Guerra na Ucrânia

Salva de mísseis russos sobre a Ucrânia foram para russo ver

Edifício destruído por um míssil russo em Zaporíjia
Edifício destruído por um míssil russo em Zaporíjia
STRINGER

Os ataques de segunda-feira a Kiev, Lviv e outras cidades são para consumo interno russo e sugerem que as reservas de mísseis de Putin não são inesgotáveis

Os ataques com mísseis a diversas cidades ucranianas na madrugada de segunda-feira dia 9 de outubro (84 engenhos contra Kiev, Lviv, Dnipro, etc, causando 14 mortos) são, do ponto de vista político, a resposta do Kremlin à humilhação que representou o atentado à bomba (operação de falsa bandeira dia 8 de outubro) contra a ponte de Kerch, ligando a Crimeia ocupada a território russo. Putin precisava de algo para acalmar os sectores mais radicais, já indispostos pela sucessão de reveses militares na Ucrânia.

Se esta é a leitura dos acontecimentos feita pela imprensa ocidental, já sobre as características dos ataques e do material usado há interpretações divergentes. A jornalista do diário francês “Le Monde” Elise Vincent publicou no Twitter uma referência a um estudo do Instituto Internacional de Investigação da Paz, de Estocolmo, segundo o qual a indústria militar russa estaria a ser menos afetada do que se pensa pelas sanções ocidentais. Conseguiria mesmo estar a fabricar novas armas, como tanques T-90 M e caças furtivos SU-35 S.

Em abono desta tese, o facto revelado pelo mesmo jornal de que a Turquia está a servir simultaneamente como máquina de lavagem de dinheiro russo e como plataforma de fornecimento de componentes para a indústria automóvel, mercadorias diversas, incluindo eventualmente eletrónica.

Contudo, esta tese não é completamente coerente com a análise do material usado pelos russos. As salvas disparadas na madrugada de segunda-feira foram à base de mísseis balísticos de médio alcance Iskander e de mísseis de cruzeiro Kalybr disparados pela frota do Mar Negro como, de resto, se depreende dos protestos moldavos contra a violação do seu espaço aéreo. Já ataques posteriores a segunda-feira sobre Zaporijia envolveram mísseis S-300. Ora estes foram desenhados para intercetar aviões ou outros mísseis. Utilizá-los em tiro horizontal é degradar as suas capacidades e sinal da falta de outro material, não sendo esta a primeira vez que a Rússia recorre aos S-300 para ataques ao solo.

Mísseis antigos e imprecisos

Outro sinal da falta de material tem sido, em ataques anteriores, o recurso a mísseis navais KH-22 (Kitchen, na nomenclatura da NATO), descontinuados ainda no tempo da Guerra Fria. Potentes mas imprecisos (erros de origem de pelo menos 200 metros), são muitas vezes disparados por salvas para aumentar a probabilidade de atingir o alvo, aumentando também o risco de baixas civis.

A defesa antimíssil ucraniana, muito baseada nos sistemas S-300 da época soviética, terá abatido 47 dos 83 engenhos lançados, mas não tem densidade para proteger todas as grandes cidades e alvos civis. Isso só se alterará com o fornecimento (em curso) de sistemas antimísseis alemães Iris (bolha de 20 km de altura por 40 de diâmetro) e Nasdan (de fabrico norueguês e americano), semelhantes aos que protegem a Casa Branca (bolha de 20 km).

Quanto mais densa for a bolha defensiva ucraniana, menos Kiev se sentirá tentado a retaliar sobre cidades ocupadas na Crimeia ou no Donbass, quando não em território russo, com risco agravado de escalada. Material americano foi também pedido para contrariar a ameaça dos drones suicidas de fabrico iraniano usados em ataques levados a cabo mais perto das posições russas.

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