Opinião

Operação Marquês: José Sócrates terá de passar a fazer o seu jogging no campus de Justiça na Expo

Acabámos de tomar conhecimento do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa que se debruçou sobre os recursos interpostos pelo Ministério Público, enquanto detentor da ação penal, quer de alguns doa arguidos, isto relativamente à decisão de pronúncia parcial de alguns dos arguidos e de não pronuncia de outros, bem como da decisão de inexistência de alguns dos crimes que impendiam em relação aos mesmos arguidos.

Sobre esta decisão pouco haverá a dizer, pois, estamos certos e cientes, quer do esforço empreendido pela Senhoras Juízas Desembargadoras, quer da certeza jurídica emanada no acórdão ora prolatado. Recorde-se, a bem do antes dito que as referidas Magistradas estiveram em regime de exclusividade para apreciar os recursos interpostos da decisão do Juiz de Instrução Criminal, Dr. Ivo Rosa.

Sabemos todos que, à data, foi com surpresa acolhida a decisão instrutória. Em primeiro lugar por desconsideração jurídica do trabalho do Ministério Público e, em segundo lugar, pelo tempo (mais de 2 anos) para proferir a mencionada decisão.

Hoje, o Tribunal da Relação de Lisboa fez reverter por completo a decisão solitária do Juiz Ivo Rosa.

Os arguidos irão todos a julgamento.

E o mais mediático de todos, José Sócrates, terá de passar a fazer o seu jogging no campus de Justiça na Expo.

Esta situação, complexa, levanta problemas vários que, infelizmente, a classe política não quer ou demora a resolver.

Falamos, desde logo, na subsistência de um regime que obriga à conexão processual (entre factos e suspeitos), assim transformando circunstâncias que amiúde pouco têm a ver umas com as outras. Assim, como um rolo compressor, vemos rapidamente uma investigação transformar-se num monstro, dando assim origem a esta triste realidade: uma investigação que se iniciou em 2013, teve o seu despacho final – de acusação -, apenas em 2018.

Pergunto eu, que não conheço o processo, qual a conexão entre o então motorista do Eng. José Sócrates e o Dr. Ricardo Salgado? Ou entre esse mesmo motorista e Zeinal Bava?

Seria tão simples alterar este estado de coisas.

Este tempo é, para todos, demasiado tempo. Demasiado para a credibilização do sistema judicial e demasiado para os arguidos, apenas suspeitos, que vêm a sua vida colocada em suspenso e, claro, em casos mediáticos como este, completamente devassada.

Mas, como se não bastasse o tempo da investigação, ainda temos de somar o tempo da instrução.

A instrução, fase facultativa do processo penal, destina-se, em absoluto, a aferir da bondade dos indícios, ou da falta deles, recolhidos pelo acusador em fase de inquérito. Trata-se de uma aferição garantística e que deve ser apreciada de forma meramente perfunctória. Porém, a interpretação do normativo é, como não podia deixar de ser, completamente dúbia. Assim, permite-se a juízes de instrução criminal entenderem da forma que acabei de relatar, a certa diga-se. E permite-se a outros magistrados entenderem esta fase como uma de pré-julgamento, ouvindo testemunhas (já ouvidas em sede de inquérito), questionando a recolha de prova seja ela qual for, acabando por condicionar objetivamente uma decisão posterior em fase de julgamento.

Esta interpretação, como a tomada neste processo, permitiu ao juiz de instrução criminal demorar mais de dois anos para prolatar a decisão instrutória que todos conhecemos e que, hoje, foi posta em crise pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

A permitir-se a interpretação da fase de instrução tomada na “Operação Marquês” questionamos a bondade da existência da fase de instrução! Deve ser pensado pelo poder político.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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