As Causas. Diretas do PSD: análise tridimensional
Hoje, para variar, vamos dedicar muito espaço às Direitas
Comentador
Hoje, para variar, vamos dedicar muito espaço às Direitas
O resultado das eleições diretas do PSD pode ser visto como um sucesso político de Rui Rio, como um fracasso pessoal de Paulo Rangel e como uma quase inevitabilidade.
Iremos analisar esse resultado desses três pontos de vista, pois só assim conseguiremos ter uma imagem tridimensional, como convém.
E, de seguida, também se tentará analisar as suas consequências para o PSD e para as Direitas.
Rui Rio ganhou por pouco mais de 1500 votos num resultado muito dividido. Nunca um candidato em diretas do PSD ganhou por tão pouco. Mas, como aliás acontecera com Carlos Moedas, politicamente teve uma grande vitória eleitoral, por mérito próprio.
Em primeiro lugar, porque soube aplicar uma estratégia anti-dirigentes, anti-elites, anti-Lisboa e os seus media, que sempre teve sucesso na “arraia miúda” dos militantes. Foi uma estratégia bonapartista, de ligação aos eleitores sem mediação, que Sá Carneiro e Cavaco Silva sempre souberam usar muito bem.
Em segundo lugar, porque sintonizou com a vontade muito forte de parte substancial dos eleitores em regressar à área do Poder, ainda que seja numa derivação do modelo de bloco central.
Rio percebeu que havia milhares de militantes (seguramente uma grande parte dos 18 mil eleitores que nele votaram) que não queriam construir uma alternativa ao PS a prazo e para isso esperar 4 anos. Desse modo apoderou-se do slogan de Paulo Rangel e virou-o ao contrário: ele deu uma “esperança” a curto prazo e Rangel apenas a “espera” do médio prazo.
Em terceiro lugar, porque aproveitou muito bem a oportunidade das eleições legislativas antecipadas para criar um discurso - que teve sucesso - de que Rangel não estava preparado e não o ficaria em dois meses.
Em quarto lugar, porque lutou com o desespero de um condenado à morte, não hesitou em aplicar táticas muito agressivas e soube aproveitar as redes sociais e os media, que atacou com habilidade, para colher vantagens.
Paulo Rangel perdeu uma eleição que o consenso geral (incluindo os conhecedores do PSD) achava que não podia perder.
É uma derrota pessoal, causada em especial por não ter conseguido estar à altura das expectativas que criou. Não foi capaz de dar a “esperança” que prometera, uma estratégia alternativa à socialista, e por isso não foi capaz de mobilizar mais eleitores.
Depois, perdeu por não ter sido capaz de arranjar um antídoto a Rui Rio e à sua promessa de que só com o atual líder seria possível ganhar ao PS e, sobretudo, mesmo sem ganhar o PSD voltar à área do Poder.
Também perdeu porque se equivocou em relação ao seu partido. Hoje o PSD é um partido muito diferente e já não é contra as alianças com o PS, como foi no passado, e a recusa de admitir acordos pós-eleitorais à esquerda não lhe trouxe mais apoios por isso.
Finalmente, perdeu porque se deixou enredar num discurso para militantes já conquistados e não falou para os que andam zangados com o PSD, não revelando “killer instinct” contra o adversário.
Mas, em minha opinião, a vitória de Rangel seria sempre muito difícil, mesmo que não tivesse cometido erros. E por vários motivos.
Em primeiro lugar, a antecipação das eleições legislativas alterou os dados do problema: muitos militantes-eleitores passaram a preferir o mal conhecido do que arriscar com alguém que pode ser melhor, mas que não conhecem bem.
Em segundo lugar, a pulsão natural da pequena minoria que decide os destinos do partido (menos de 40 000 pessoas) é hoje em dia o pragmatismo sem ideologia e a prioridade ao acesso ao Poder. Rangel queria que o acompanhassem no risco de preparar o futuro, mas muitos deles querem apenas preparar o presente.
