Longevidade

Zonas Azuis: as lições para uma vida longa e saudável

Zonas Azuis: as lições para uma vida longa e saudável
Ilustração Sara Tarita

Há cinco regiões no mundo onde as pessoas vivem mais e melhor. A combinação de fatores determinante para a longevidade inclui hábitos alimentares, estilo de vida, a própria comunidade e, até, genética

Tudo começou com uma curiosidade sobre pessoas que “viviam verdadeiramente felizes e saudáveis até aos 100 anos”. Dan Buettner, investigador da National Geographic, viajou pelo mundo para as conhecer e entrevistar, juntamente com uma equipa de investigadores, incluindo médicos, antropólogos e demógrafos, com o objetivo de perceber o que justificava a sua longevidade.

Foi assim que surgiu o conceito de Zonas Azuis: regiões que se destacam pela longa vida dos seus habitantes, não apenas por serem centenários, mas também por envelhecerem sem doenças. Trata-se não só de viver mais, mas de viver melhor. O nome surgiu porque a equipa começou por sinalizar essas áreas no mapa com círculos azuis. Em 2009, encontraram os cinco locais que cumpriam os critérios definidos: Okinawa, no Japão; Icária, na Grécia; Província de Ogliastra, na Sardenha (Itália); Loma Linda, nos EUA; Península de Nicoya, na Costa Rica.

Além das particularidades de cada uma destas regiões, os especialistas conseguiram detetar nove denominadores comuns que contribuem para a longevidade das populações analisadas:

- Mover-se de forma saudável: Não se trata de ir ao ginásio ou de correr a maratona, mas sim de viver em ambientes que promovem o movimento físico, como por exemplo cultivar uma horta ou ir a pé visitar um amigo;

- Ter um propósito: A investigação mostrou que ter um propósito, isto é, ter uma razão para se levantar de manhã, pode acrescentar até sete anos à esperança de vida. Em todas as Zonas Azuis, as pessoas vivem em função de mais alguma coisa além do trabalho;

- Abrandar: Adotar rotinas que diminuam o stress porque, de acordo com os investigadores, este “conduz à inflamação crónica relacionada com todas as principais doenças resultantes da idade”;

- Regra dos 80%: Parar de comer quando 80% do estômago estiver cheio. Os habitantes das Zonas Azuis guardam a refeição mais ligeira para o fim da tarde ou início da noite e não comem mais até ao final do dia;

- Render-se aos vegetais: Os legumes e as leguminosas são o ponto central das dietas da maioria das pessoas centenárias. Só comem carne, em média, cinco vezes por mês e em doses de cerca de 100 gramas;

- Vinho às 5: As pessoas de todas as Zonas Azuis bebem álcool de forma moderada e regular, normalmente um ou dois copos por dia com amigos e/ou a acompanhar a refeição;

- Tribo certa: As redes sociais dos mais velhos influenciam de forma positiva os seus comportamentos saudáveis. A pesquisa demonstrou que o tabaco, a obesidade, a felicidade e a solidão são “elementos contagiosos”;

- Comunidade: Participar em cerimónias de culto quatro vezes por mês acrescenta quatro a 14 anos à esperança de vida, mostrou a investigação. Só 5 em 263 pessoas centenárias entrevistadas não pertencem a comunidades baseadas na fé;

- Primeiro os que se ama: Durante a sua longa vida, estes indivíduos colocam a família em primeiro lugar, mantendo por perto os pais ou os avós e dedicando tempo aos filhos.

As cinco Zonas Azuis

Okinawa (Japão)

Okinawa
Ippei Naoi/Getty Images

Okinawa é conhecida como a “terra dos imortais”. É a maior ilha de um arquipélago subtropical, onde vivem as mulheres mais velhas do planeta. Talvez o maior segredo dos seus habitantes seja a forte dedicação aos amigos e à família. Mantêm uma rede social chamada “moai”, um círculo de amigos que constitui uma rede de apoio para toda a vida. Têm também um forte sentido de propósito na vida, uma força motriz a que os japoneses chamam “ikigai”, que lhes dá responsabilidade e o sentimento de que são necessários até ao fim da vida. Ao longo do dia, reservam alguns momentos para relembrar os seus antepassados.

Os seniores de Okinawa andam a pé, a suas casas têm muito pouco mobiliário e tomam refeições e relaxam sentados em tapetes de tatami no chão. O facto de se levantarem do chão várias vezes por dia aumenta a força e o equilíbrio do corpo, o que ajuda a proteger contra quedas. Quase todos cultivam ou já cultivaram uma horta: é uma fonte de atividade física diária que exercita o corpo, ajuda a reduzir o stress e, ao mesmo tempo, desfrutam da luz do sol durante todo o ano.

As suas refeições são compostas por legumes salteados, batata doce e tofu, portanto são ricas em nutrientes e baixas em calorias. A carne de porco é reservada apenas para pontuais ocasiões cerimoniais e consumida em pequenas quantidades.

