Opinião

Celebrar a UE face ao crescente populismo

Na semana em que se celebrou mais um Dia da Europa, a professora do ISCSP realça a necessidade de se continuar a celebrar e defender a União Europeia face à onda crescente de eurocepticismos e de populismos

Andreia Soares e Castro

Esta semana comemorou-se mais um Dia da Europa. A Declaração Schuman, proferida no dia 9 de Maio de 1950 e que deu origem à criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), fica para sempre associada ao início da integração europeia e àquilo que hoje é a União Europeia (UE). O Dia da Europa é um dos símbolos da UE e tem subjacente a ideia de celebrar, mas sobretudo assinalar um projecto que é inigualável, que trouxe a paz para dentro das suas fronteiras e cujas políticas proporcionaram (e continuam a proporcionar) muitos benefícios aos Estados-membros, mas também aos respectivos cidadãos (a paz, a liberdade, o mercado interno, o euro, Schengen, o fim do “roaming” nos telemóveis, etc.).

O Conselho Europeu de Milão, em 1985, ao designar o dia 9 de Maio como o Dia da Europa, reconheceu a importância dos símbolos para aproximar os cidadãos e para construir uma identidade europeia complementar das identidades nacionais dos Estados-membros. De facto, apesar de inspirado e impulsionado pelas elites políticas europeias, o projecto europeu disse sempre respeito aos cidadãos. O objectivo central foi sempre «unir homens» e não apenas «coligar Estados» (Monnet, 1952). Contudo, apesar das inúmeras medidas e iniciativas introduzidas ao longo destes já quase 70 anos de integração europeia para que os cidadãos se identificassem mais com o projecto europeu, como foi a criação da cidadania da UE, a verdade é que a maioria dos europeus continua a considerar a UE complexa e distante e poucos conhecem a sua razão de ser, os valores que representa e defende ou os direitos que têm enquanto cidadãos da UE.

Num período marcado pela saída do Reino Unido da UE e por crescentes desafios externos, mas também internos, como é o crescente apoio aos partidos anti-sistema e eurocépticos, é o descontentamento, a desconfiança e o desinteresse dos cidadãos europeus, a todos os níveis, também nacionais, que justifica a questão recorrente do reforço do sentimento de pertença dos cidadãos à UE e de ir ao encontro das expectativas destes. Este é verdadeiramente um dos maiores desafios da UE, que explica a urgência de prosseguir com a adopção de medidas para aproximar e envolver mais os cidadãos. A comemoração do Dia da Europa é um destes exemplos. Hoje, o Dia da Europa é ocasião para uma multiplicidade de eventos e celebrações, que pretendem não só relembrar a razão de ser da UE e evocar o passado, mas reafirmar o seu valor e actualidade.

Outra medida importante ressalta da proposta de Orçamento para o período 2021-2027 apresentada pela Comissão Europeia, designadamente a duplicação dos recursos financeiros para o Erasmus+ e o Corpo Europeu de Solidariedade. De facto, para celebrar a UE há que reconhecê-la e dar-lhe valor. E que melhor forma de experienciar o espírito europeu do que iniciativas e programas como o Erasmus que, em 2017, fez 30 anos, o Encontro Europeu de Jovens ou o Serviço Voluntário Europeu? Este tipo de iniciativas e programas da UE são extraordinariamente importantes, na medida em que ajudam a desenvolver um sentimento de identidade europeia em complemento das identidades nacionais, regionais e locais e, sobretudo, a reconhecer o lema da UE “unidos na diversidade”, que afirma o contributo positivo da diversidade das culturas, tradições e línguas para a união da Europa. Mais, todos estes programas fomentam valores como a solidariedade, a abertura e a aceitação do outro, que são antídotos contra os populismos, a xenofobia, o ódio e a discriminação. A Casa da História Europeia é outra das iniciativas que se inserem na construção da identidade europeia, conferindo a oportunidade de aprender sobre a história europeia. Uma medida interessante a considerar pelos Estados-membros da UE seria o reconhecimento do Dia da Europa como um verdadeiro feriado europeu.

E se a natureza “sui generis” da UE explica em grande medida o défice emocional e o divórcio entre os cidadãos e a UE, na medida em que não é (nem pretende ser) os «Estados Unidos da Europa», e apesar de existir liberdade de circulação de pessoas permanecem as fronteiras e as identidades nacionais, tal não é obstáculo para a construção de uma identidade europeia, complementar à dos Estados-membros, que emergirá gradualmente das interacções e relações entre os cidadãos dos diferentes Estados-membros.

Por conseguinte, e porque cada nação, cada região e cada pessoa tem sua própria visão da UE, modelada a partir da sua própria experiência cultural ou através de canais como os meios de comunicação, donde se destacam cada vez mais as redes sociais, é importante que a UE continue a investir nos programas de intercâmbio e mobilidade, bem como na diplomacia pública para (re)conquistar as mentes e os corações dos cidadãos. É importante continuar a afirmar a indispensabilidade da UE e dos seus benefícios, respondendo e combatendo a narrativa nacionalista, populista e eurocéptica, demonstrando aos cidadãos porque é que a UE é importante e necessária e reconhecendo, tal como os 27 Estados-membros em Bratislava, que «a UE não é perfeita, mas é o melhor instrumento que temos para superar os novos desafios que enfrentamos».

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