A reacção, no Twitter e na sua rede social privada (lá vamos nós de novo), do próximo presidente americano à situação na Síria é uma resposta rápida a quem quer saber como vai ser a política externa americana. Vai ser comercial. De resto, provavelmente ausente. A menos que seja no indo-pacífico.
Ainda o ditador amigo de Putin estava em paradeiro quase incerto, a caminho de Moscovo, claro, já o próximo presidente usava as redes sociais para estabelecer a doutrina da América de Trump: “a Síria está em desordem, mas não é nossa amiga, & OS ESTADOS UNIDOS NÃO DEVEM TER NADA A VER COM ISSO. ESTA NÃO É A NOSSA LUTA. DEIXEM ANDAR. NÃO SE ENVOLVAM!”, defendeu, em maiúsculas estridentes.
Além de dizer que não queria os Estados Unidos envolvidos no destino da Síria, uma das situações potencialmente mais importantes e transformadoras no Médio Oriente nos próximos tempos, Trump também disse que “nunca houve muito benefício na Síria para a Rússia, a não ser fazer Obama parecer realmente estúpido”. Sobre o que lhe importa estamos entendidos.
Para além de apoiar Israel em geral e Nethanyau em particular, Trump tem interesse em fazer negócios com os países do Golfo. De resto, não declara mais interesse nenhum ali. Nem sequer em deter o Irão, contrariar a influência russa, domar a Turquia ou evitar um covil de terroristas. O que é um problema para a região, para a Europa e para o lugar da América no mundo.
As críticas de Trump a Obama são justificadas. A linguagem, obviamente não, mas a linguagem de carroceiro parece ser um dos fetiches que entusiasma os trumpistas lá e cá.
Em 2013, o Presidente Obama afirmou que Assad deveria partir. Mas depois não fez nada por isso. Pelo contrário. E deixou que a Rússia o apoiasse. O pretexto, então e entretanto, foi que a alternativa seria provavelmente pior. Não parece ser essa a opinião dos sírios. Embora as celebrações do fim de um horror não digam nada sobre o que virá a seguir. Como ensinou a Primavera Árabe, o Iraque e a Líbia pós Sadam Hussein e Muammar Kaddafi, respectivamente. Mas daí a não ter interesse no que se venha a passar vai um enorme passo. No sentido errado.
Agora que a Rússia sai estrondosamente derrotada dos acontecimentos em Damasco, embora esteja a tentar rapidamente reposicionar-se, que o Irão perde um aliado, embora também faça de conta que não, que seria necessário evitar que a nova liderança tornasse o país num santuário terrorista, a bem dos Sírios, do Médio Oriente, da Europa e da América (lembram-se do 11 de Setembro?), Trump declara que não tem nada que ver com o assunto. Nem quer ter. Tudo o que uma potência não deveria dizer.
A Rússia, que tem por ambição não se tornar numa ex-potência, tenta influenciar a situação geopolítica no maior número possível de lugares. A China também. A Nova Rota da Seda é um sinal muito visível disso mesmo. As acções de que Pequim é suspeita, com seja a destruição de cabos submarinos no mar Báltico, é outro sinal. As provocações feitas na última vinda de Xi Jinping à Europa, mais uma. Tudo na mesma linha de consistência: a China, como potência que é e quer ser, está em toda a parte, como é normal as potências estarem. Trump, não. A sua América não quer estar primeiro, quer estar só. O que é uma mensagem demolidora para a confiança dos aliados, inclusive dos que estão onde a maior ameaça está. Quanto é que a Austrália, o Japão, Taiwan e os aliados do Indo-Pacífico estarão dispostos a confiar numa potência que se comporta assim? Pouco, provável e justificadamente.
Bashar al-Assad foi um ditador abjecto. Mas Assad também era inimigo de Israel e dos americanos, e isso toca o coração de um certo tipo de defensores dos Direitos Humanos, que se mantiveram calados, ou mesmo vocalmente cúmplices, durante estes anos todos.
O silêncio sobre Assad dos que não gostam de Israel nem da América, mesmo sabendo o que se passava, diz muito sobre muitas outras discussões internacionais. Mas essa é outra conversa.