Com uma voz afável, “João” enumera as várias qualidades do terreno amazónico que colocou à venda no Facebook. “São áreas enormes, fazendas de grande porte”, garante o vendedor numa mensagem de voz do WhatsApp a um cliente interessado, que era na realidade jornalista da Forbidden Stories. Apesar de permanecer evasivo em relação à sua identidade, “João” não poupa palavras quando fala do terreno. A área “não está desmatada, é mata”, mas isso não é um problema para o vendedor, que se oferece para “fazer a derrubada por (seu) risco”.
A terra cobre até oito mil hectares (mais de 11 mil campos de futebol) e o preço de venda é de 1200 reais por hectare (cerca de 220 euros), explica ele. A venda dessas terras, pertencentes ao estado do Pará é em princípio ilegal, porém é feita à vista de todos, na maior rede social do mundo. E tal como “João”, várias dezenas de pessoas põem a Amazónia à venda no Facebook, todos os dias.
Um fenómeno já detetado em 2019 por Dom Phillips, o jornalista britânico que deu a sua vida a investigar o saque da Amazónia. Na época, um anúncio de venda de terras protegidas no Facebook chamou-lhe a atenção. A autora da publicação? Uma tal Nair Rodrigues Petry, conhecida como “Nair Brizola”.
Dando seguimento ao trabalho de Dom Philipps, esta investigação do Projeto Bruno e Dom revela a existência de um esquema organizado de grilagem de terras, do qual Nair Brizola beneficiou diretamente, e que aparenta ser encabeçado por um latifundiário já implicado numa série de fogos postos que dizimaram parte da Amazónia em 2019.
A investigação também revela que o Facebook continua a ser usado para vender terras no coração da floresta amazónica, incluindo terras públicas protegidas. Uma prática já denunciada porinvestigações prévias, mas que continua a ser uma realidade hoje, apesar das promessas feitas pela plataforma em 2021.
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