Guerra no Médio Oriente

“Passei pelo Inferno”: refém libertada pelo Hamas conta que foi agredida, mas descreve o tratamento em cativeiro como “gentil”

Yocheved Lifshitz durante a conferência de imprensa no Hospital Ichilov, em Telavive
Yocheved Lifshitz durante a conferência de imprensa no Hospital Ichilov, em Telavive
JANIS LAIZANS

A libertação de duas idosas ocorre três dias após duas reféns, mãe e filha, terem sido libertadas. O Hamas ainda terá mais de 200 pessoas retidas em Gaza. Yocheved Lifschitz, de 85 anos, descreve como “limpas” as condições de cativeiro e diz que era alimentada com a mesma comida dos captores

Yocheved Lifschitz, de 85 anos, é uma das duas reféns libertadas esta segunda-feira pelo Hamas, após mais de duas semanas de sequestro em Gaza, na sequência dos ataques de 7 de outubro em território israelita. Numa conferência de imprensa no Centro Médico Ichilov, em Telavive, onde está internada, a idosa, que foi fotógrafa e professora, descreve o rapto do kibbutz onde vivia, Nir Oz, e que foi um dos mais fustigados pela violência do Hamas. "Vivi o inferno", contou aos jornalistas.

"Puseram-me numa mota... com um terrorista a segurar-me pela frente e outro por trás, para que eu não caísse. Atravessámos a vedação da fronteira para a Faixa de Gaza e, inicialmente, detiveram-me na cidade de Abasan al-Kabira, que fica perto do [Kibutz] Be'eri. Depois disso, não sei para onde me levaram", descreveu à imprensa internacional, entre a qual se encontrava a BBC. Durante a viagem, foi esmurrada e agredida com paus, até ser “tão doloroso”, que Yocheved não conseguia respirar. Retiram-lhe também o relógio e as joias.

Terminada a viagem de mota, Yocheved foi recebida por membros do Hamas que lhe disseram que acreditavam no Corão eque, por isso, não a iriam magoar. Conta que caminhou vários quilómetros em chão molhado até chegar a uma série de túneis, semelhantes a uma “teia de aranha”.

A idosa e mais quatro reféns foram levados até uma sala separada. Yocheved confessa que o tratamento era “gentil” e que as necessidades básicas eram cuidadas. Eram ainda visitados por um médico regularmente e tinham acesso a medicamentos.

Descreve como “limpas” as condições de cativeiro, embora dormissem em colchões no chão, nos túneis sob Gaza. Enquanto esteve refém, era-lhe dado pão, queijo e pepino como refeição, a mesma comida da qual os raptores do Hamas se alimentavam.

Yocheved afirma que o grupo parecia "realmente preparado" e que todo o plano já teria sido planeado há muito tempo.

Quando viu a mãe despedir-se de um membro do Hamas, em vídeo, no momento em que foi libertada, Sharone Lifschitz, filha de Yocheved, afirmou à BBC que o gesto descrevia o caráter da mãe: “É tão ela”, comentou Sharone, que serviu de tradutora nas declarações da mãe à imprensa.

Oded, marido de Yocheved, de 83 anos, continua refém. "O meu pai estava a ficar mais frágil”, explicou Sharone também à BBC. "Ele fala bem árabe, por isso, pode comunicar muito bem com as pessoas de lá. Conhece muita gente em Gaza. Quero pensar que ele vai ficar bem.”, diz.

Oded é um jornalista do jornal Al-Hamishmar, que é publicado em Israel e na Palestina. “Estava muito empenhado nos direitos dos palestinianos e em trabalhar para a paz com os nossos vizinhos”, explicou a filha. Recentemente, Oled tinha-se voluntariado numa organização local para transportar palestinos doentes de Gaza até aos hospitais israelitas.

Yocheved criticou ainda o exército de Israel, ao afirmar que não tinham levado a sério as ameaças do Hamas. "Mostraram-nos do que eram capazes, ao queimar os nossos campos, mas não levaram isso a sério", declara.

Para além de Yocheved Lifschitz, foi na segunda-feira também libertada Nurit Cooper, de 83 anos, Até ao momento o Hamas já deixou quatro pessoas abandonar o cativeiro: Judith Tai Raanan, residente na zona de Chicago, e a filha, Natalie Shoshana Raanan, foram as primeiras, na sexta-feira à noite.

Texto de Eunice Parreira editado por João Pedro Barros

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