Ásia

Quem é Lee Jae-myung, líder da oposição sul-coreana, que foi esfaqueado?

Lee Jae-myung, líder do Partido Democrático da Coreia do Sul
Lee Jae-myung, líder do Partido Democrático da Coreia do Sul
YONHAP

Lee Jae-myung já trabalhou numa fábrica, foi advogado de direitos humanos, presidente de Câmara e governador. O líder da oposição sul-coreana perdeu as eleições presidenciais por menos de 1%, em 2022, mas, caso recupere do ferimento, espera-se que seja candidato às eleições de 2027

O líder da oposição na Coreia do Sul, Lee Jae-myung, foi,esta terça-feira esfaqueado durante uma visita à cidade de Busan, localizada no sudeste da península coreana. Lee Jae-myung foi golpeado na veia jugular, mas o ferimento não representa risco de vida para o líder do Partido Democrático (PD). O porta-voz do partido, Kwon Chil-seung, citado pela agência Reuters, diz que após o político ter sido submetido a uma cirurgia, estava consciente e a recuperar nos cuidados intensivos.

Com uma taxa de criminalidade baixa, a Coreia do Sul soma ainda assim vários casos de políticos agredidos fisicamente. Em março de 2022, Song Young-gil, antecessor de Lee Jae-myung foi atacado durante uma campanha. Em 2006, Park Geun-hye, líder do partido conservador, e mais tarde Presidente do país, foi também esfaqueado, tendo ficado com uma cicatriz no rosto. Já em 2015, Mark Lippert, embaixador norte-americano na Coreia do Sul, foi atacado com uma faca e acabou por precisar de ser suturado com 80 pontos na cara.

Com 59 anos, espera-se que o líder do PD participe novamente nas próximas eleições presidenciais, em 2027, com as sondagens a apontarem-no como um forte candidato, de acordo com o jornal The Guardian. Em 2022, o liberal perdeu por apenas 0,73% as eleições presidenciais para o conservador Yoon Suk-yeol, do Partido do Poder Popular. A margem mínima tornou esta corrida presidencial a mais renhida na Coreia do Sul.

Acusações de corrupção

Há quase 20 anos na vida política, Lee Jae-myung é conhecido pelas ferozes críticas às políticas governamentais do atual Presidente, tendo já feito uma greve de fome durante mais de três semanas, como forma de protesto.

Desde que perdeu as eleições, Lee Jae-myung foi acusado de corrupção, por causa de um processo durante o seu mandato enquanto Presidente da câmara da cidade de Seongnam, perto de Seul. Segundo o jornal The New York Times, o líder do PD terá alegadamente permitido que promotores privados lucrassem ilegalmente, entre 2014 e 2017, com um projeto imobiliário, o que terá resultado na perda de 20 mil milhões de won (quase 14 milhões de euros).

Mais tarde, entre 2019 e 2020, quando era governador da província de Gyeonggi, que faz fronteira com a Coreia do Norte, terá pedido a uma empresa sul-coreana de vestuário, Ssangbangwool, para transferir cerca de sete milhões de euros para o país vizinho. Este alegado suborno serviria para aliciar os vizinhos no Norte a integrar um programa de intercâmbio económico com Gyeonggi.

Lee Jae-myung negou as acusações, que disse serem uma “ficção” e “conspiração política”, lembra a Al Jazeera. O político continua a ser investigado em outros possíveis casos de corrupção durante o mesmo mandato.

Em setembro, o tribunal rejeitou o pedido da acusação para manter o político em prisão preventiva, enquanto aguarda julgamento, por falta de indícios de que Lee Jae-myung poderia destruir provas dos crimes, relatou a Reuters. Por lei, os tribunais estão impedidos de realizar audiências sobre mandados de captura de deputados, a menos que a haja uma votação da Assembleia nesse sentido. Até aquele mês, o líder do PD tinha conseguido evitar um possível mandado de captura pois o seu partido detém a maioria na Assembleia, contudo alguns dos deputados do Partido Democrático votaram a favor de um levantamento da imunidade de Lee Jae-myung, o que criou divisões dentro do partido.

Em abril deste ano, com novas eleições legislativas, a situação legal de Lee Jae-myung poderá piorar, caso o seu partido perca a maioria, abrindo hipótese a novas audiências.

Oposição através da greve de fome

No final de agosto, Lee Jae-myung iniciou uma greve de fome, que durou 24 dias, contra as políticas governamentais do Presidente. De acordo com a agência noticiosa Reuters, uma das razões que motivou esta greve foi a posição passiva da Coreia do Sul relativamente à decisão do Japão em deitar no Oceano Pacífico água radioativa tratada da central nuclear de Fukushima.

O líder da oposição criticou esta posição ao acusar o Governo de ser “cúmplice” do Japão, enquanto o Presidente Yoon Suk Yeol afirmou que os críticos da oposição sul-coreana eram “pessoas que afirmam que um mais um é igual a cem”.

A greve de fome também serviu para protestar contra a má gestão económica, ameaças à liberdade de imprensa, e a falta de responsabilização após o esmagamento de centenas de pessoas em Itaewon, durante os festejos de Halloween de 2022. Acusou ainda o Presidente de estar a usar o sistema criminal para intimidar os seus oponentes políticos, conforme noticiou o The New York Times.

De trabalhador fabril a líder do Partido Democrático

Lee Jae-myung nasceu na cidade de Andong, no norte do país, no seio de uma família de classe baixa. Após completar o ensino primário, teve de “trabalhar numa fábrica porque não conseguia pagar a escola”, contou à Agence France-Presse, antes das eleições presidenciais de 2022. Foi durante a sua permanência na fábrica, que lesionou o braço ao ponto de ser dispensado do serviço militar obrigatório.

Apesar das dificuldades, conseguiu fazer os exames que lhe concediam equivalência ao ensino médio e ao ensino secundário, mais tarde formou-se em direito e especializou-se em direitos humanos. “Os meus pais eram empregados de limpeza. Eu escapei à pobreza, mas muitos à minha volta ainda estão presos... Quero mudar o sistema”, afirmou na mesma entrevista. Os temas de que mais fala Lee Jae-myung são, precisamente, a desigualdade, desemprego jovem e os custos elevados da habitação.

Foi em 2005 que entrou para a vida política. Entre 2010 e 2018, foi o Presidente da Câmara de Seongnam, onde ganhou notoriedade após implementar um sistema de bem-estar social na cidade, tornar gratuitos os uniformes escolares e cuidados neonatais, instaurar um rendimento básico universal para os jovens, proibir o consumo de carne de cão e fechar instalações de abate. Em 2018, tornou-se governador de Gyeongg, que integra a zona sul de Seul.

Na liderança do PD, desde 2022, após ter conquistado um assento na Assembleia Nacional, Lee Jae-myung é considerado pelos críticos, segundo a imprensa internacional como a Associated Press, como um populista perigoso, que pretende alcançar a polarização política e que irá enterrar o país em dívidas com as suas políticas. Já os seus apoiantes defendem-no como alguém capaz de erradicar a corrupção, realizar uma reforma política e mitigar a desigualdade económica.

Texto de Eunice Parreira editado por Mafalda Ganhão

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