Ucrânia e Rússia anunciaram uma troca de quase 300 prisioneiros: Quem são eles?
ROMAN PILIPEY/EPA/Lusa
A Rússia anunciou a libertação de 215 soldados ucranianos e 10 cidadãos estrangeiros, alguns deles combatentes pelo lado ucraniano. Por sua vez, a Ucrânia libertou 55 pessoas, entre elas militares russos e um ex-deputado ucraniano pró-russo
Quase 300 prisioneiros foram trocados entre a Rússia e a Ucrânia esta quarta-feira, dia 21, num processo que contou com a mediação diplomática da Arábia Saudita e da Turquia. Fica assim marcada mais uma etapa no conflito no leste europeu, sendo esta a maior troca de prisioneiros entre os dois países e tendo em conta que foi anunciada pouco tempo depois de Valdimir Putin, Presidente da Rússia, ter declarado que irá mobilizar 300 mil militares na reserva.
Muitos dos ucranianos entregues a Kiev por Moscovo na grande troca de prisioneiros de guerra foram “brutalmente torturados” durante o cativeiro, denunciou hoje um alto funcionário do Governo da Ucrânia.
“Muitos deles foram brutalmente torturados”, disse Kyrylo Budanov, chefe do departamento de inteligência do Ministério da Defesa ucraniano, numa conferência de imprensa, sem, contudo, avançar pormenores sobre a natureza das supostas torturas.
Budanov adiantou que também “há pessoas cuja condição física é mais ou menos normal”, apesar da “desnutrição crónica devido às más condições prisionais”.
Os prisioneiros foram mantidos em vários estabelecimentos penitenciários em territórios ucranianos ocupados por tropas russas, bem como na Rússia, acrescentou Budanov, que participou na organização da troca de detidos.
Segundo o ministro do Interior da Ucrânia, Denys Monastyrsky, “todos” os ucranianos envolvidos na troca necessitam de “reabilitação psicológica”.
Do lado russo, o destaque vai para a libertação do ex-deputado ucraniano Viktor Medvedchuk, amigo pessoal de Vladimir Putin. A relação entre os dois é próxima, tanto que o próprio Putin é padrinho de uma das filhas de Medvedchuk.
O ucraniano foi ao longo de anos um dos aliados mais ferozes do Presidente russo na Ucrânia, uma tarefa facilitada pela sua ocupação profissional: oligarca na área das telecomunicações e energia.
Através dos seus três canais de televisão, “ZIK”, “NewsOne” e “112”, Medvedchuk distribuía e amplificava a propaganda do Kremlin na Ucrânia, algo que fez até 2 de fevereiro de 2021, quando Zalensky decidiu banir as três estações citando a necessidade de “combater o perigo da agressão russa na área da informação”.
Nessa altura já era membro da Verkhovna Rada, o parlamento ucraniano, tendo sido eleito em 2019 em representação do partido eurocético e pró-russo "Plataforma Oposição - Pela Vida", também ele ilegalizado em junho deste ano. E esta não foi a sua única passagem pela política, já que foi durante três anos chefe de gabinete de Leonid Kutchma, Presidente ucraniano entre 1994 e 2005.
Medvedchuk faz declarações à imprensa junto ao Tribunal de Kiev
SOPA Images
Após ter sido acusado de traição em 2021, devido à sua proximidade com Moscovo, Medvedchuk foi colocado em prisão domiciliária. Escapou pouco tempo depois e o seu paradeiro permaneceu desconhecido até ter sido recapturado pelas autoridades ucranianas em abril deste ano. Na altura, o governo confiscou muitos dos seus bens, incluindo “26 carros, 30 terrenos, 23 casas, 32 apartamentos e um iate a motor”, pode-se ler num comunicado do departamento de investigação estatal.
Em comunicado, Zelensky afirma não estar “triste” por “trocar Medvedchuk por verdadeiros guerreiros”, acrescentando que o recém-libertado “passou por todos os procedimentos de investigação de acordo com a lei e a Ucrânia obteve dele tudo o que era necessário para determinar a verdade”.
Os restantes prisioneiros libertados pela Ucrânia, todos soldados da Rússia ou das repúblicas separatistas do leste ucraniano, já regressaram a território russo, confirma o Ministério de Defesa.
Dez estrangeiros
Entre os dez estrangeiros envolvidos na troca de prisioneiros encontram-se cinco cidadãos do Reino Unido, dois norte-americanos, um croata, um marroquino e um sueco. Chegaram ontem de avião a Riade, a capital da Arábia Saudita, num voo organizado pelo príncipe Mohammed bin Salman, líder da monarquia saudita e um dos mediadores neste processo.
Os dois norte-americanos, Alexander John-Robert Drueke e Andy Tai Ngoc Huynh, ambos veteranos militares, foram inicialmente capturados a 9 de junho nos arredores da cidade de Kharkiv pelas forças da autoproclamada República Popular de Donetsk , no leste de Ucrânia.
Jake Sullivan, conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, agradeceu através do Twitter ao príncipe Mohammed e ao Governo da Arábia Saudita por terem “facilitado” a troca de prisioneiros. Um agradecimento secundado pela ministra dos Negócios Estrangeiros da Suécia, que enviou a Riade um “caloroso obrigado” pelo regresso do cidadão sueco preso em Donetsk.
Já os cinco britânicos, John Harding, Andrew Hill, Dylan Healy, Aiden Aslin e Shaun Pinner. Os últimos dois ficaram conhecidos após terem sido capturados em Mariupol enquanto lutavam ao lado das tropas ucranianas. Juntamente com o marroquino Brahim Saaudun, também libertado na quarta-feira, foram condenados à morte num tribunal em Donetsk, uma sentença muito criticada pela opinião pública ocidental, que a considerou injusta e cénica.
A Presidum Network, um grupo envolvido no resgate de um dos prisioneiros, disse ao jornal britânico “The Guardian” que todos já conseguiram entrar em contacto com as suas famílias.
Texto de José Gonçalves Neves, editado por João Cândido da Silva
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