Guerra na Ucrânia

Guerra causa corrida ao armamento na Europa e torna Ucrânia na terceira maior importadora: quatro gráficos do comércio de armas em 2022

Caças japoneses e norte-americanos durante exercício militar conjunto em reação ao lançamento de um míssil balístico pela Coreia no Norte, a 19 de fevereiro de 2023
Caças japoneses e norte-americanos durante exercício militar conjunto em reação ao lançamento de um míssil balístico pela Coreia no Norte, a 19 de fevereiro de 2023
JAPAN'S DEFENSE MINISTRY JOINT STAFF HANDOUT

Embora as transferências de armas tenham caído globalmente, as importações dispararam na Europa. E não só: “a competição estratégica também continua noutros lugares”

A tensão com a Rússia e o conflito com a Europa fizeram aumentar a corrida ao armamento na Europa, em contraciclo com a tendência mundial. A conclusão é do novo relatório do Instituto Internacional de Investigação para a Paz de Estocolmo (SIPRI), divulgado esta segunda-feira.

Segundo este instituto, entre 2018 e 2022, os maiores importadores mundiais de armamento eram a Índia, Arábia Saudita, Catar, Austrália e China. Em 2022, para fazer frente à invasão russa, a Ucrânia tornou-se na terceira maior importadora mundial (apenas superada por Qatar e Índia).

Enquanto no resto do mundo as importações de armamento caíram 5,1% nos últimos cinco anos em comparação com o período 2013-2017, na Europa dispararam 47%. O incremento foi ainda maior nos Estados Europeus da NATO (65%).

A região onde as importações mais recuaram foi África (-40%). Seguem-se Américas (-21%), Médio Oriente (-8,8%) e Ásia e Oceania (-7,5%). Simultaneamente, “as importações para o Leste Asiático e alguns estados noutras áreas de alta tensão geopolítica aumentaram acentuadamente”, explicita o relatório.

“Mesmo que as transferências de armas tenham diminuído globalmente, as para a Europa aumentaram acentuadamente devido às tensões entre a Rússia e a maioria dos outros estados europeus”, afirma Pieter D. Wezeman, investigador sénior do Programa de Transferências de Armas do SIPRI.

“Após a invasão da Ucrânia pela Rússia, os estados europeus querem importar mais armas, mais rápido. A competição estratégica também continua noutros lugares: as importações de armas para o Leste Asiático aumentaram e as para o Oriente Médio permanecem em alto nível.”

Ucrânia tornou-se no terceiro maior importador de armas

Segundo o relatório, “de 1991 até o final de 2021, a Ucrânia importou poucas armas importantes”. Isto mudou significativamente com a invasão russa.

“Como resultado da ajuda militar dos EUA e de muitos estados europeus”, a Ucrânia tornou-se na terceira maior importadora de armamento em 2022. O aumento foi tal que, sozinha, totaliza 2% das importações mundiais nos últimos cinco anos.

Pieter D Wezeman sublinha ainda que muitos dos sistemas que o Ocidente tem hesitado a enviar para a Ucrânia, por temer uma escalada na guerra, estão a ser fornecidos a outros países que também estão envolvidos em conflitos, nomeadamente no Médio Oriente e no Sul da Ásia.

Rússia perde força como exportador

“Há muito que as exportações de armas são dominadas pelos EUA e Rússia (consistentemente os primeiro e segundo maiores exportadores nas últimas três décadas). Contudo, o declive entre os dois tem vindo a aumentar significativamente, enquanto entre a Rússia e o terceiro maior fornecedor, a França, tem vido a encolher”, refere o relatório do SIPRI.

Nos últimos cinco anos, as exportações de armamento pelos EUA aumentaram 14%, representando atualmente 40% das transferências mundiais. Já a França cresceu de 7,1% para 11%.

Enquanto isso, com o armamento e equipamentos a serem encaminhados para a Ucrânia, a Rússia viu uma quebra nas exportações (de 22% para 16%).

Os envios caíram para oito dos seus dez principais clientes. Só na Índia, o maior importador de armamento russo, a quebra foi de 37%. Este país passou a receber 30% do armamento francês.

Em contraciclo, contudo, as exportações para a China e Egipto aumentaram significativamente (39% e 44% respetivamente).

“É provável que a invasão da Ucrânia limite ainda mais as exportações de armas da Rússia. Isto ocorre porque a Rússia priorizará o fornecimento das suas forças armadas e a procura de outros estados permanecerá baixa devido às sanções comerciais contra a Rússia e à crescente pressão dos EUA e seus aliados para que não se comprem armas russas”, disse Siemon T. Wezeman, investigador sénior do Programa SIPRI de Transferência de Armas.

Ásia e Oceania permanecem como região que mais importa

A Ásia e Oceania receberam entre 2018 e 2022 cerca de 41% das transferências internacionais de armamento, mantendo-se como a região que mais importa armas.

Apesar da ligeira redução média face aos cinco anos anteriores, assinalam-se alguns aumentos significativas das importações de certos países. É o caso da China (+4,1%), Coreia do Sul (+61%), Japão (+171%) e Austrália (23%).

“A crescente percepção de ameaças da China e da Coreia do Norte tem impulsionado a crescente procura por importações de armas pelo Japão, Coreia do Sul e Austrália, incluindo armas de ataque de longo alcance”, explica Siemon T. Wezeman. 'O principal fornecedor para todos os três são os EUA.'

Médio Oriente recebe armamento de ponta americano e europeu

Três dos dez maiores importadores entre 2018-2022 estão localizados no Médio Oriente. São a Arábia Saudita (que, enquanto segundo maior importador mundial, apenas superada pela Índia, recebeu 9,6% das trocas mundiais), Catar (que aumentou em 311% as aquisições comparativamente aos cinco anos anteriores, tornando-se no terceiro maior importador) e Egito (4,5%).

Os maiores exportadores para esta região são os EUA (54%), França (12%), Rússia (8,6%) e Itália (8,4%). As aquisições incluíram “mais de 260 aeronaves de combate avançadas, 516 novos tanques e 13 fragatas. Só os estados árabes na região do Golfo fizeram pedidos para mais de 180 aeronaves de combate, enquanto 24 foram encomendados da Rússia pelo Irão (que praticamente não recebeu armas importantes durante 2018-2022).”

E Portugal?

As bases de dados do SIPRI incluem também informações atualizadas sobre Portugal. Em termos de rankings, Portugal está em 48.º na lista de exportadores e em 142.º na de importadores. Nas duas caiu no ranking face a 2021 (42 e 12 lugares respetivamente).

Quanto às exportações, a Ucrânia foi no ano passado o único destino do armamento português. Foram enviados cinco Ka-32 (helicóptero civil de combate a incêndios), 28 M-113 (veículos blindados de transporte de pessoal de origem americana) e quatro. VM-90P (veículo híbrido, tático e de todo o terreno de fabrico italiano).

Todos estes equipamentos foram enviados “em segunda mão” e fizeram parte do “apoio após a invasão russa da Ucrânia”

Em contrapartida, Portugal está à espera de receber armamento de três países diferentes. Do Brasil, deverá importar cinco aeronaves de transporte C-390, num contrato celebrado em 2019 no valor de 920 milhões de dólares. Da Finlândia foram encomendados 24 motores de navios em 2002, tendo chegado oito entre 2010 e 2019.

A maior parte dos contratos são com os EUA. Aguardamos três caças F-16C em segunda mão, dez motores de aeronaves e um número não especificado de mísseis ESSM Block-2 para as fragatas Vasco da Gama.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: calmeida@expresso.impresa.pt

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