Opinião

Disparidade Salarial com base no Género: um tema de Direitos Humanos

Disparidade Salarial com base no Género: um tema de Direitos Humanos

Tiago de Magalhães

Associado Sénior de Direito do Trabalho & Fundos de Pensões, da CMS Portugal

Todas as entidades empregadoras, independentemente da sua dimensão ou volume de negócios, devem ter a consciência social de estarem atentas e alertadas para a sua realidade interna. Não só por uma questão de Compliance, mas também por uma questão de estratégia e de futuro

No mês em que se assinala o Dia Internacional da Igualdade Salarial – 18 de setembro – não é de mais relembrar que, à data de hoje, as mulheres ainda ganham, por trabalho de valor igual ao dos homens, menos 13,2%, no que respeita à remuneração base, de acordo com a informação disponibilizada no Barómetro das Diferenças Remuneratórias entre Mulheres e Homens deste ano. Traduzindo para euros, significa que por cada euro que os homens auferem, as mulheres ganham apenas oitenta e seis cêntimos.

Esta diferença remuneratória tem impactos ao dia de hoje, como tem também reflexos na proteção social que as mulheres acabam por [não] ter. É disso exemplo, designadamente, a proteção na velhice, em que as reformas que as mulheres auferem são muito mais baixas do que as aquelas que os homens recebem.

A remuneração que uma pessoa recebe hoje tem, pois, um impacto maior do que aquele que se possa pensar, cabendo às empresas a primeira salvaguarda a esse respeito, sob pena, inclusive, de ficarem sujeitas ao pagamento de coimas e ter ainda de regularizar as situações que se verifiquem ser discriminatórias com base no género.

Mas, onde estamos e para onde vamos?

Portugal é dos países da União Europeia mais avançado em termos de legislação. De facto, e sem prejuízo de estar em curso até junho de 2026 o prazo de transposição da Diretiva referente à transparência salarial, temos legislação que prevê medidas de promoção da igualdade remuneratória entre mulheres e homens por trabalho igual ou de igual valor. Desde logo pela exigência de as empresas terem uma política remuneratória transparente, assente na avaliação das componentes das funções, com base em critérios objetivos comuns, e por outro, da possibilidade de poderem ter de vir a apresentar um plano de avaliação das diferenças remuneratórias (‘Plano’), sempre que se verifique que há diferenças salariais entre homens e mulheres, tendo, em 2023, sido já notificadas 1500 empresas. Por outro lado, encontra-se igualmente previsto na Lei que diferenças salariais não justificadas presumem-se discriminatórias. Também alguns tipos de atuações por parte das empresas contra os trabalhadores que tenham pedido emissão de parecer sobre a existência de discriminação remuneratória são passíveis de serem presumidos como abusivos, a que acresce o facto de ser considerado como contraordenação muito grave, sujeita ao pagamento de coima que pode atingir os EUR 61.200, com possibilidade aplicação de sanção acessória, a violação das normas referentes a esta matéria.

Será que vão haver muitas alterações com a transposição da referida Diretiva? É expectável que sim. Pontos, como a proibição de questionar o histórico salarial dos trabalhadores, ou a obrigatoriedade de indicar o salário ou intervalo salarial aquando do anúncio -, o direito a informação sobre a remuneração dos seus pares, entre outras obrigações para as entidades empregadoras, não estão ainda contempladas na nossa Lei, mas sim na Diretiva. Por outro lado, recentemente, foram consultados os parceiros sociais relativamente à aplicação da Lei portuguesa e decorrente dessa consulta podem também ser propostas alterações por forma a facilitar não só a sua aplicação, como o seu objetivo – o de eliminar a discriminação salarial com base no sexo.

Treze por cento parece pouco, mas como referido no discurso da atual Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, no passado dia 18 de julho, quando se dirigia ao Parlamento Europeu, “(…) não há a mínima razão para que as mulheres recebam menos do que os homens pelo mesmo trabalho. Mas ainda há muito a fazer”. Trata-se, pois, de assegurar o princípio de igualdade de tratamento e de oportunidades entre mulheres e homens, princípio esse que numa Sociedade que se quer cada vez mais sustentável deve estar na ordem do dia.

Este é um tema de Direitos Humanos. E como tal, numa altura em que, no Afeganistão, as mulheres são remetidas ao silêncio, todos devemos estar atentos e ter um papel ativo na construção de uma sociedade mais equitativa e transparente. Todas as entidades empregadoras, independentemente da sua dimensão ou volume de negócios, devem ter a consciência social de estarem atentas e alertadas para a sua realidade interna. Não só por uma questão de Compliance, mas também por uma questão de estratégia e de futuro. Não é coincidência que este é um dos objetivos de desenvolvimento sustentável, conforme definido pelas Nações Unidas.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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