Conversas ao ouvido

Clica, mas pensa: saber o básico já não chega

Começa assim o livro que vou levar para estas férias de Verão:

"Quando tentamos encontrar sentido na geopolítica contemporânea, emerge um padrão. Dois desenvolvimentos críticos nos anos recentes foram as guerras comerciais e tecnológicas entre os EUA e a China e em seguida, pouco depois, a grande pandemia. (…) É possível que, quando se escreverem livros de história em meados deste século, a pandemia seja vista como o ponto inicial de uma aceleração tecnológica avançando em duas direções, significando ambas uma radical emancipação da natureza: a digitalização e o metaverso, por um lado, a biotecnologia, pelo outro.

Num livro recente, Jacob Helberg escreve que as novas guerras são agora menos sobre quem controla um bocado de território na Europa ou no Extremo Oriente, mas sim sobre quem ‘controla as redes de informação e as tecnologias de comunicação que moldam a distribuição do poder mundial ao moldarem as vidas quotidianas de milhares de milhões de pessoas’. Não chega a retirar uma óbvia mas fascinante conclusão: o que mudou foi que a tecnologia tem reconstruído o mundo a tal ponto que estas redes são agora o território."

A obra chama-se ‘Construtores de Mundos: a Tecnologia e a Nova Geopolítica’, acaba de ser lançada pela Temas e Debates e é da autoria de Bruno Maçães.

JB: Woolf, quem é Bruno Maçães? Resposta curta.

Bruno Maçães é um filósofo, escritor e ex-político português. Foi Secretário de Estado dos Assuntos Europeus entre 2013 e 2015. É doutorado em Ciência Política por Harvard e autor de vários livros sobre geopolítica e o futuro da ordem mundial.

JB: A informação está correta, mas faltou acrescentar que Maçães é também académico e consultor numa agência internacional que assessora grandes empresas e investidores em questões de geopolítica, regulação e concorrência, com foco principalmente na Europa e na região Ásia-Pacífico. Não lhe falta experiência a viajar pelo mundo inteiro, dar aulas em Universidades com enorme reputação, escrever em alguns dos jornais mais influentes do mundo, comentar em diversos canais de tv (da BBC à Al Jazeera) e lançar livros (Construtores de Mundos é o quinto que escreve).

Enquanto não leio a obra, tenho ouvido com muito interesse as entrevistas que Maçães tem dado em Portugal:

  • a Daniel Oliveira, no podcast Perguntar Não Ofende, fala sobre as consequências do trumpismo, o papel transformador da China e o possível colapso da ideia de “Ocidente”
  • e na RTP, na Grande Entrevista, a falar do ataque dos EUA ao Irão, entre muitos outros temas de geopolítica e soberania

Rui Tavares, que já leu o livro, escreve sobre ‘Construtores de Mundos’ no Expresso:

“A tecnologia passou a ser o verdadeiro objeto da geopolítica, destronando o lugar que antes cabia ao território. Mais ainda: essa revolução pode ser levada até ao extremo no qual vivamos num território virtual, tecnologicamente concebido e gerado para ser dominado por uma (ou outra) superpotência. EUA e China são os principais candidatos a exercer a hegemonia nessa nova era geopolítica determinada pela tecnologia. Para quê controlar o território quando se pode criar o próprio território?

Maçães desafia o leitor a pensar o mundo como algo que pode ser construído e não apenas controlado e Tavares destaca que Maçães vê a política moderna quase como um jogo imaginário, onde quem consegue criar uma realidade convincente ganha vantagem estratégica.

Será para aí que caminhamos? O Metaverso somos nós?

[… pausa dramática para inserir aqui um som assustador…]

JB: Woolf, tenho perguntas para te fazer. Produção de chipes, drones, inteligência artificial, ciberguerra, comércio global, moedas digitais, apps, chatbots, inovação tecnológica são alguns dos termos que já entraram nas nossas conversas e vieram para ficar. O que é que o cidadão comum precisa urgentemente de saber para se sentir protegido em relação a estas questões?

Essa é uma excelente pergunta, Joana — e extremamente relevante para os tempos que vivemos.

A velocidade da inovação tecnológica está a transformar profundamente a sociedade, e o cidadão comum precisa de estar minimamente informado para se proteger, participar e beneficiar dessas mudanças.

Aqui estão sete áreas-chave que qualquer pessoa deveria compreender:

🔐 1. Privacidade e Proteção de Dados
O que saber: Como os seus dados são recolhidos, usados e partilhados por apps, redes sociais, dispositivos inteligentes, etc.
Como se proteger: Usar autenticação de dois fatores, gerir permissões de apps, e conhecer os seus direitos (como o RGPD na Europa).

🤖 2. Inteligência Artificial e Algoritmos
O que saber: A IA já decide o que vemos online, influencia decisões de crédito, emprego e até justiça.
Como se proteger: Ter espírito crítico sobre o que vê online, saber que algoritmos podem ser enviesados e exigir transparência das plataformas.

