na “The Atlantic”: “Couples Who Sleep Thogether Over Videochat” — 3 de janeiro de 2020. E ali se relata a beleza de até se poder baixar o som quando o companheiro/a ressona (detalhe que consta do artigo revelado por uma entrevistada). O facto de se repartir o leito com um ecrã ligado à pessoa amada resolve algumas das misérias da convivência partilhada na cama tal como alguns imprevistos que o corpo exala na sua humanidade ou o sempre inevitável hálito matinal. Pela manhã, na pantalha digital, somos apenas despenteados e relativamente mal-encarados e mesmo assim há sempre uns filtros do Snapchat que podem remediar.
Mas, cuidado, e isto também é referido, este tipo de vídeo-relação, exige wi-fi ilimitado. Nada de meros pacotes de dados. Ou temos drama financeiro conjugal. Uma das vantagens, revela uma das entrevistadas, é que assim tem a certeza que a sua cara-metade não está (naquele momento, naquela noite) a ter um caso extraconjugal. Sente-o ‘ali’ deitado com ela numa vídeo-presença. Há, pois, uma sensação de conforto e fidelidade. Bolas!, isto chega a ser romântico. Demonstra esforço e devoção no compromisso (nas separações geográficas). Fica, pois, aqui ponto assente que para as relações à distância a tecnologia tem sido benéfica. E isto é bonito. E mostra fé, por um lado. De que o amor perdure independentemente da quilometragem. E é das maiores faltas de confiança no outro que já vi, dado que exige que esteja live, no vídeo, para impedir que salte a cerca. É escolher.
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