A Turquia congratula-se com a queda de al-Assad às mãos dos rebeldes islâmicos e com o fim de cinco décadas do governo do partido Baath, e apoia o movimento que tomou Damasco. "O regime de al-Assad entrou em colapso e (o poder) no país mudou de mãos", disse Hakan Fidan, chefe da diplomacia turca, no Fórum de Doha, que se realiza no Qatar, revelando que está em contacto com os rebeldes e que o presidente sírio estará fora da Síria. "É claro que isto não aconteceu da noite para o dia. O país está em crise há 13 anos", acrescentou Fidan. Nesse sentido instou os atores internacionais e regionais a ajudarem a garantir uma "transição suave" na Síria.
O ministro dos Negócios Estrangeiros avisou que qualquer novo governo na Síria não deve ameaçar os países vizinhos, esclarecendo que, antes do Fórum de Doha, a Turquia tinha trabalhado com os sírios e os atores regionais e internacionais para "assegurar aos países da região que a nova administração e a nova Síria não representarão uma ameaça para os vizinhos". "Pelo contrário, a nova Síria resolverá os problemas existentes e eliminará as ameaças", sustentou.
A Turquia abriga uma grande comunidade de refugiados sírios, estimando-se que, só em Istambul, residam mais de meio milhão. Este domingo, mal se conheceram as notícias da queda do regime de al-Assad, centenas de sírios reuniram-se na grande mesquita no distrito de Fatih, em Istambul, um dos epicentros da comunidade síria, felizes por se "livrarem de Assad". "Não pensei que isso aconteceria um dia, nem mesmo em três séculos! Ninguém esperava, é uma grande vitória!", exultou Mohamad Cuma, um estudante sírio que chegou de Alepo há três anos.
"É incrível, sentimos que renascemos", diz Sawsan Al-Ahmad, incrédula, segurando o filho numa das mãos. Esta mãe viveu os primeiros meses do cerco impiedoso de Homs pelas forças do regime sírio em 2011, e está encantada com a ideia de levar o filho "para a terra natal", agora que o governo da família Assad terminou. Atrás dela, sob uma chuva torrencial, centenas de sírios entoam "Allah akbar!" ("Deus é Grande!"), alguns apelam à execução de Bashar al-Assad enquanto agitavam bandeiras da revolução síria.
No meio desse ao rebuliço, e audível a centenas de metros de distância, um homem segurava um retrato de Abdel-Basset al-Sarout, um ex-astro do futebol sírio que se tornou um combatente rebelde e morreu em 2019 em confrontos com as forças do regime de al-Assad.
Também a França saúda a queda do regime sírio. Em comunicado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros francês considerou este domingo um "dia histórico para a Síria e para o povo sírio" devido ao fim do regime de Assad, após "mais de 13 anos de repressão e grande violência". Basher al-Assad deixa um país "esvaziado de uma grande parte da sua população que, se não foi para o exílio, foi massacrada, torturada e bombardeada com armas químicas pelo regime e pelos seus aliados", segundo a mesma fonte.
Agora é o momento é "o momento da unidade" e para isso apelou ao "silêncio das armas, à preservação das instituições do Estado, ao respeito pela soberania e integridade territorial da Síria". Também deve existir "uma transição política pacífica que respeite a diversidade do povo sírio, protegendo os civis e todas as minorias, em conformidade com o direito internacional", numa rejeição de "qualquer forma de extremismo".
A diplomacia francesa convidou ainda os seus parceiros a fazerem tudo o possível para ajudar os sírios a entrar "no caminho da reconciliação e da reconstrução através de uma solução política inclusiva" e que respeita " a vontade do povo".
De Londres chega idêntico aplauso à queda do regime de Bashar al-Assad. O Governo britânico saudou este domingo a transição de poder na Síria e apelou a uma "resolução política". "A situação parece muito grave e se o regime caiu, saúdo a notícia, mas o que precisamos é de ver uma resolução política alinhada com as resoluções da ONU", avançou a vice-primeira-ministra e também ministra da Coesão Territorial, Angela Rainer, num programa no canal televisivo Sky News.
De acordo com a política trabalhista, é necessário "ver protegidos os interesses dos civis e das infraestruturas, pois há muitas pessoas que perderam a vida e é preciso estabilidade na região". Rayner também observou que Bashar al-Assad "não foi exatamente bom para os sírios" e que "a ditadura e o terrorismo criam problemas para os sírios, que já sofreram muito, e também desestabilizam a região".
Para a Alemanha a queda de Assad significa "um grande suspiro de alívio" para milhões de sírios, após anos de guerra e opressão, afirmou este domingo a ministra dos Negócios Estrangeiros, Annalena Baerbock. No entanto, alertou que o país "não deve agora cair nas mãos de outros radicais, independentemente da forma que tomem". Baerbock apelou à proteção de todas as minorias étnicas e religiosas do país, a um processo político inclusivo e instou a comunidade internacional a garantir que a Síria "finalmente escape do ciclo de guerra e violência".
De Israel, a reação chegou pela voz do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, que descreveu a queda do regime de Assad como um "dia histórico". Durante a visita a uma zona próxima da fronteira com a Síria, revelou que já deu ordens às forças israelitas para que ocupassem áreas na zona tampão desmilitarizada dos montes Golã para garantir a segurança de Israel. "Não permitiremos que nenhuma força hostil se estabeleça na nossa fronteira", afirmou.
