Para combater a inflação, Portugal tem de tirar dinheiro da economia. Para nos tornarmos competitivos, Portugal tem de reduzir impostos, logo ter mais dinheiro na economia. Uma encruzilhada onde temos de optar, ou equilibrar, políticas de sinal contrário.
Importa recuar um pouco. Durante mais de uma década o Banco Central Europeu comprou dívida pública, injetando com isso enormes quantidades de dinheiro na economia. Durante a pandemia, concorreu um fator adicional: mantiveram-se níveis de rendimento em comparação com decréscimo de produção. Mais um fator a concorrer para a existência de mais dinheiro do que produto: logo, os preços começaram a subir. A este tipo de inflação, diz-se que é inflação do lado da procura. E as soluções de manual são: reduzir a despesa pública, aumentar juros para tirar moeda de circulação, tudo isto a um nível a que as famílias e a economia possam aguentar.
Outras fontes de inflação resultam da alteração do modelo produtivo, da alteração de cadeias de abastecimento e dos problemas de acesso a matérias-primas. Diversas causas e disrupções com um mesmo efeito: redução de oferta e aumento de custos de produção. É normal que também por aqui os preços subam. Algumas das soluções ou minimizações passariam por maior estímulo à oferta. Para tal acontecer teria, desde logo, de haver uma diferente conceção de política pública, bem como visão de longo prazo. O PRR poderia aqui servir para acomodar este efeito. Porém, para além dos problemas de conceção iniciais, acresce agora um desafio extra: a falta de execução pode potenciar investimento acelerado e mal concebido, o que será improdutivo e levará novamente à inflação – de facto o que teremos é novamente mais dinheiro colocado na economia, não beneficiando sequer uma transformação em prol do crescimento futuro.
A melhor forma de responder a estes desafios, em que de um lado temos de tirar dinheiro da economia, e do outro temos de introduzir, passa também promover o crescimento de outra forma – uma forma não financeira. Ou seja, podemos promover a redução dos custos de contexto, do estímulo à produção, simplificação e aceleração de licenciamento, estimular a concorrência e diminuir barreiras de entrada e não condicionar tantas atividades económicas.
Atendendo à nossa falta de competitividade estrutural, precisamos de baixar a carga fiscal, e entra aqui uma necessidade contraditória com a conjuntura. Sem impostos mais baixos, as empresas manterão dificuldades competitivas, teremos problemas de atração de investimento e de retenção de capital humano. Sem maior produtividade, menores custos de contexto e menos impostos, as empresas não terão uma rendibilidade adequada e os salários serão sempre baixos.
A opção dos nossos governantes, porém, é entrar numa guerra ideológica com tudo o que nos pode fazer crescer, diabolizando empresários e o lucro, e ignorando políticas de estímulo à produção. Temos de atuar sobre a oferta, como por exemplo na energia, em política de água para agricultura. Ademais, não há estabilidade legislativa nem fiscal, não há políticas promotoras de produtividade, não há uma transformação da Administração Pública para reduzir o peso da despesa.
Não podemos falhar mais uma vez como economia. Para viabilizar o país, é necessário reformar o Estado e implementar políticas assertivas de crescimento, mesmo que algumas medidas possam no curto prazo ter impacto na inflação, mas compensadas com outros tipos de medidas.
Portugal está numa encruzilhada, que não é nova, mas o combate à inflação e aos seus efeitos deveriam agravar o sentimento de urgência. Já passámos por oportunidades perdidas – agora não nos podemos perder nesta encruzilhada.
Carla Castro é deputada da IL - Iniciativa Liberal
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