O que é que se passa no Douro? Biohacking e Spa 2.0

No rescaldo do prémio Spa do Ano na Europa, Catarina Nunes escreve na crónica ‘Sem Preço’ sobre o posicionamento do Six Senses no bem-estar
No rescaldo do prémio Spa do Ano na Europa, Catarina Nunes escreve na crónica ‘Sem Preço’ sobre o posicionamento do Six Senses no bem-estar
Jornalista
Deixar Lisboa para trás e pisar a Quinta de Vale Abraão é, por si só, terapêutico. Uma pacificação involuntária que é parte da energia do Douro e desta quinta em particular. Talvez seja esta mesma sensação o que leva os responsáveis do Six Senses a decidir instalar aqui o primeiro hotel na Europa. É que o bem-estar físico, emocional e espiritual é a base do seu ADN.
A mística por trás da quinta, outrora propriedade da família Serpa Pimentel e cenário do livro de Agustina Bessa-Luís ‘Vale Abraão’ e do filme de Manoel de Oliveira com o mesmo nome, também não será alheia à escolha do Six Senses. Este grupo resgata da falência o antigo hotel Aquapura, que já aqui estava instalado desde 2007, e reabilita-o com o arquiteto Luís Rebelo de Andrade e o estúdio de interiores nova-iorquino Clodagh Design. A reabertura com um conceito diferente do hotel original, em 2015, é feita em linha com a essência da marca Six Senses. Hoje, a vertente de bem-estar está mais forte do que nunca, a par com a sustentabilidade ambiental e social. Já lá irei.
A aposta do Six Senses Douro Valley acaba de ser reconhecida, a 3 de março em Londres, com a atribuição do prémio Spa do Ano na Europa, nos Spa & Wellness Awards 2024, que distingue o melhor que existe no mundo em espaços de bem-estar. A marca Six Senses é sinónimo de bem-estar desde que abre o primeiro hotel, em 1995, nas Maldivas, com um posicionamento aliado a práticas espirituais, como a meditação e as taças tibetanas, evoluindo em ligação com as últimas inovações tecnológicas. André Buldini, diretor geral do Six Senses Douro Valley, defende mesmo que o hotel não tem um spa, mas sim um centro de bem-estar.
Um spa 2.0 é, aliás, a melhor denominação. Uma versão atualizada do conceito clássico (que se dedica ao bem-estar mais imediato) para uma abordagem de prevenção de doenças relacionadas com o estilo de vida e de melhoria da longevidade com mais saúde, em conjunto com gadgets digitais. É nesta linha que o Six Senses no Douro tem, desde há dois anos, um programa de aproximação ao biohacking. Um termo na moda entre aqueles que querem contornar as consequências do envelhecimento biológico e até a própria genética. Na prática abrange todas as escolhas de estilo de vida e de tratamentos que ajudem a otimizar o desempenho físico, mental e cognitivo.
A alimentação, o sono, o exercício físico e a meditação são as práticas de biohacking mais básicas, mas a um nível sofisticado podem incluir a ‘reengenharia’ biológica através de suplementos, medicações, terapias hormonais ou genéticas, ‘hackeando’ os sistemas naturais de recuperação física. No Six Senses, o biohacking passa por uma sessão com as botas de compressão Normatec, que melhoram a circulação e a musculatura das pernas. Esta drenagem linfática mecânica é feita em simultâneo com uma faixa abdominal, que emite calor e vibração, enquanto o relaxamento é induzido por uma meditação guiada (música clássica ou bossa nova) e uma venda nos olhos.
O Biomarker Wellness Screening (60 minutos, €130), por seu lado, é salientado por Javier Juarez, diretor do spa, como muito procurado por oferecer uma análise abrangente e personalizada do estado de mais de 40 biomarcadores, utilizando tecnologia de ponta e métodos não invasivos. Fornece uma compreensão detalhada dos níveis de saúde e bem-estar, que serve de base às recomendações de tratamentos, para que sejam o mais adequados e eficazes nas necessidades específicas dos hóspedes. O programa personalizado combina ciência tecnológica com curas ancestrais, terapias alternativas, tratamentos de spa holísticos e atividades de bem-estar. Sobre os problemas mais comuns entre os hóspedes, Javier Juarez revela que todos são distintos, sem uma tendência para condições específicas.
O que é certo é que o cliente destes serviços já conhece praticamente tudo e tem um nível de exigência elevado em termos de resultados, o que obriga a constantes atualizações com a introdução dos gadgets mais recentes. É neste sentido que o Six Senses está a testar o Apollo, pulseira digital que tem mais de 100 mil utilizadores desde que foi lançada, em 2020. Aliás, o próprio diretor-geral do Six Senses, André Buldini, está a servir de cobaia do gadget que promete reduzir o stresse e a ansiedade, melhorar o sono e a capacidade de concentração. André Buldini explica que o dispositivo que usa no tornozelo, emparelhado com uma aplicação no telemóvel, emite vibrações baseadas na terapia pelo toque, que contribuem para o equilíbrio do sistema nervoso.
A pulseira será disponibilizada aos hóspedes durante a estadia, um serviço que será adotado em todas as unidades Six Senses, numa estratégia global de desenvolvimento de serviços pioneiros. Nesta linha, o programa de sono que já existe vai ser melhorado, com a introdução de sensores que medem biomarcadores, enquanto o Biomarker Wellness Screening terá soluções específicas de fitness ou de ioga, ajustadas às necessidades indicadas no rastreio. O reforço da oferta não é para apanhar a onda em torno destas temáticas. Os clientes do Six Senses há muito que são adeptos destes tratamentos e André Buldini quer proporcionar-lhes as práticas das suas rotinas habituais, nomeadamente as que estão ligadas a aplicações digitais.
