Mais de 400 dias depois do início da guerra, Xi Jinping e Volodymyr Zelensky conversaram por telefone, e a chamada foi – pelos critérios do Presidente ucraniano – “longa e significativa”. O líder chinês nem por uma vez falou em “guerra” para descrever a “crise” ucraniana e defendeu a reiterada posição de que “a China não atira lenha para a fogueira”, incitando às negociações como forma de dissolver o conflito. A escolha de palavras pode ser uma subtileza a ser captada pelos russos.
Roland Freudenstein, vice-presidente do think tank GLOBSEC Brussels e antigo conselheiro de segurança da Comissão Europeia, garante ser muito “reveladora” a descrição da guerra como “operação militar”: é uma tentativa de fazer a “quadratura do círculo”, o que é “ridículo e mostra claramente que o Partido Comunista Chinês não está a agir de boa fé”. Mas Kiev saiu a ganhar mais do que uma mão cheia de nada e Pequim também conseguirá lucrar, dizem os analistas de relações internacionais.
Zelensky e Xi conversaram por pouco menos de uma hora, pelo que se pode mesmo dizer que foi uma conversa “longa”. É a palavra “significativa” que exige maior capacidade de análise a Kelly Grieco, investigadora na área de Defesa e Segurança do Reimagining US Grand Strategy Program no think tank Stimson Center. Se, por um lado, se tratou do primeiro diálogo dos dois líderes em 14 meses, por outro, a promessa de Xi Jinping, de que enviará um representante especial à Ucrânia e a outros países para tentar mediar a paz, “é um passo concreto”. Um desenvolvimento “significativo”, anui.
Roland Freudenstein, vice-presidente do think tank GLOBSEC Brussels e antigo conselheiro de segurança da Comissão Europeia, acredita, no entanto, que Zelensky quis, acima de tudo, “ser educado”, porque “a última coisa que a Ucrânia quer agora é antagonizar a China”. Ao contrário do Ocidente, Pequim procurou manter uma aparência de neutralidade em relação à invasão russa. Nunca escondeu, contudo, os laços estreitos com Moscovo nem com Vladimir Putin, a quem Xi Jinping se refere como um “querido amigo”.
Nunca chegou a condenar a invasão, propôs um plano vago para a paz resumido em 12 pontos, nunca se comprometeu com o fornecimento de armas à Rússia. Mas, na hora das visitas, Xi viajou por dois dias à Rússia, e nunca à Ucrânia. Durante meses, Xi resistiu à pressão do Ocidente e aos vários apelos de Zelensky para que os dois líderes tivessem uma conversa direta. O que terá mudado? De acordo com Kelly Grieco, a peça-chave no tabuleiro geopolítico pode mesmo ter sido a França. “Esta chamada apresenta uma justificação para a diplomacia francesa e para a visita de Macron à China. Macron instou Xi a ligar para Zelensky e ajudar a acabar com a guerra.”
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