Ásia

Tribunal Constitucional tailandês dissolve o partido da oposição que venceu as eleições mais recentes

Apoiantes do partido tailandês Avançar ao ouvirem a decisão do Tribunal Constitucional
Apoiantes do partido tailandês Avançar ao ouvirem a decisão do Tribunal Constitucional
CHANAKARN LAOSARAKHAM

O Tribunal tailandês também impediu 11 executivos do partido de exercerem cargos políticos durante dez anos. Esta será a terceira vez em que o partido da oposição é obrigado a reformular-se. Em 2020, quando o partido antecessor foi dissolvido, a população saiu às ruas para se manifestar

Tribunal Constitucional tailandês dissolve o partido da oposição que venceu as eleições mais recentes

Eunice Parreira

Jornalista

O Tribunal Constitucional tailandês dissolveu o partido da oposição por votação unanime, ao considerar que o Avançar (Move Forward) tinha violado a Constituição. O líder do partido, Pita Limjaroenrat, e outros dez membros do executivo ficaram impedidos de exercer atividades políticas durante dez anos, segundo vários meios de comunicação social, entre os quais a agência noticiosa Reuters.

Em causa está a promessa eleitoral de alterar as controversas leis tailandesas que proíbem as críticas à família real. Caso um cidadão critique a monarquia pode ser sentenciado até 15 anos de prisão, sob uma única acusação. No final de janeiro, o Tribunal Constitucional tailandês tinha decretado que as reformas destas leis eram ilegais e que o partido deveria cessar os esforços. “Qualquer ação que seja destrutiva para a instituição é considerada uma tentativa de a derrubar", lê-se no acórdão do tribunal, citado pelo jornal ‘The Guardian’.

Os dirigentes do Avançar alertaram que esta decisão abria um perigoso precedente para a interpretação da Constituição e garantiram que não tinham qualquer intenção de trair ou separar a monarquia do país.

O veredicto desta quarta-feira era esperado por o tribunal ser considerado um bastião dos interesses conservadores da monarquia. Os juízes acusaram o partido pró-democracia de usar a monarquia para obter uma vantagem eleitoral, ao colocar o povo e a família real em oposição. “A ação dos acusados é, portanto, uma ação que pode antagonizar o sistema democrático com o rei como chefe de Estado”, declaram, citados pela Reuters. Na Tailândia, o monarca está consagrado na Constituição tailandesa como estando numa posição de “culto reverenciado”.

A dissolução surge num momento crítico da política tailandesa. Na próxima semana, o Tribunal Constitucional irá decidir se vai demitir o primeiro-ministro, Srettha Thavisin, antigo advogado com registo criminal, após o governo do partido Pheu Thai o ter nomeado. O primeiro-ministro descarta qualquer irregularidade.

O partido Avançar venceu as últimas eleições, em 2023, conquistando a maioria dos lugares. Contudo, ficou impedido de constituir governo, após o Senado, na altura constituído pelos militares, se ter recusado a apoiar o candidato a primeiro-ministro.

Horas depois da decisão do Tribunal Constitucional esta quarta-feira, os responsáveis pelo Avançar anunciaram que o partido “passa a ser um novo partido - todos os nossos 143 deputados vêm connosco”. Esta será a terceira reformulação do partido. Em 2020, o partido antecessor Future Forward foi dissolvido, sob acusação de violação do financiamento da campanha. Desde 1997, o tribunal dissolveu mais de 100 partidos, mas muitos desses partidos regressaram com um nome diferente.

"Compreendo que possam sentir-se desapontados, zangados, ressentidos, ou que possam estar em lágrimas. Não vos censuro. Hoje, por um dia, vamos ficar tristes e zangados tanto quanto necessário", disse Pita Limjaroenrat aos apoiantes ao exortá-los a usar os sentimentos negativos e transformá-los em energia que irá “explodir em todas as cabines de voto” e não na rua.

Pita Limjaroenrat, líder do partido Avançar
SOPA Images

Quando o partido foi dissolvido, há quatro anos, os apoiantes manifestaram-se contra a decisão, o que conduziu a vários meses de agitação civil. "Acabámos de passar por isto há quatro anos”, disse o líder do partido, em entrevista à Reuters antes de ouvir a decisão judicial. "Quero provar ao sistema, e também ao mundo, que dissolver partidos é inútil”, afirmou.

Sirikanya Tansakun, apontada como a próxima dirigente do partido, afirmou que a “metodologia” sobre como iriam abordar a reforma das leis da monarquia “terá de ser discutida em mais pormenor” quando constituírem a “nova casa”. “Manteremos a nossa ideologia principal”, garantiu ainda a deputada.

Estados Unidos e União Europeia expressam preocupação com a decisão do Tribunal Constitucional tailandês

“Esta decisão priva de direitos os mais de 14 milhões de tailandeses que votaram no Partido Avançar nas eleições de maio de 2023 e levanta questões sobre a sua representação no sistema eleitoral da Tailândia”, disse o porta-voz do departamento de Estado dos Estados Unidos, Matthew Miller, em comunicado.

Os Estados Unidos, “na qualidade de aliado próximo e amigo com laços profundos e duradouros”, instaram a Tailândia a tomar medidas para “garantir uma participação política totalmente inclusiva”, assim como proteger a liberdade de expressão. Consideram ainda que esta decisão “coloca em risco o progresso democrático da Tailândia”, o que prejudica “as aspirações do povo tailandês a um futuro forte e democrático”.

Também a União Europeia considera que a decisão do tribunal tailandês é “um revés para o pluralismo político”. “Qualquer limitação ao exercício da liberdade de associação e de expressão, nomeadamente através das atividades e da formação de partidos políticos, deve ser consistente com as disposições e os princípios pertinentes dos instrumentos internacionais, incluindo o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos”, declarou o Serviço de Ação Externa da UE, tutelado pelo alto representante Josep Borrell, em comunicado.

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