Há uma unanimidade em Portugal sobre a importância do mar para o nosso desenvolvimento sustentado. Além disso, a nossa posição arquipelágica é uma plataforma muito valiosa em termos securitários. Por outro lado, o tipo de costa e a proximidade do Norte de África trazem consequências negativas pela possibilidade que se abre à acção de narcotraficantes ou outros envolvimentos ameaçadores que comprometem a nossa estabilidade. Todas as razões aduzidas justificam uma protecção adequada desse património, operada em terra e no mar.
Estranhamente, o Estado não resolveu ainda o problema, deixando multiplicarem-se conflitos que resultam da duplicação funcional atribuída a várias entidades e relativas ao mesmo problema. Há muito que a Marinha tem por missão a materialização dessa protecção, e, obviamente, quando o faz em termos de defesa militar, está, simultaneamente, a colmatar outras necessidades.
A vigilância marítima pode exercer-se sobre tudo aquilo que pode constituir uma ameaça à segurança nacional e não apenas à defesa militar do nosso território, pelo que vários objectivos podem ser atingidos através da vigilância.
Habitualmente designa-se tal plurifuncionalidade por "duplo uso" de meios – civil e militar-, o que é praticado em muitos países de pequena e média dimensão. Exemplo paradigmático da importância do duplo uso e das suas sinergias é a Autoridade Marítima Nacional. A utilização dos recursos humanos e materiais da Marinha por esta Autoridade permite-lhe que aproveitar melhor os esforços de cooperação.
Esta utilização racional de uma Marinha de duplo uso, militar e guarda costeira, beneficia dos conceitos, doutrina, estruturas de apoio e pessoal comum às duas vertentes, daí resultando ganhos materiais e de eficiência, rentabilizando o emprego dos meios.
As Marinhas não se improvisam, os séculos de experiência acumulada oferecem confiança e criam as condições para que a autoridade do Estado português se possa exercer em todos os espaços marítimos nacionais. Contudo, a GNR quer mais poder para patrulhar as águas fiscalizadas pela Marinha esquecendo que neste ramo das Forças Armadas há um duplo uso definido no Conceito Estratégico de Defesa Nacional, que se encontra devidamente regulamentado.
Num país com as nossas limitações, não faz sentido qualquer outra postura. Desse modo, e quando existem missões específicas no domínio da criminalidade, elementos da PJ ou do SEF embarcam nos navios da Armada e intervêm directamente no que lhes diz respeito.
Não nos podemos dar ao luxo de duplicar meios. Qual é o racional daqueles meios da GNR? Se for pela “Frontex”, a Marinha também já participou".
A decisão da GNR comprar à Holanda uma megalancha de 35 metros para fiscalização e prevenção criminal em alto mar está a provocar controvérsia pela duplicação de meios.
Esta nova lancha – custou cerca de oito milhões de euros – é a primeira de um conjunto de quatro. E é de maior dimensão do que quaisquer lanchas de fiscalização rápida da Marinha das quais, só estão operacionais quatro das nove existentes, por falta de verbas para a manutenção.
Neste contexto, pode e deve aina ser questionado se foi avaliado quanto pode custar esta duplicação de meios, ou quanto custa uma Guarda Costeira e uma Marinha, que o país não pode sustentar.
Registe-se que enquanto na GNR, o processo de aquisição se resolveu num ano, a Marinha está há anos à espera dos seis Navios Patrulhas que lhe fazem muita falta para manter os níveis de prontidão e eficácia.
A eventual criação de uma guarda costeira autónoma da Marinha, dotada de meios adequados para garantir a presença do Estado no mar e contribuir para firmar a jurisdição nacional numa área marítima tão extensa, implicaria investimentos de tal ordem, que nem países ricos como a França ousam adoptar. Por lapso, ou falta de percepção da realidade, foi legislado num sentido equívoco, permitindo à GNR o controlo de águas costeiras, o que significa ou uma duplicação funcional em relação à Marinha.
A extensão dessa missão atribuível à GNR apenas faz duplicar meios materiais e financeiros e provoca atrito. É errada, inútil e conflitual. Mais uma vez, é o Estado que cria problemas a si próprio e a todos nós, que pagamos esses erros, pois isso também custa dinheiro.
O autor não segue o acordo ortográfico