Era inevitável
Serão quatro anos de teste. Se o PS falhar, a direita virá, e não será a direita simpática e centrista a que estamos habituados
Serão quatro anos de teste. Se o PS falhar, a direita virá, e não será a direita simpática e centrista a que estamos habituados
Era inevitável. António Costa é um corredor de fundo e desta vez apostou tudo, incluindo ele mesmo. Ganhou. Mais do que ele esperava, e sobretudo mais do que as enganadoras sondagens e mais do que a campanha previa. Fazer uma má campanha não faz ganhar eleições, e mudar de rumo durante a campanha, ainda que instantânea e superficialmente, não faz perder eleições.
O povo português tem horror a grandes mudanças, mesmo quando não são assim tão grandes, e tem horror a ser cobaia de experiências. Tem, ainda, e com razão, horror de ser abandonado, porque abandonado foi mais do que uma vez, quando os dirigentes se demitiram súbitos e escolheram o caminho da internacionalização e do cargo no estrangeiro, mais prestígio e mais remuneração.
O valor máximo de António Costa foi o de escolher, ou ser obrigado a escolher, ficar em Portugal e governar com as cartas que lhe dão. Não desertou, não ameaçou desertar. Quando chegou a altura, libertou-se dos aliados que o faziam tropeçar, e agora, nestas eleições, praticamente exterminou-os com o voto do povo. A geringonça acabou, era tempo. O BE e o PCP fizeram a cama em que se deitaram e podem enfrentar uma extinção que a proximidade ao poder iludiu. São anacrónicos, estão envelhecidos. Mesmo o Bloco parece um gasto partido do regime, tendo perdido o viço, a agilidade e a mobilidade. Como partido de protesto, acabaram. O tempo não está para diletantes, e ser diletante com um político como Costa sai caro.
O PSD enfrenta, mais uma vez, uma crise grave, perigosa para a democracia. O PSD não pode continuar a perder tanto durante tanto tempo. Rui Rio fez o que pôde, mas uma imprensa demolidora e um programa que não chegou aos ouvidos dos eleitores, não salvaram o partido nem o líder. O PSD arrancou tarde, demasiado tarde, e sem uma alternativa que soasse distinta para o povo. Rio teve dignidade na despedida, decerto se demitirá, e mereceu um respeito que lhe tem faltado.
A direita reerguer-se-á, mais rejuvenescida e liberta dos fantasmas cavaquista e passista, que atiram o povo para os braços do PS? A austeridade deixou fundo trauma. Costa disfarçou-a bem. A Iniciativa Liberal é apenas uma gota de água neste oceano de dúvidas onde o CDS naufragou.
E daqui a quatro anos? Falaremos. Maioria absoluta é poder absoluto e sabemos que o PS se porta mal com o poder absoluto. Com tantos milhões e tanto poder na mão portar-se-á melhor? Quo era demonstrandum. Costa será o reformador de um sistema viciado e estagnado? Ou limitar-se-á a distribuir pelos amigos e clientes? Há muito dinheiro em jogo.
E daqui a quatro anos lá andaremos, já não na cauda da Europa, mas no lar de terceira idade, dos baratos, em que Portugal se está a transformar. Um paraíso para estrangeiros e milionários, um país de emigrantes qualificados, baixos salários, baixa produtividade, conformismo e penúria.
A França cresceu 7% durante a pandemia. Nós crescemos a dívida pública, para variar. Vem aí a inflação, devoradora de governos e boas vontades. E Costa promete semanas de quatro dias. E mais funcionários públicos. E este mundo e o outro.
Serão quatro anos de teste. Se o PS falhar, a direita virá, e não será a direita simpática e centrista a que estamos habituados. Olhem para a vitória do Chega, sim, a vitória, e tirem conclusões. O PSD precisa, absolutamente, de se reconstruir. Ou morrerá.
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