Outras tendências de bem-estar chegam aqui também, como a IV Therapy (introdução intravenosa de princípios ativos) e um Snow Room (sala com queda de neve artificial), que a par com a pulseira Apollo estarão disponíveis durante 2024. Mesmo o spa, com 2.200 metros quadrados de área, tem os tratamentos convencionais e outros menos comuns, como os banhos e tratamentos para os cães que acompanhem os donos na estadia. Nos tratamentos para humanos, Biologique Recherche, The Organic Pharmacie, Vinoble e Seed to Skin são algumas das marcas utilizadas no corpo e no rosto, além da marca própria Sleep With Six Senses, que é utilizada nos programas de sono e está disponível nos quartos com um creme bálsamo e um vaporizador de almofada, para ajudar a dormir.
Os produtos Sleep With Six Senses são criados internamente, no Alchemy Bar, onde os hóspedes aprendem a fazer produtos com óleos essenciais, como bálsamos de lábios e esfoliantes. Os tratamentos de mãos e pés extravasam o que vulgarmente se encontra nos salões de beleza. Os vernizes são livres de químicos, enquanto a imersão de pés e mãos é feita em água com leite gordo e óleo de amêndoas doces, ricos em propriedades hidratantes.
Os dados mais recentes indicam que a procura não vai parar. O mercado da saúde e do bem-estar vale 5,6 triliões de dólares (€5,2 biliões) e chegará aos 7,4 triliões (€6,7 biliões), até 2025. Segundo o Global Wellness Institute, o turista de bem-estar gasta mais 41% do que o que viaja em lazer, com o turismo de bem-estar a crescer mais do que todos os outros.
O bem-estar é extensível aos funcionários do hotel, que têm uma agenda diária de atividades de que podem usufruir gratuitamente, além do acesso ao ginásio, ao spa e à piscina interior. Isto fora dos horários dos hóspedes. Aulas de ioga e meditação, subida às árvores e recolha de lixo nas zonas que ladeiam o hotel, seguida de almoço, são algumas das atividades. Trata-se do compromisso do Six Senses com os colaboradores, mas é também uma modalidade de formação, em que ficam capacitados para melhor aconselharem os hóspedes sobre o que está disponível. Algumas das iniciativas são comuns àqueles que pernoitam no Six Senses, que têm ainda ao dispor aulas de ginástica e de padel, workshops de bebidas fermentadas, provas de vinhos, passeios na floresta e subida às árvores, entre outras.
Aqui cerca de 85% dos clientes são estrangeiros, dos quais 50% são norte-americanos e os restantes dividem-se entre brasileiros, ingleses e também muitos portugueses. Richard Bowden, diretor de marketing do Six Senses, justifica a hegemonia norte-americana com o forte reconhecimento da marca nos Estados Unidos. A duração das estadias varia entre dois dias e uma semana, sendo três dias a estadia média. Richard Bowden salienta os clientes estrangeiros que vêm a Portugal para ficarem hospedados aqui, propositadamente, o que faz do Six Senses um ‘hotel destino’. O que procuram? O spa e os programas de bem-estar, num conceito holístico que inclui a alimentação e a sustentabilidade.
Estes dois aspetos convivem separadamente, mas entrecruzam-se nas comidas e bebidas, com a ausência de produtos como o abacate, o atum ou o caviar, devido aos sobejamente conhecidos impactos ambientais e explorações intensivas. Os refrigerantes processados também estão banidos, sendo substituídos por refrigerantes caseiros à base de laranja ou lúcia-lima, além de kombuchas de frutos e shrub à base de vinagre de cidra, fruta e mel, presente em todos os espaços de restauração do Six Senses e no mini-bar dos quartos. Apesar de não constar na carta de bebidas nem no mini-bar, a Coca-Cola está disponível a pedido, uma vez que o Six Senses não tem uma política fundamentalista, justifica o diretor de marketing.
O compromisso com a sustentabilidade reflete-se na origem dos produtos alimentares, que vêm maioritariamente da horta orgânica do Six Senses, de produtores locais ou que se encontrem num raio máximo de 300 quilómetros, sendo estes princípios seguidos igualmente em todos os hotéis Six Senses, garante Richard Bowden. Dentro desta linha de práticas comuns, todos os Six Senses têm o projeto Earth Lab, que materializa as preocupações com a sustentabilidade, adaptadas ao contexto do país e à localização em que se encontra. No hotel no Douro, está ligado à agricultura e a causas de caridade, como crianças em risco, numa perspetiva de integração sustentável no meio ambiental e social.
Há mais vida e novidades em outras áreas. Já a partir de abril, a piscina exterior estreia-se com a área envolvente renovada, um novo bar e área de descanso, além do jardim orgânico. A estas alterações soma-se a abertura do restaurante Greenhouse, a funcionar a partir do verão. Também em abril, os passeios de barco voltam ao Douro, com as embarcações atracadas na renovada doca do Six Senses. Entre os 71 quartos (no edifício principal e duas villas e Valley Wing, inauguradas em 2022), a suite Vineyard Garden é distinguida em janeiro pela Elite Traveler, como uma das 100 World’s Finest Suites. Localizada na ala autónoma Valley Wing, a suite premiada tem cerca de 95 metros quadrados e vista para as incontornáveis vinhas. Afinal, bem-estar e sustentabilidade à parte, o Six Senses não deixa de ser um hotel no Douro.
Six Senses Douro Valley
Programas de spa para duas pessoas, com alojamento, pequeno-almoço, massagem de 90 minutos, tratamento de biohacking, acesso à piscina, circuito de águas e saunas (a partir de €1343, por noite)
Quinta de Vale Abraão, Samodães, 5100-758 Lamego
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