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Opinião

O Papa do povo e dos marginais

Em tempos sombrios, foi o Papa das margens sob ataque, pregando os evangelhos. Foi incómodo por ser radicalmente político. Em tempos de crise da Igreja, combateu o clericalismo. Foi ouvido fora da Igreja por ser radicalmente cristão

Sabendo que não há pastores sem rebanho e que a perda de poder institucional da Igreja tem de ser compensada pela recuperação de poder simbólico, Bergoglio usou o exemplo como arma espiritual e política. Sobretudo naquilo em que o Vaticano mais se afastou da sua mensagem, que é o elogio da pobreza e do desprendimento. E foi o exemplo que lhe deu a força externa para o poder interno que precisava contra as resistências à reforma que desejou e só muito parcialmente cumpriu. Não foi apenas uma mensagem para fora. Foi uma exigência para dentro. Contra os pecados do poder da cúpula que enunciou no duro discurso que fez à Cúria Romana no Natal de 2014. A forma como lidou com a vergonha dos abusos sexuais não se centrou apenas na tentativa de fazer justiça e mostrar arrependimento. Correspondeu a uma recusa firme do clericalismo, com que cortou quando, num gesto inédito, pediu perdão pelo instinto de ter começado por acreditar nos bispos do Chile em vez de ouvir as vítimas. Aceitou a sua demissão em bloco depois de o terem levado ao engano. Na carta que lhes entregou, em maio de 2018, estavam resumidas as suas inquietações: “A psicologia de elite acaba por gerar dinâmicas de divisão, separação, ‘círculos fechados’ que desembocam em espiritualidades narcisistas e autoritárias [...]. Mes­sianismo, elitismos, clericalismos são todos sinónimos de perversão no ser eclesial.”

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