Em Kfar Aza, aldeia onde se empilham os corpos, entre casas e carros queimados e mobília espalhada pelo chão, sinais de terror e devastação, os primos de Yafi Shpirer, de 67 e 68 anos, morreram também, no famigerado sábado, 7 de outubro. “Os meus primos,Orly Pinko e David Shwartzman, foram assassinados no sábado, no primeiro dia do ataque terrorista, quando estavam dentro de casa”, refere Yafi Shpirer, em entrevista ao Expresso. De acordo com os jornalistas da BBC, os assassinatos terão ocorrido logo nas primeiras horas de sábado naquele kibutz perto de Sderot, mas também, neste caso, perigosamente perto de Gaza.
Atacado por elementos do Hamas, Kfar Aza é hoje um lugar proibido para pessoas mais sensíveis, tão imenso é o horror. Mas, na terça-feira, três dias depois dos ataques, os boatos - não confirmados - eram de que até bebés teriam sido decapitados ali. “Na mesma aldeia, encontraram 40 crianças mortas; nem quero pensar sobre isso…”, admite Yafi Shpirer, cidadã israelita que dentro de dois dias completará 64 anos (até ao momento não há confirmação sobre a veracidade das notícias que circulam e dão conta destas quatro dezenas de menores mortos).
Os soldados israelitas que demoraram 12 horas a chegar ao local encontraram mulheres decapitadas, corpos envolvidos em sacos plásticos, um cheiro intenso a putrefação, e vários indícios daquilo a que chamaram “crimes de guerra”. Mas a incerteza quanto ao que se passou verdadeiramente em Kfar Aza ainda é tanta que Yafi Shpirer desconhece como terão sido mortos os seus entes queridos: “Tiros ou algo pior. O Hamas entrou na casa deles, e matou-os no seu lugar mais seguro." No entanto, o desespero por confirmar as mortes, mesmo que à distância, consumiu-a. “O homem que levou o meu sobrinho à morgue mostrou-nos uma fotografia. Nós reconhecemo-los."
Quando Yafi Shpirer ligou a televisão, às primeiras horas de sábado, a vida mudou. Já se tinha alterado antes, com as sirenes a ecoarem e os estrondos da salva de dois mil mísseis enviados de Gaza contra Israel. Mas a crueza das novas circunstâncias demorou um pouco mais a revelar-se na totalidade. “Entre sábado e domingo, foram 48 horas de uma tensão muito intensa, uma sensação desconhecida de fim da vida. Quando não se sabe o que está a acontecer, não se pode estar seguro.” Yafi Shpirer, como milhões de israelitas - e não só -, passou, assim, a ouvir ininterruptamente uma banda sonora feita de ruído e de medo. “Quando coisas assim acontecem, a televisão fica sempre ligada. Tentamos desligá-la, para passar tempo com os nossos netos, brincar um bocadinho com eles até eles saírem, mas é uma bomba-relógio. E ouvimos as explosões daqui, não é um barulho agradável. Não é música."
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