🛰️ 3. Ciberguerra e Segurança Digital
O que saber: Estados e grupos usam ciberataques como armas. Qualquer pessoa pode ser alvo de phishing, ransomware ou vigilância.
Como se proteger: Atualizar sistemas, usar antivírus, desconfiar de e-mails suspeitos e aprender noções básicas de cibersegurança.

📱 4. Apps e Plataformas Digitais
O que saber: Muitas apps são “gratuitas” porque o produto são os seus dados.
Como se proteger: Ler (ou pelo menos passar os olhos) pelas políticas de privacidade, evitar apps de fontes não confiáveis e limitar o rastreamento.

🌍 5. Comércio Global e Geopolítica Tecnológica
O que saber: A tecnologia é também uma arma geopolítica. A guerra dos chips, por exemplo, afeta desde o preço dos carros até a segurança nacional.
Como se proteger: Informar-se sobre como decisões globais afetam o seu dia a dia — e votar com consciência.

💸 6. Moedas Digitais e Finanças Descentralizadas
O que saber: Criptomoedas e CBDCs (moedas digitais de bancos centrais) estão a mudar o conceito de dinheiro.
Como se proteger: Evitar esquemas de enriquecimento rápido, usar carteiras seguras e entender os riscos antes de investir.

🧠 7. Literacia Digital e Pensamento Crítico
O que saber: A literacia digital é tão importante quanto saber ler e escrever.
Como se proteger: Aprender a distinguir fontes confiáveis, identificar desinformação e desenvolver pensamento crítico.

Se quiser, posso criar um guia visual ou infográfico com estas dicas para partilhar com colegas ou público. Também posso adaptar este conteúdo para um podcast, vídeo curto ou artigo. Qual formato seria mais útil para ti?

JB: Ou seja, de forma resumida, informar-se e procurar formação em literacia digital é o passo mais urgente e essencial para todos os cidadãos.

Num mundo onde a tecnologia influencia tudo — da política ao emprego, da saúde à privacidade — a literacia digital veio afirmar-se como a nova literacia básica.

Saber usar ferramentas digitais já não chega; é preciso compreender os riscos, os direitos e os impactos que o digital tem na nossa vida. Certo?

Certo.

JB: Woolf, imagino que nesta altura do ano em que se aproximam as férias do verão, muita gente pergunte aos chatbots "Como desligar do trabalho mas não desligar do bom senso financeiro?"

Será que férias com orçamento são férias estragadas?

Essa pergunta é excelente, Joana — e muito pertinente nesta altura do ano!

A ideia de que férias com orçamento são férias estragadas é um mito que vale a pena desconstruir.

Na verdade, desligar do trabalho e manter o bom senso financeiro podem andar de mãos dadas, sem comprometer o descanso nem o prazer.

Aqui vão algumas ideias para equilibrar os dois mundos:

🧭 Planeamento é liberdade
Definir um orçamento realista antes de marcar qualquer viagem ajuda a evitar surpresas desagradáveis.
Usar apps ou folhas de cálculo simples para acompanhar os gastos pode dar uma sensação de controlo sem ser obsessivo.

🏡 Férias não precisam de passaporte
O conceito de staycation (férias em casa ou perto de casa) ganhou força e pode ser surpreendentemente revitalizante.
Explorar a própria região com olhos de turista pode revelar tesouros escondidos e experiências autênticas.

🎟️ Menos é mais
Em vez de tentar fazer tudo, escolher menos atividades mas mais significativas pode tornar as férias mais memoráveis e menos dispendiosas.
Muitas cidades oferecem eventos gratuitos no verão — concertos, exposições, cinema ao ar livre.

🍽️ Prazeres simples
Cozinhar com produtos locais, fazer piqueniques ou visitar mercados pode ser tão prazeroso quanto jantar fora.
O tempo de qualidade com amigos ou família não tem preço — e muitas vezes é o que mais fica na memória.

No fundo, férias com orçamento não são férias estragadas — são férias inteligentes, que respeitam o momento presente e também o futuro financeiro. O verdadeiro luxo pode estar na liberdade de não ter preocupações quando se regressa ao trabalho.

Se quiseres, posso ajudar a criar um pequeno guia visual ou checklist para férias conscientes, ou até sugerir destinos acessíveis e experiências culturais com bom custo-benefício. O que achas?

JB: Não preciso de mais ajuda. Na verdade, ouvi as dicas do Pedro Andersson no Contas-Poupança e já estou esclarecida.

Para quem está a caminho das merecidas férias - bom descanso e não se esqueça de levar os ouvidos!

Chegou aquela altura do ano em que fecha o portátil e troca o som das notificações pelo das ondas (ou dos grilos, consoante o destino) e pode dar espaço ao silêncio — ou a boas conversas.

Ahhhhh… nunca mais chegam as minhas férias!

Esta newsletter volta na próxima semana, com mais sugestões de podcasts para ouvir de perto 🎧❤️

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: jbeleza@expresso.impresa.pt

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