Não tenho dúvidas de que o primeiro-ministro fará bem ao País se continuar a passar a mensagem e a concretizar ações que diminuam a sensação de que em zonas mais desfavorecidas a impunidade dos violentos, dos vândalos, dos abusadores, dos criminosos vai continuar
Está a chegar ao fim este programa e talvez seja compreensível que – se vier a propósito – eu aborde hoje e nas duas próximas semanas alguns temas que de algum modo marcaram e definiram o que penso e o que tentei contribuir para que se fizesse ou evitasse fazer durante 6 anos.
Hoje, e em primeiro lugar, abordarei a defesa da moderação como caraterística essencial da sociedade democrática e liberal que espero e desejo Portugal seja cada vez mais.
Depois a defesa da Liberdade – que é ao mesmo tempo um pressuposto e resultado da prevalência dos moderados – que, para além da Rule of Law, se declina muitas vezes como a recusa de novas inquisições, a luta contra o excesso de estatismo e o combate pelos direitos das minorias.
Também a luta contra a tolerância do radicalismo de Esquerda ou de Direita, como se apenas um dos lados do espetro político esteja infetado.
Finalmente a defesa do desenvolvimento económico como matriz condicionante do desenvolvimento político e com isso a luta pelo papel essencial da empresa privada e contra o peso fiscal sobre os cidadãos e as empresas que asfixia o crescimento económico e limita a liberdade.
Seria presunçoso falar de uma legacy, mas parece razoável registar como uma “memória”.
ERROS DA SOBRE-REACÇÃO À COVID
Foi há dias revelado um relatório nos EUA sobre a COVID elaborado por um comité da Câmara dos Representantes, o qual entre outras conclusões relevantes é muito crítico da sobre-reação à pandemia.
Foi contra esses excessos que aqui lutei durante meses (quase sozinho no espaço público), pois era-me evidente que iam causar efeitos nefastos, os quais foram totalmente desvalorizados e não ponderados pelo Ministério da Saúde e pelos peritos que selecionou para se apoiar.
O relatório tem mais de 500 páginas e foi publicado há dias. the-coronavirus-pandemic/) e foi publicado há dias. Não o li, pelo que faço confiança aos resumos que encontrei na internet e de que realço:
a) O excesso de confinamentos não teve fundamentos científicos que justificassem os efeitos que causou na saúde física e mental dos indivíduos, na aculturação de crianças e jovens e na economia social;
b) A regra do distanciamento social não teve base sólida científica e não ponderou outros valores;
c) O uso de máscaras provocou sérios danos no desenvolvimento psico-social de crianças e não foi baseado em critérios científicos sólidos.
Admito que, apesar de ser um comité formado por membros dos dois partidos, possa ter prevalecido uma visão distorcida e que as coisas sejam menos claras que se concluiu.
Mas o que desejo realçar é o risco para a Liberdade e para os Cidadãos de se jogar com a ansiedade das massas, de deixar o medo tomar conta dos decisores políticos, de seguir a força mediática e o pavor que criavam certos cientistas, de desvalorizar riscos a médio prazo, de numa palavra limitar excessivamente a liberdade e o exercício de direitos fundamentais.
E tudo isso foi feito para no final se concluir que, por milhão de habitantes, Portugal teve mais mortes e o dobro dos casos que a Suécia, que era considerada o exemplo da tragédia que era apostar na liberdade e na responsabilidade individual.
AS VIRTUDES DO “NÃO É NÃO”
Desde muito cedo defendi que o PSD não devia fazer um acordo de governo ou de incidência governamental com o CHEGA.
A razão era simples e óbvia:
a) o partido de André Ventura não quer entrar no arco da governabilidade,
b) defende soluções políticas populistas que destruiriam a economia portuguesa e
c) é um partido com posições tóxicas e radicais que são recusadas por parte muito substancial dos eleitores moderados.
Os eleitores moderados que recusam alianças com radicais merecem respeito dos partidos que tiveram o seu voto e aliás sem o apoio deles é impossível que forças políticas moderadas possam sobreviver como tal.
Na área da Direita muitos pensavam de maneira diferente, tomados pela ilusão de que os 50 deputados do CHEGA podiam somar-se aos 80 da AD e fazer as reformas de que o País desesperadamente precisa.
