Opinião

Omeletas sem ovos

As organizações estruturadas no século passado precisam de se transformar para enfrentar um mercado que sofreu transformações radicais nos últimos 12 meses. Um ambiente que é absolutamente hostil à falta de flexibilidade, afirma o consultor na área da transformação digital Luís Gonçalves

Imaginem que são convidados para uma bela almoçarada de domingo. O vosso anfitrião é grande conhecedor de vinhos, gastrónomo e cozinheiro. Tudo parece indicar terem um almoço diferente.

Imaginem que quando chegam são confrontados com um anfitrião desanimado. Os ingredientes estão em cima da mesa, variados mas sem nexo. Não se percebe qual é o prato que ele quer fazer, nada está cozinhado, nem sequer temperado. Os restantes convidados estão espalhados pela casa, uns leem distraídos num canto da casa, outros andam à procura de qualquer coisa mas não sabem bem o quê, um teima em querer nadar na banheira da casa de banho e ainda um outro insiste que é um dançarino de flamenco e não sai de cima de uma mesa.

Parece-lhe que está tudo um pouco...estranho? Bem-vindo à minha realidade.

Não foram poucas as vezes, em Portugal e lá fora, em que fui surpreendido por organizações em que ninguém tem as orientações necessárias para ajudar a sua empresa de forma eficaz.

Lideranças que lutam pela sobrevivência da sua empresa e para manter os postos de trabalho. Que sentem que estão a fazer de tudo para conduzir a sua equipa numa direção comum mas nada parece resultar. A sua equipa arrasta-se para reuniões visivelmente desmotivada, incapaz contribuir.

Uma característica comum a estas organizações, sejam elas alemãs, portuguesas, árabes ou de outra nacionalidade é a forma desadequada como estão estruturadas. A forma datada como estão pensadas não constitui o ambiente mais propício para incentivar os colaboradores a assumir responsabilidades e compartilhar as iniciativas que têm em mente. Aliás, tudo está pensado para que tal não ocorra. Para que a comunicação não flua e esteja compartimentalizada.

Este é o desenho que herdamos da Era Industrial, militarizado e altamente hierarquizado.

A Era Digital exige um desenho diferente de organização. Pensada para o cliente e para a aceleração de respostas para o mercado. Uma organização com o cliente no seu centro e que é o alfa e ómega da estratégia.

Para que tal ocorra é necessário deitar abaixo barreiras entre departamentos e unificar tudo num fluxo permanente e altamente eficaz de comunicação.

Como?

Em primeiro lugar e antes de tudo, é preciso criar um mecanismo interno, um navegador comum, onde estejam definidos os objetivos da organização, com passos que permitam integrar eficazmente todos os elementos de uma equipa, onde todos podem sentir o seu peso e influência na procura de cumprir os fins da organização.

Este é talvez o ponto de partida mais claro para resolver o problema de uma cozinha desorganizada e ou de uma empresa sem rumo claro. Integrar e comunicar de forma clara e livre. Onde cada um daqueles que a compõem sabe que o seu papel é fundamental para atingir uma meta, sente a sua importância, quer e sabe como acrescentar valor.

Diz-se que não há omeletes sem ovos. É verdade, mas fazer uma omelete com ovos sem frigideira também não é propriamente uma tarefa fácil.

As organizações estruturadas no século passado precisam de se transformar para enfrentar um mercado que sofreu transformações radicais nos últimos 12 meses. Um ambiente que é absolutamente hostil à falta de flexibilidade.

Vivemos e trabalhamos num mundo caracterizado por uma comunicação fluída e que valoriza acima de tudo equipes ágeis na resposta aos desafios e lideranças que incentivam uma força de trabalho a contribuir para a estratégia, missão e visão geral da empresa de uma forma genuína e livre.

Quem acha que tudo isto é dispensável, que pode ser feito amanhã, que as coisas não se aplicam à sua pequena empresa, ao seu negócio mais tradicional... preparem-se para fazer omeletes sem ovos, sem frigideira, sem cozinheiros e num mercado que está a pedir bacalhau assado.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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