Numa parede do bar da associação de moradores há uma estante com uma minibiblioteca, noutra uma peça de artesanato pendurada e dentro da vitrine em cima do balcão estão dois tabuleiros de xadrez. Santana está sentado à mesa, rodeado por uma dezena de moradores de um bairro da Ameixoeira, junto ao aeroporto de Lisboa.
Há dez anos que Santana Lopes não visitava o Bairro das Calvanas, que ajudou a realojar enquanto foi presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Mas foi por lá que passou uma parte da tarde desta segunda-feira, de forma discreta, sem bandeiras, sem música, fora da agenda pública, mas em campanha para as legislativas pelo partido Aliança. Antes ainda de se juntar à mesa com os moradores, percorreu, de carro, as ruas do bairro. “Vim aqui ver como estão as coisas”, diz Santana Lopes, presidente do Aliança e cabeça de lista por Lisboa, admitindo que ainda irá visitar outros bairros sociais.
O bar é o orgulho dos moradores, que apontam para a placa onde se lê A.M.B.C., de Associação de Moradores do Bairro das Calvanas. Nunca antes, contam, tinham aberto as portas do bar a um político. “Foi o primeiro”, diz Manuel Meireles, presidente da associação. Também dizem não ter memória de nenhuma outra campanha eleitoral a passar por ali e é preciso recuar cerca de dez anos para se lembrarem da última passagem de Santana Lopes pelo bairro.
Foi a 20 de agosto de 2009, durante a campanha para as autárquicas, quando voltou a candidatar-se à presidência da câmara de Lisboa. Nessa altura, acabaria por perder, com 38,69% dos votos, para António Costa, que venceu com 44,01%.
Visita-surpresa
O então membro do PSD já era elogiado pelos moradores pelo papel que teve no bairro. E também nessa altura já Santana falava do Bairro das Calvanas como um modelo de realojamento social. Naquele bairro, hoje, vivem cerca de 350 pessoas, divididas por uma centena de moradias de três e quatro assoalhadas, todas iguais, ao longo de dois quilómetros de ruas. São moradores do anterior bairro das Calvanas, que começou a ser demolido em 2005, depois de um crescimento exponencial nos anos 70 e 80 com o regresso dos portugueses que estavam nas ex-colónias.
Desta vez, Santana quis ser tão discreto na sua visita ao bairro que nem a associação de moradores soube da mesma com antecedência. Foi uma surpresa quando, esta segunda-feira, à hora de almoço, lhes ligaram a perguntar se poderiam receber o líder do Aliança. É que mesmo na agenda oficial de campanha do partido constam apenas ações em várias estações de comboio do distrito de Lisboa, além de distribuição de panfletos.
A visita aos bairros sociais é, para o Aliança, uma das formas de pôr em prática um dos motes da campanha: “O contacto com a população”. E do programa eleitoral do partido faz parte o “combate sem tréguas a guetos e flagelos sociais, designadamente bairros e construções clandestinas que potenciam a exclusão social, e a marginalização dos residentes e criando focos de instabilidade social indesejáveis”, que defendem que seja feito “em conjunto com o poder local”.
“Graças ao doutor Santana”
À mesa no bar da associação, Santana recordou o momento em que se deparou com o problema do realojamento do bairro e assumiu não ser fácil gerir processos de integração de comunidades realojadas.
“O principal problema neste caso é que, na altura, as pessoas se sentiam enganadas”, recorda. “E foi um caso complexo.” Só a 1 de fevereiro de 2007 os moradores se transferiram para o bairro atual, que hoje dizem ser um “enclave” entre os bairros sociais da Ameixoeira, como aponta Manuel Meireles, presidente da associação.
Foi ele quem andou atrás de Santana Lopes quando era presidente da câmara – como, aliás, já tinha feito com Nuno Krus Abecassis, anterior autarca de Lisboa – para que o realojamento do bairro das Calvanas avançasse. “Este bairro existe graças ao doutor Santana Lopes. E é claro que aqui cada um vota no partido que quiser, mas eu voto no seu pelo que fez por nós.”, diz o presidente da associação. “E até já tentámos dar o seu nome a uma rua no bairro, mas não deixaram.”