Poucos meses bastaram para que seja evidente que o projeto do CHEGA (com toda a legitimidade política, evidentemente) não é encetar o processo que em Itália levou Georgia Meloni a entrar no arco da governabilidade e ser uma peça chave do governo europeu, causando – excelente sinal! – a fúria de Steve Bannon.
Pelo contrário, todo o registo de Ventura e dos seus próximos é de apostar num discurso de total radicalismo, por certo ainda mais excessivo pelo entusiasmo pela vitória de Trump há um mês.
O que seria hoje a realidade política portuguesa se Luis Montenegro não tivesse a coragem de afirmar “não é não” e ter agido em conformidade parece-me evidente e também por isso não dou por inútil a posição que assumi.
TIRAR O CHÃO AOS RADICAIS
Mas também desde sempre tenho dito e redito que a única forma de reduzir o peso do radicalismo de Direita é o equivalente ao que há décadas se fez para reduzir o radicalismo de Esquerda na Europa.
Do que se trata foi e é claro: enfrentar os problemas e/ou perceções que atraem para o radicalismo os que não são radicais.
Essa parte importante do eleitorado é feito de pessoas “apenas” preocupadas, ansiosas, descontentes, desiludidas, revoltadas.
E para eles é essencial concretizar políticas ativas que tirem o terreno debaixo dos pés dos partidos radicais.
Se isso for feito de forma consistente, os partidos radicais ficam com a opção de se moderarem (como fizeram os Verdes na Alemanha e os Comunistas em Itália) ou de se tornarem basicamente grupúsculos (como o PCP em França e os trotskistas em todo o lado).
Em Portugal o resultado dessa recusa de moderação pelos partidos radicais de Esquerda vê-se na atual pouca relevância do BE e LIVRE (apesar do seu peso mediático e em zonas lúmpen da intelectualidade) e do PCP (apesar do seu peso sindical).
Por isso me espanto com a reação que causam autarcas do PS (como em Loures e Alpiarça) que querem enfrentar problemas que ao não serem resolvidos ajudam o CHEGA (abusos dos apoios do Estado Social, insegurança das populações mais desfavorecidas, vandalismo impune).
As elites mediáticas continuam a não perceber nada como não perceberam as elites de esquerda norte-americanas e com isso deram vento nas velas ao trumpismo.
E no mesmo sentido me espanto como setores moderados gozaram ou criticaram o início da estratégia de Luís Montenegro para criar a perceção que o governo vai enfrentar os problemas de que se alimenta o CHEGA.
Como é infelizmente normal, quando o conteúdo choca com preconceitos como é o caso, ataca-se a forma ou o secundário, neste caso não ter sido hábil o modo como se quis passar a mensagem.
Já não estarei aqui a comentar, mas não tenho dúvidas de que o Primeiro-Ministro fará bem ao País se continuar a passar a mensagem e a concretizar ações que diminuam a sensação de que em zonas mais desfavorecidas a impunidade dos violentos, dos vândalos, dos abusadores, dos criminosos vai continuar.
CLASSES MÉDIAS E PROGRESSO
Finalmente, por hoje, realço a luta de anos por políticas amigas do investimento e do crescimento, favoráveis às classes médias e que reduzam sistemicamente a carga fiscal, dando mais dinheiro e poder
à sociedade e obrigando o Estado a fazer poupanças sem as quais não sairemos da cepa torta.
Muitos exemplos poderiam ser dados, mas recordo apenas as semanas em que apresentei e defendi propostas concretas de redução do IRS para as classes médias, como era a redução de 25% da coleta a quem ganhasse menos de 50 000 euros por ano.
Essas propostas chocaram com o silêncio total de quase todos ou a crítica dos poucos que disso falaram, muitos dos quais a partir de meados de 2023 finalmente passaram a dar prioridade ao que antes recusavam por preconceitos ideológicos ou por receios patológicos de base macroeconómica.
A luta pela redução de impostos sobre os cidadãos e as empresas é um desígnio nacional também para inverter o ciclo vicioso do empobrecimento, da redução das classes médias e do seu poder político e social.
Sem isso, os que se refocilam na lama do populismo e do miserabilismo acabam a ganhar e todos pagaremos preços muito elevados no futuro.
Felizmente – apesar das divergências que não esqueço –existe entre a IL, a AD e o PS uma base suficiente de consenso para se trabalhar uma política consistente de redução do IRS e do IRC que se estenda até 2030, seja qual for o resultado das legislativas que provavelmente ocorrerão no final da primavera de 2026.