Icária (Grécia)

Icária
Alexandros Dedoukos/Getty Images

Icária é uma ilha grega no mar Egeu, a 12 quilómetros da costa da Turquia, que tem uma das mais baixas taxas de mortalidade em meia-idade e de demência a nível mundial. Um em cada três habitantes chega aos 90 anos de idade.

O seu estilo de vida inclui um ritmo descontraído, sem preocupação com horários, com sestas à tarde e jogos de dominó à noite, fomentando as amizades. As pessoas que dormem regularmente a sesta têm até 35% menos probabilidade de morrer de doenças cardíacas, possivelmente porque tal reduz o stress, explica a equipa de Dan Buettner.

O terreno acidentado da ilha, com ar puro e brisas quentes, atraem-nos para o exterior, o que proporciona um estilo de vida ativo, em que se movimentam com naturalidade. Seguem uma dieta mediterrânica, à base de frutas e vegetais, leguminosas, batatas e azeite. Fazem jejum ocasionalmente, preferem leite de cabra em vez de leite de vaca e bebem chás de ervas aromáticas, como alecrim selvagem, salva e orégãos, que atuam como diuréticos.

Província de Ogliastra, Sardenha (Itália)

Ogliastra
Jeremy Woodhouse/Getty Images

A área montanhosa da ilha italiana da Sardenha foi a primeira Zona Azul a ser identificada. Tem a maior concentração de homens centenários, o que se deve a uma particularidade genética: o marcador M26 está ligado a um aumento da longevidade e, devido ao isolamento geográfico, esse gene permaneceu. Ainda mais importante é o isolamento cultural, o que lhes tem permitido manter um estilo de vida muito tradicional e saudável. Ainda caçam, pescam e colhem os alimentos que comem.

A alimentação consiste em pão integral, feijão, legumes e frutas. A carne é em grande parte reservada aos domingos e ocasiões especiais. Permanecem próximos de amigos e familiares durante toda a vida e é com eles que riem e bebem vinho moderadamente. De acordo com os especialistas, as pessoas que vivem em famílias com ligações fortes e saudáveis sofrem taxas mais baixas de depressão, suicídio e stress.

Outro fator determinante para a longevidade desta população é a importância atribuída aos mais velhos. Os avós desempenham um papel ativo, prestando cuidados aos mais pequenos e transmitindo sabedoria, com o intuito de perpetuar tradições e impulsionar o sucesso das novas gerações.

Loma Linda (EUA)

Loma Linda
Sebastian Kopp/Getty Images

Em Loma Linda, na Califórnia, encontra-se a comunidade com o maior número de Adventistas do Sétimo Dia nos Estados Unidos, onde alguns habitantes vivem mais dez anos, de forma saudável, do que a média dos norte-americanos. Tal como acontece com outras fés, esta igreja encoraja e oferece oportunidades aos seus membros para fazerem voluntariado, o que permite que se concentrem na ajuda ao próximo e evitem possíveis estados de depressão.

Para sair da vida quotidiana, ao sábado dedicam-se à família, aos amigos e à natureza, além da fé, fortalecendo os laços sociais, o que está comprovado que beneficia a saúde no geral e a longevidade. Os adventistas tendem a passar tempo com outros adventistas, o que lhes proporciona bem-estar ao partilhar valores e apoiando-se mutuamente nos seus hábitos.

Preocupam-se em manter um índice de massa corporal saudável, ou seja, o peso adequado à altura, o que permite baixar a pressão arterial, ter menos colesterol e menos doenças cardiovasculares. Para isso, incluem frutos secos, frutas e leguminosas na alimentação, além de pouco sal e pouco açúcar. Fazem uma refeição leve e cedo ao jantar, bebem muita água e comem carne com moderação. Muitos adventistas seguem mesmo uma dieta vegetariana.

Península de Nicoya (Costa Rica)

Nicoya
Christian Aslund/Getty Images

Esta é a comunidade onde a população tem a taxa de mortalidade em meia-idade mais baixa do mundo e a segunda maior concentração de homens centenários. O segredo passa por ter um plano de vida: os centenários bem-sucedidos têm um forte sentido de propósito. Sentem-se necessários e querem contribuir para um bem maior.

O sentimento de pertença também está associado à relação com as famílias, com quem vivem, contando com o apoio de filhos ou netos. Além disso, recebem visitas frequentes dos seus vizinhos, com quem riem e apreciam o que têm.

A dieta tradicional baseia-se em abóbora, milho e feijão e comem um jantar leve ao início da noite. A água de Nicoya tem o maior teor de cálcio da Costa Rica, o que poderá explicar as taxas mais baixas de doenças cardíacas, assim como ossos mais fortes e menos fraturas da anca, de acordo com a investigação.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: scbaptista@impresa.pt

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