O Parlamento Europeu (PE) debateu na manhã desta quarta-feira a situação em Israel e na Palestina.
A sessão plenária arrancou com a notícia avançada por Ursula von der Leyen de que a União Europeia triplicou “imediatamente” o apoio a civis na Faixa de Gaza e criou uma ponte aérea com o Egito. Os primeiros dois aviões, com ajuda humanitária da UNICEF, deverão partir ainda esta semana.
A medida visa fazer frente à crise humanitária que se está a agravar e a urgência na chegada de ajuda humanitária, explicou a presidente da Comissão Europeia “A UE sempre foi o maior doador internacional para a Palestina e isso não vai mudar”, afirma.
UE sublinha que Israel tem direito a defender-se, mas sempre dentro dos limites da lei internacional
Nas declarações do arranque da sessão desta quarta-feira em Estrasburgo, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Espanha (atual presidente do Conselho da UE) condenou os ataques do Hamas e sublinhou a diferença entre esta organização terrorista e o povo da Palestina, ponto de consenso nas intervenções subsequentes.
José Manuel Albares sublinhou também que Israel tem o direito a defender-se, mas sempre dentro dos limites da lei internacional. Na mesma linha, o chefe da diplomacia da União Europeia Josep Borrell, sublinhou que o direito à defesa “tem limites”, que neste caso são os limites impostos pelo direito internacional e pelo direito humanitário. “As guerras são coisas terríveis mas têm regras”, defendeu. E aponta bombardeamentos a hospitais e o corte de água e comida como claras violações destas regras.
O alto representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança condenou as ações do ataque e lamentou a perda de vidas na Palestina. “Creio que temos também de condenar as vítimas que temos em Gaza, porque condenar uma tragédia não nos impede de condenar outra.”
Com as suas ações recentes, o Hamas provou merecer o título de “organização terrorista” que a UE lhes atribui, defendeu. E acrescentou que esta organização tem sabotado qualquer esforço de paz na região. “As pessoas da Palestina também são vítimas do Hamas. Não podem ser responsabilizados pelas ações do Hamas.”
Josep Borrell, que diz já ter visto quatro guerras como esta na sua carreira, defende uma atitude proativa para resolver conflito e “quebrar ciclo de violência”, evitando o ressurgimento de guerras nos próximos anos. “Enquanto não houver paz não haverá exército forte o suficiente para assegurar segurança de Israel.”
Por isso, sublinha a necessidade de relançar o processo que permita concretizar os Acordos de Oslo e a solução dos dois estados.
Pela primeira vez, UE ativa nova legislação para obrigar rede social X a remover conteúdo de incitação ao ódio
Alinhada com José Manuel Albares e Josep Borrell, Ursula von der Leyen condenou veemente o ataque desta segunda-feira a um hospital em Gaza, considerando não haver “qualquer justificação” para um ato destes.
“O Hamas é um grupo terrorista e o povo palestiniano esta a sofrer às mãos do Hamas. Não há qualquer contradição”, considerou Ursula von der Leyen. “Os atos do Hamas estão totalmente desligados das aspirações do povo da Palestina."
“A Europa está ao lado de Israel” e estará “sempre do lado dos Direitos Humanos", defendeu. “Só reconhecendo a dor e o direito a defender-se de Israel, podemos defender que Israel deve agir como Democracia [dentro dos limites da lei internacional].”
A presidente da Comissão Europeia lembrou que as ações do Hamas têm “enormes implicações” na situação regional. “O tempo de guerra deve ser também um tempo de diplomacia implacável.”
Lembrando os recentes ataques na Europa, Ursula von der Leyen alertou que “o terrorismo está a regressar". A presidente da Comissão Europeia apontou também o aumento de incidentes antissemitas na Europa, com ataques a sinagogas e incremento no discurso de ódio a circular.
“É nosso dever assegurar que os nossos tempos negros não voltam. Temos de proteger as vidas judaicas na Europa”, defendeu. Por isso, pela primeira vez, UE está a usar a nova legislação que obriga redes sociais a retirar conteúdo que incita à violência e ao ódio. O processo foi já lançado para exigir isto junto da X (ex- Twitter). “Na Europa há tolerância zero ao ódio, online ou nas nossas ruas.”
Ursula von der Leyen abandonou o plenário após a sua intervenção, o que foi fortemente criticado por vários dos deputados que intervieram na sessão. A presidente tem sido alvo de fortes críticas pela forma como tem lidado com o conflito, vista como excessivamente parcial em prol de Israel.
Borrell alerta para “terrível tempestade” que se aproxima e sublinha que Ocidente “não pode cometer novos erros”
Já nos comentários finais ao debate, o chefe da diplomacia da UE defendeu que “a comunidade internacional tem de fazer algo porque foi a comunidade internacional que criou a divisão na região” e que o Ocidente “não pode cometer novos erros”.
Josep Borrell alertou que podemos estar prestes a entrar numa nova fase do conflito entre Israel e Palestina, “bem mais negra” que as anteriores. E voltou a sublinhar a necessidade de ter capacidade de condenar atrocidades cometidas dos dois lados, mesmo do lado “que nos possa ser mais próximo” sob o risco de “perder autoridade moral” se não o fizermos.
O Alto Representante da União com a pasta dos Negócios Estrangeiros assinala a necessidade de combater as notícias falsas e apelou aos eurodeputados para que parem de dizer que o apoio enviado a Gaza está a ir parar a Hamas. “Não é verdade”, há controlos para assegurar que isto não acontece, garante.
E respondeu às críticas por não se ter ainda deslocado a Israel, assegurando que não tem poupado esforços diplomáticos para lançar processo de paz.
Numa escala mais abrangente, Josep Borrell adverte para os sinais de um possível conflito entre o mundo ocidental e o mundo islâmico, considerando que esta é uma “terrível tempestade” que se advinha e que deve ser evitada". “A História ensinou-nos que as decisões mais importantes são tomadas quando estamos à beira do abismo. Acredito que é nesse ponto que estamos.”
O debate desta manhã contou com a intervenção dos portugueses Pedro Marques e Marisa Matias. O eurodeputado do PS defendeu que “proteger os civis é uma obrigação moral e legal de todos” e que só com “uma paz duradoura entre dois estados” será possível “travar a espiral de medo e violência que há décadas martiriza a israelitas e palestinianos". Já a eurodeputada do BE sublinhou a “condenação total” das ações do Hamas, mas exigiu o “mesmo rigor” na condenação das violações do direito internacional por Israel . "Não podemos aceitar a punição coletiva de um povo. Quantos milhares de pessoas inocentes terão de morrer em nome do direito à defesa?”
[O Expresso viajou para Estrasburgo a convite do Parlamento Europeu]