Numa entrevista que ficará para a história da clarividência analítica e profundidade objetiva que tanta falta faz a grande parte dos líderes europeus atuais, Dominique de Villepin, ex-PM francês e diplomata de carreira, explica como a reação ocidental na sua generalidade e a de Israel em particular a seguir ao terrível 7 de outubro foi ao encontro da armadilha plantada pelo grupo terrorista Hamas.
Daí à desilusão geopolítica da União Europeia que é uma das partes onde a reação se agrava. Quem viu como eu Von der Leyen inabalável na China em abril, não cedendo na defesa dos interesses geopolíticos da Europa, e a observou recentemente ao lado de Netanyahu sem conseguir segurar e transmitir duas ideias que, nem opostas são, só pode ter ficado exasperado com aquilo que foi a nova armadilha.
Chega a ser contraditório numa liderança e na UE que, no mais relevante até outubro, agiu de acordo com um posicionamento mais eficaz na esfera global. Talvez tenha sido mera ilusão secundada pelo eterno “guarda chuva” americano. Na altura em que o aliado incontornável de Israel que, só se pode dissociar até certa medida do governo daquele país e para lá do desmantelamento do Hamas, aponta novamente para a questão de fundo no conflito israelo-palestiniano, a Europa cora de vergonha.
Devia-se ter percebido duas coisas essenciais após a condenação em toda a linha do ataque do Hamas e do direito de reposta de Israel: a solução de dois Estados tinha de voltar a estar em cima da mesa e o apoio sem reservas ao regime de Netanyahu, depois deste estar há mais de 15 anos no poder a minar terreno em nome do extremismo, não podia ser dado.
O governo em Israel não é e nunca foi a Ucrânia e a sua génese difere pouco da de Putin.
É revelador alguns líderes europeus terem confundido isso nos dias seguintes ao ataque do Hamas, ignorando até a contestação generalizada ao governo de Netanyahu em Israel. Até as manifestações mais pacíficas pro-Palestina se mandaram proibir em cidades europeias.
Sem ‘mas,’ o enredo da afirmação à desilusão geopolítica da União Europeia adensa-se à medida que se observa toda a conduta do ataque de Israel à faixa de Gaza, enquanto meio mundo entende que só com a mudança de regime a médio prazo naquele país é que haverá qualquer solução para este conflito.
A União Europeia caiu na armadilha de Netanyahu. Para se afirmar na geopolítica, é preciso demostrar que sabe segurar várias ideias em campos diferentes e transmiti-las corajosamente. A defesa democrática, liberal e das soberanias no mundo atual não está para uma Europa que tem medo das consequências e demonstra-se contraditória consoante a geografia e o país.
Não somos as nações indispensáveis.
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