Em terceiro lugar, a estrutura dos filiados mudou e hoje dominam pessoas com mais de 50 anos e sobretudo com mais de 60 anos, mais conservadores do que liberais, mais “situacionistas” do que “reformadores”, com medo de perder o que têm em vez de, como os jovens, desejosos de correr o risco de soluções sem as quais o destino é a emigração.
Em quarto lugar, parte dos cabos eleitorais anti-Rio optaram por resguardar-se. Parece ter sido o caso de apoiantes de Luis Montenegro, pois este recusou dizer em que iria votar, quem sabe se “vingando” o apoio de Rangel a Rio há dois anos. E esses votos poderão ter feito a diferença.
Tem-se falado que haverá uma quinta razão, o facto de Rangel ter assumido a sua homossexualidade e ser vítima de homofobia. Não acredito nisso, mas sobretudo não quero sequer admitir isso num partido democrático.
A principal consequência do resultado das Diretas é que a linha historicamente minoritária no PSD, favorável a aliança preferencial com a esquerda moderada e com o PS, se consolidou após 3 vitórias em 4 anos, no que parece ser mais estrutural do que conjuntural.
Essa linha é hoje aliás apoiada com entusiasmo pelos dirigentes do empresariado português, como o líder da CIP revelou no programa da “Circulatura do Quadrado”, e por setores moderados antissocialistas, no fundo os mesmos que achavam um risco a estratégia de Sá Carneiro em 1979.
Claro que o PSD de Rio vai tentar ser o destino do voto anti-PS e anti-Costa. Mas isso será apenas uma tática de voto útil, compreensível, mas não uma estratégia e muito menos uma política.
Sendo assim, mesmo se Rio ganhar as eleições, isso é inútil para quem deseje uma estratégia reformista alternativa.
Acresce que a probabilidade de Rio ganhar em 30 de janeiro é mínima. E mesmo que tenha mais deputados, o PS nunca aceitará apoiar um governo minoritário do PSD.
As razões para isto são óbvias:
a) Os militantes do PS não vão querer largar o Poder;
b) O PS está hoje em dia mais à esquerda do que sempre, e o BE e/ou o PCP tudo farão para evitar um governo de Direita;
c) E, sobretudo, se o PS tiver menos deputados do que o PSD, António Costa demite-se e então é mais provável que seja Pedro Nuno Santos e não Rui Rio a suceder-lhe.
Por isso, a única forma do PSD se aproximar do Poder e o resultado não ser o oposto do desejado é, paradoxalmente:
a) O PSD não ganhar as eleições;
b) O PS não conseguir fazer maioria com o BE e PCP.
No fundo, no fundo, é nisso que Rio aposta.
Mas para esse cenário não é necessário o voto útil no PSD, ao menos em 6 distritos que elegem 10 ou mais deputados (Lisboa, Porto, Braga, Aveiro, Setúbal e Leiria).
A grande questão política agora tem, pois, a ver com as Direitas.
Mas não com Direita radical, porque o Chega é um destino de voto para descontentes que nunca votarão num PSD que possa amparar o PS, como vai fazer.
A grande questão é agora saber o que quer e fará a Direita moderada e democrática, para a qual o PSD já não é a sua casa e cada vez será menos.
E saber se os setores moderados de centro-direita se vão render ao Chega por raiva, ao PSD por resignação, ou se decidem fazer o seu caminho, sem prejuízo de alianças sempre possíveis com o PSD “centrista”. E, paradoxalmente, fortalecer a Direita nem é incompatível com uma aliança do PSD com o PS se este for o mais votado.
Será que há uma Direita moderada e democrática que deseje uma alternativa à estratégia estatizante e à Esquerda? E, se houver, terá a coragem das suas convicções? E, se tiver, será que a IL os conseguirá atrair, desde logo abrindo a portas a dissidentes do PSD e do CDS?
Napoleão terá dito que preferia um general com sorte do que outro que seja competente.
Como qualquer político com sucesso, António Costa é um homem com muita sorte. Mais um exemplo? O aparecimento da variante Ómicron e a sua chegada ao Belenenses SAD, que há dias jogou com o Benfica, ou seja, dando à variante visibilidade nos programas televisivos.