Também a União Europeia (UE) vê a mudança de poder na Síria como positiva. "O fim da ditadura de Assad é um desenvolvimento positivo e há muito esperado. Também mostra a fraqueza dos apoiantes de Assad, a Rússia e o Irão", disse Kaja Kallas chefe da diplomacia da UE, numa publicação na rede social X.
A responsável europeia estabelece como prioridade a garantia de segurança na região e compromete-se, em nome da UE, a trabalhar com "todos os parceiros construtivos" na Síria e, de forma mais ampla, na região, antevendo que o processo de reconstrução da Síria seja "longo e difícil". "Todas as partes devem estar preparadas para se envolverem de forma construtiva", acrescentou.
Também o enviado das Nações Unidas para a Síria, Geir Pedersen, apelou a "esperanças cautelosas" após a tomada de Damasco por rebeldes islâmicos, que considerou tratar-se de um "momento decisivo" que pôs fim a meio século de poder do clã Assad. Num comunicado, Pedersen indicou que os quase 14 anos de guerra civil na Síria foram "um capítulo negro (que) deixou cicatrizes".
Nos EUA, antes mesmo da tomada de Damasco, Trump afirmou que o país devia abster-se de um envolvimento direto no que estava a ocorrer na Síria. Este domingo, o Pentágono limitou-se a informar que as tropas americanas vão manter-se no país. A presença militar dos EUA na Síria serve "unicamente para garantir a derrota duradoura do Estado Islâmico e não tem nada a ver com outros aspetos deste conflito", noticiou a Associated Press. Tropas terrestres dos EUA foram enviadas pela primeira vez para a Síria após o início de uma ofensiva aérea contra o Estado Islâmico, em 2014. Atualmente, mantêm-se estacionados no território cerca de 900 militares.
"Golpe muito duro"
O Irão, o maior aliado de Bashar al-Assad, afirmou este domingo que respeita a unidade e a soberania nacional da Síria e que as decisões futuras do país "dependem exclusivamente do povo sírio". A declaração oficial, noticiada pela Sky News, é uma assunção do fim do regime por Teerão, que tudo fez para o sustentar. O Ministério dos Negócios Estrangeiros do Irão afirmou que está a monitorizar de perto a situação na Síria e na região. Adicionalmente, acrescentou que as "relações de longa data e amigáveis" entre o Irão e a Síria são esperadas para continuar.
Mas apesar dos apelos dos rebeldes para que não se destruam nem se ataquem instituições do Estado e edifícios diplomáticos, a televisão estatal iraniana adiantou este domingo que a sua embaixada em Damasco foi saqueada, transmitindo imagens filmadas na capital síria pelo canal saudita al-Arabiya.
Na Rússia também não há reações de alegria à queda de al-Assad. "Os acontecimentos na Síria são um golpe muito duro para todos, sem exceção", escreveu na rede social Telegram o vice-presidente do Senado russo, Konstantin Kosachev,. "De uma forma ou de outra, a guerra civil não terminará hoje, há muitos interesses conflitantes e forças opostas. Incluindo grupos abertamente terroristas. E é por isso que o mais difícil ainda está por vir", alertou. "Mas se o povo da Síria continuar a precisar do nosso apoio, continuará a tê-lo. Caberá aos sírios enfrentá-lo eles próprios", disse.
Por seu lado, o presidente do Comité de Relações Exteriores da Duma, Leonid Slutski, sublinhou que a Rússia continua a defender "a integridade territorial da Síria, o diálogo inclusivo e os mecanismos democráticos para a transferência de poder através de meios pacíficos", mas fala do "derrube do Governo com recurso a forças extremistas" como um "período complexo e trágico",
Slutski salientou que, até agora, "a variante mais sangrenta do desenvolvimento dos acontecimentos foi evitada" graças ao facto de o primeiro-ministro sírio, Mohamed Ghazi al-Jalali, ter prometido aos rebeldes uma transição pacífica. "Mas ninguém pode garantir que os confrontos terminarão assim", alertou.
Na véspera, o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, garantiu que a Rússia continuaria a apoiar militarmente a Síria e negou uma alegada retirada da base naval russa em Tartus, salientando que as forças ali estacionadas estão atualmente a realizar manobras na região oriental do Mar Mediterrâneo.
"A situação na Síria é complexa, mas a Rússia defende os seus interesses de forma consistente, e em particular no que diz respeito às suas bases militares", confirmou este domingo o presidente do Comité de Defesa da Duma (Câmara dos Deputados), Andrei Kartapolov, à agência russa Interfax.
Da China, a mensagem que chega é de precaução, sem escolha clara de lados. O Ministério dos Negócios Estrangeiros espera que a Síria "regresse à estabilidade o mais rapidamente possível" e assegura que Pequim "acompanha de perto" a situação. "O governo ajudou ativamente os cidadãos chineses dispostos a deixar a Síria de forma segura e ordenada e mantém contacto com os que permaneceram na Síria", disse o ministério, que os aconselhou a deixarem o país "o mais rápido possível".
Pequim disse ter pedido "às partes sírias relevantes" que tomem medidas para garantir a segurança das instituições e do pessoal chinês na Síria e acrescentou que, "atualmente, a Embaixada da China na Síria está segura".
Embora a Rússia e o Irão tenham sido os apoiantes mais próximos da Síria nos últimos anos, os laços de Damasco com a China fortaleceram-se. A China é um dos poucos países fora do Médio Oriente que al-Assad visitou desde o início da guerra civil na Síria, em 2011. Durante esta viagem, em 2023, o presidente chinês, Xi Jinping, e al-Assad anunciaram uma "parceria estratégica" entre os seus dois países.