Legislativas 2019

“Não há um compromisso em relação às vítimas de crimes em nenhum programa eleitoral”. A análise da APAV às propostas dos partidos

“Não há um compromisso em relação às vítimas de crimes em nenhum programa eleitoral”. A análise da APAV às propostas dos partidos
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Propostas que ou “são vagas” ou “limitam-se a reproduzir medidas, soluções e programas que já existem” ou revelam “desconhecimento”. A apreciação é da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, que olhou para os programas eleitorais dos diferentes partidos que concorrem às legislativas do ponto de vista dos direitos das vítimas de crimes

“Não há um compromisso em relação às vítimas de crimes em nenhum programa eleitoral”. A análise da APAV às propostas dos partidos

Helena Bento

Jornalista

“Falta de compromisso em relação às vítimas de crimes em geral”, propostas “sem caráter inovador” e que se limitam a “reproduzir medidas, soluções e programas já existentes” ou “vagas” ou que “revelam desconhecimento técnico e científico nas áreas do direito. Eis algumas das conclusões da análise realizada pela APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) aos programas eleitorais dos partidos com representação parlamentar que concorrem às eleições legislativas de 6 de outubro, centrada nos direitos das vítimas de crimes.

Na parte dedicada às conclusões, a associação começa por afirmar que as vítimas de crimes “são alvo de graus de atenção muito díspares” muito parte dos partidos políticos cujos programas foram analisados — se em alguns destes programas é possível “encontrar um elenco de propostas significativas”, noutros a “vítima está quase ou mesmo totalmente ausente”. A associação salienta a ausência de uma “visão global e integrada” na abordagem dos diferentes partidos à questão dos direitos das vítimas de crimes, caracterizada como “parcelar e fracionada”, e de um “compromisso” em relação às vítimas. “Em nenhum dos programas eleitorais encontramos uma ideia de política e de compromisso relativamente às vítimas de crimes em geral, de qualquer crime”, lê-se na análise, segundo a qual os diferentes programas “centram-se quase em exclusivo na problemática da violência doméstica”, havendo “uma ou outra referência a vítimas de outros tipos de crimes, designadamente crimes sexuais e tráfico de seres humanos”.

“Nenhuma preocupação” quanto às assimetrias regionais na resposta às vítimas

Outra conclusão diz respeito às vítimas com necessidades especiais de proteção, que não recebem, entre si, a mesma atenção por parte dos partidos. A disparidade verifica-se na atenção dada a crianças e idosos vítimas de crimes, por um lado, e outras vítimas consideradas vulneráveis, como é o caso das pessoas com deficiência. Mesmo a atenção dada aos primeiros levanta dúvidas, uma vez que “nem sempre é acompanhada das necessárias medidas políticas”, como a “criação de espaços para entregas de crianças e visitas supervisionadas no âmbito da regulação das responsabilidades parentais”, que nenhum dos programas eleitorais analisados inclui. Corrigir as assimetrias entre o litoral e os centros urbanos e o interior e as zonas rurais no que diz respeito às respostas dadas às vítimas de crimes também não parece ser uma preocupação para nenhum partido, visto que “em nenhum programa eleitoral se vislumbra a preocupação de corrigir ou pelo menos mitigar” estas assimetrias.

Referindo-se já não aos programas mas às propostas contidas em cada um deles, a APAV destaca que muitas das propostas “limitam-se a reproduzir medidas, soluções e programas já existentes”, não sendo, por isso “inovadoras”, e que algumas delas são “vagas” e revelam “desconhecimento técnico e científico nas áreas do direito, da criminologia e da vitimologia”. Quanto a este último aspecto, diz a associação que “continuar a pugnar pelo aumento de penas quando hoje se sabe que não é o caminho mais eficaz para a prevenção e combate à criminalidade, falar em crimes de pedofilia confundindo conceitos da área do direito e da psiquiatria, ou adulterar princípios básicos da denominada justiça restaurativa”, resulta, na prática, na “apresentação de propostas desadequadas e que não vão ao encontro das reais necessidades das vítimas de crimes”.

Ausente de todos os programas eleitorais está também a referência à necessidade de promover investigação científica nesta área, afirma a APAV, sublinhando que já não é realizado “há largos anos” em Portugal “um inquérito sobre vitimação, que dê uma ideia aproximada da criminalidade realmente praticada”. “Insuficiente” são também os dados estatísticos sobre o assunto, algo que, segundo a associação, passa ao lado dos partidos.

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