Guerra no Médio Oriente

Hamas acusa Israel de “empatar” negociações para cessar-fogo, Telavive quer investigar “erros” do 7 de outubro (guerra, dia 281)

Benjamin Netanyahu e o seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, têm visões opostas sobre a investigação às falhas de segurança durante os atentados do Hamas
Benjamin Netanyahu e o seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, têm visões opostas sobre a investigação às falhas de segurança durante os atentados do Hamas
Abir Sultan/Reuters

O grupo islamita, que tinha deixado cair a exigência do fim da guerra em território palestiniano antes de haver lugar a conversações, disse esta quinta-feira que não foi posto a par dos progressos da atual ronda de negociações. Em Telavive, o ministro da Defesa pediu a criação de uma comissão de inquérito para apurar o que falhou antes e durante o atentado do Hamas

Maria Monteiro

Jornalista

O Hamas acredita que Israel está a “empatar” as negociações para um cessar-fogo na Faixa de Gaza de forma a “ganhar tempo” para “sabotar” os trabalhos a decorrer atualmente nesse sentido, “à semelhança do que tem acontecido noutras rondas”, de acordo com um comunicado citado pela agência noticiosa Reuters.

O grupo paramilitar islamita acrescentou que os mediadores egípcios e qataris, apoiados pelos norte-americanos, que têm estado reunidos entre o Egito e o Qatar nos últimos dias, não têm fornecido informações sobre a evolução das negociações para alcançar o cessar-fogo no território palestiniano.

Husam Badram, representante político do Hamas, afirmou à Al Jazeera que “se tornou evidente” que Benjamin Netanyahu é “pessoalmente responsável” por perturbar o curso da atual e das anteriores rondas de negociações,

O assunto voltou a ganhar força esta semana, depois de o Hamas ter declarado, no sábado passado, que abdicaria do compromisso, por parte de Israel, em por termo à guerra como exigência prévia para dar início às negociações.

A cedência por parte da milícia islamita renovou as esperanças de que um acordo entre as partes pudesse estar mais próximo de ser conseguido. Contudo, na noite de domingo, o primeiro-ministro israelita divulgou uma lista de quatro condições inegociáveis para Israel participar nas conversações, incluindo o direito das tropas israelitas a retomar os combates até que os seus objetivos sejam cumpridos.

A ação de Benjamin Netanyahu levou vários representantes políticos e diplomáticos, dentro e fora de Israel, a acusar o líder israelita de boicotar a tentativa para chegar a um acordo. Estas alegações multiplicaram-se à medida que o Exército israelita foi sitiando a Cidade de Gaza nos últimos dias, com o argumento de que estaria à procura de militantes do Hamas, forçando milhares de civis a fugir e deixando um rasto de destruição em bairros residenciais, escolas, campos de refugiados e instalações da UNRWA (agência da ONU para os refugiados palestinianos).

Apesar do cenário agreste desta semana, Netanyahu continua a dizer-se “empenhado” no acordo para implementar tréguas e libertar os reféns, mas clama que “os assassinos do Hamas estão a fazer exigências que (...) põem Israel em perigo”. O primeiro-ministro israelita distanciou-se ainda mais de um possível consenso com o Hamas ao exigir que Israel mantenha o controlo do território palestiniano de Rafah, junto à fronteira com o Egito, e do chamado Corredor de Filadélfia, uma faixa de 14 km ao longo da fronteira, noticiou a Al Jazeera. Esta reivindicação contradiz a posição do Hamas, que exige a retirada total dos israelitas.

“Ainda há um longo caminho a percorrer antes de fecharmos o acordo, se conseguirmos fechá-lo”, declarou o conselheiro de segurança nacional da Casa Branca. Jake Sullivan reconheceu que o acordo não estará “imediatamente ao virar da esquina, mas não tem de estar muito longe, se todos tiverem a vontade de o conseguir”.

Em Telavive, o ministro da Defesa solicitou a criação de uma comissão de inquérito para averiguar os erros cometidos pelas autoridades israelitas antes e durante os ataques do Hamas a 7 de outubro de 2023. Para Yoav Gallant, a investigação deve “examinar as falhas operacionais e de inteligência (...) lidar com o processo de gestão da guerra e abordar a acumulação de forças do Hamas na última década”.

Ressaltando que o Exército israelita deve “reconstruir a confiança que foi danificada”, o ministro observou que o inquérito deve visá-lo a si, a Netanyahu e a altos responsáveis do exército e das agências de segurança israelitas, Mossad e Shin Bet. Com o pedido de investigação, Gallant afasta-se novamente do pensamento de Netanyahu, que considera que o inquérito deve apenas ser concretizado após o final da guerra contra o Hamas.

Até agora, lembra a Lusa, houve duas demissões de altos cargos das forças armadas relacionadas com as falhas de segurança do 7 de outubro: o chefedos serviços secretos militares, Aharon Haliva, demitiu-se a 22 de abril e Avi Rosenfeld, comandante da divisão de Gaza, que se demitiu a 9 de junho.

Outras notícias que marcaram o dia:

As tropas israelitas terão atirado sobre civis que cumpriam as ordens de evacuação emitidas na quarta-feira para a Cidade de Gaza, de acordo com vários relatos reunidos pela Al Jazeera. No bairro de Shujayea, cenário de acesos combates desde o início da semana, as forças de Telavive terão aberto fogo sobre residentes que seguiam as rotas indicadas como seguras.

⇒ Mais de 60 meios de comunicação social internacionais, como a CNN, BBC, Agence France-Presse, ‘The Guardian’ e ‘The New York Times’, publicaram uma carta aberta em que apelam a Israel que conceda o “acesso imediato e independente” de jornalistas à Faixa de Gaza, informou a Lusa. Passados nove meses de conflito, os jornalistas internacionais continuam sem acesso a Gaza, “com exceção de raras viagens escoltadas organizadas pelo exército israelita”.

⇒ O Presidente da Turquia acusou o Governo dos EUA de “cumplicidade” em alegados crimes de guerra cometidos por Israel contra Gaza. Em entrevista à revista ‘Newsweek’, Recep Tayyip Erdogan criticou Washington por ignorar as “violações” de Telavive no enclave palestiniano, cujos residentes “estão simplesmente a defender as suas casas, as suas ruas e a sua pátria”.

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