Para isso basta que o PS diminua a sua hostilidade à redução do IRC (agora que já ninguém pede que viabilize um orçamento da AD) e que deixe de tratar como ricos os contribuintes individuais que ganham por ano entre € 27146 e € 39791 (6º escalão do IRS, a que praticamente não foi reduzida a taxa) e os que ganham entre € 39 791 e € 80 000 (7º e 8º escalão que nada beneficiaram).
E para a semana há mais, desde logo a análise dos quase 9 anos de presidência de Marcelo Rebelo de Sousa e da tragédia do “Inquérito às Competências dos Adultos” elaborado pela OCDE (que reúne 100 países entre os mais desenvolvidos) e hoje revelado.
O ELOGIO
É ao Mercosul e à União Europeia, pela conclusão da negociação que vai criar o maior e mais forte acordo de comércio livre do Mundo, com cerca de 710 milhões de habitantes.
Isso tem sido realçado, assim como o facto de Portugal ser um enorme beneficiário deste acordo.
O que não vi dizer – apesar de há anos quando o acordo foi pré-aprovado eu o ter referido nas “Causas” - é que o idioma português será o mais falado como idioma nacional dos 31 países envolvidos com cerca de 226 milhões de pessoas (32% do total).
LER É O MELHOR REMÉDIO
Por vezes parece não haver nada a ligar livros que sugiro e alguns dirão que isso acontece hoje.
“Estação Damasco” (Lua de Papel) é um excelente romance de espionagem e de ficção política de David McCloskey, que a queda de Assad há dias tornou ainda mais interessante.
McCloskey é um antigo analista da CIA e aborda o horror da repressão da ditadura de Assad, a complexa teia das oposições, além de contar uma belíssima história de amor.
“O Excêntrico Mr. Churchill” (Gradiva) de Jacob Field, revela facetas do líder do Mundo Livre que derrotou Hitler e além de divertida leitura
abre o apetite para saber mais sobre este homem, “larger than life” em todos os aspetos que o definem.
Em comum têm a política internacional e a opção por valorizar a coragem de enfrentar líderes totalitários.
A PERGUNTA SEM RESPOSTA
Em 19 de novembro perguntei aqui sobre o chamado “turismo de saúde” (grávidas que chegam de várias partes do Mundo, fazem partos no SNS, não pagam nada e desaparecem) e perguntei: “Isto é verdade? E pode? E se pode, não há nada a fazer?”.
Como é normal e habitual, ninguém respondeu, mas em 4 de dezembro o Correio da Manhã revelava factos e até mencionava que “criminosos lucram com tráfico de grávidas”.
O Inspetor-Geral do IGAS, Carlos Carapeto, nesse caso respondeu: “Vamos planear uma auditoria e vamos ver os mecanismos de governação que as unidades locais de saúde estão a criar”.
As perguntas são óbvias: isto é resposta que se dê? Em que país Carapeto inspeciona para não saber nada disso? E, se sabia, qual a razão para nada fazer e mesmo agora ir apenas “planear uma auditoria”?
A LOUCURA MANSA
O Orçamento para 2025 vai acabar com uma redução de 5% dos vencimentos dos políticos que ocorrera em 2010 e em 13 anos (dados apenas para o ano passado) nunca foram aumentados, embora a inflação (com base no IPC) tenha sido superior a 25%, mas por exemplo o preço das casas aumentou 100%.
Ou seja, além de acabar com a redução deveria ter havido um plano de aumentos do vencimento a concretizar nos próximos anos.
O CHEGA lançou uma ridícula campanha, com estandartes pendurados de janelas do Palácio de S. Bento, a indignar-se com isso, ou melhor a mostrar aos invejosos que se indignava.
A loucura pode ser o oportunismo que nem veio com a promessa de que os políticos eleitos pelo CHEGA vão entregar esses 5% a causas sociais.
Ou também a loucura populista do Presidente da República que afirmou “teria preferido que [a redução] fosse aplicável só aos
mandatos futuros dos titulares de cargos políticos e não já aos mandatos em curso”.
Mas maior loucura é a falta de coragem em pagar bem aos políticos. Não chego ao ponto de afirmar – como provocatoriamente fiz como Bastonário há 20 anos sobre o pouco que pagavam pelo apoio judiciário – “quem paga com amendoins, quer contratar macacos”, embora me apeteça.
Mas entra pelos olhos dentro: uma classe política mal paga sai muitíssimo cara a Portugal.