Na passada semana demonstrei aqui o atraso na 3ª dose e que isso foi culpa do Ministério da Saúde. Para não ir mais longe, a Ministra anunciara no final de outubro que todos os maiores de 80 anos teriam recebido a 3ª dose até hoje. Depois, foi assegurado que até 19 de dezembro todos os maiores de 65 anos também estariam vacinados.
Desde há 15 dias finalmente acelerou a vacinação. Mas no domingo soube-se a situação em relação ao grupo de risco por idade quanto à 3ª dose, e falta vacinar 1,8 milhões de pessoas:
a) acima dos 80 anos faltam quase 200 000 (cerca de 37% do total),
b) entre 70 e 79 anos faltam cerca de 1,1 milhões (65%), e
c) entre 65 e 70 anos faltam cerca de 500 000 (82,5%).
Com a Ómicron, e ainda por cima por ter entrado pelo futebol, o tema que mais vai interessar aos portugueses é a pandemia e a culpa de tudo o que acontecer será da variante da Africa do Sul… que ainda por cima não parece ser muito perigosa.
Acresce que as medidas decretadas na passada semana não são exageradas, que agora a vacinação vai correr bem, que não se vai falar de outra coisa nas televisões e que os portugueses vão ter medo de mudar de general no meio da batalha contra a Covid.
Ao Presidente da República, não apenas pela decisão de evitar que o passo histórico-cultural da legalização da eutanásia fosse tomado na confusão das votações apressadas antes da dissolução, mas pelo conteúdo dos argumentos com que devolveu o diploma aos deputados.
O texto presidencial – ao contrário do que fez em relação à violação da lei travão – é escorreito, claro, juridicamente rigoroso. E dá uma merecida bofetada de luva branca à chocante falta de qualidade do texto votado.
Uma entrevista ao Público, há duas semanas, de Daniel Markovitz, conhecido crítico da meritocracia, permitiu algum debate sobre um tema essencial ao nosso futuro.
Por isso sugiro a leitura paralela do seu famoso livro “The Meritocracy Trap” e do não menos famoso livro de Adrian Wooldridge, que defende a meritocracia, “The Aristocracy of Talent”.
Ando há algum tempo a ler os dois livros no (pouco) tempo que tenho para isso, e recomendo vivamente.
Parece haver unanimidade no espaço público de que a vitória de Rui Rio é uma oportunidade para a Iniciativa Liberal.
O Chega tem enchido o espaço público. Os dois partidos são político-ideologicamente opostos, mas ambos lutam pelos descontentes com o PSD de Rio.
No entanto, desde a decisão presidencial de dissolver a Assembleia (há um mês) e, pior ainda, desde a vitória de Rio, não se houve falar da IL. Apenas retenho uma (boa) entrevista do seu líder ao DN na passada 6ª feira e a comemoração do 25 de novembro.
A pergunta é mais uma vez óbvia: será que Cotrim tem uma estratégia a construir sobre um silêncio? Ou há problemas na IL que o paralisam? Ou, ainda, estão aflitos com a possibilidade de sucesso?
A Ministra da Saúde acusou os médicos do SNS de não serem resilientes, talvez por estar farta das demissões deles e de já não aguentar conter-se sem reagir.
Perante as reações, e com algum descontrolo emocional, apresentou uma espécie de pedido de desculpas, mas o que realmente disse foi que estava “indignada” pelo “mal-entendido” de pensarem que ela dissera … o que dissera.
Algum spin doctor a terá convencido a pedir desculpa de novo, desta vez a um grupo de médicos no Hospital de Setúbal, para que depois o que terá dito fosse espalhado pelas televisões.
Todos nós, mesmo ou sobretudo as pessoas inteligentes, agressivas e determinadas como Marta Temido, dizemos disparates, cometemos lapsos, somos injustos.
Por isso a loucura não é o que ela disse e a forma como pediu desculpas, mas a indiferença com que os media trataram o tema da Ministra – que sabe mais dos hospitais do que os cidadãos – achar que os médicos nos hospitais não têm resiliência que chegue.
Afinal os médicos são ou não são resilientes? É que isso deveria ser tema que interessasse a 10 milhões de portugueses…
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