Internacional

Cimeira do Conselho da Europa termina com “decisões concretas” para a Ucrânia e a reafirmação dos princípios democráticos

Primeiro-ministro ucraniano assina Registo de Danos na cerimónia de lançamento do mecanismo
Primeiro-ministro ucraniano assina Registo de Danos na cerimónia de lançamento do mecanismo
Sandro Weltin

Declaração final prevê a criação do registo de danos sofridos na Ucrânia, apoia a criação de um tribunal especial e adota um conjunto de princípios democráticos

A primeira-ministra da Islândia defendeu esta quarta-feira que a cimeira do Conselho da Europa (CoE) conseguiu alcançar “decisões concretas” que terão “impacto direto” na atividade da instituição internacional e na vida dos mais de 700 milhões de cidadãos que representa.

Na conferência de imprensa que assinalou o final da cimeira, Katrín Jakobsdóttir afirmou que o encontro de chefes de Estado e Governo tinha como objetivos fortalecer o apoio à Ucrânia e a reafirmação do compromisso com valores basilares do Conselho da Europa (instituição que se assume “guardiã” dos Direitos Humanos, Democracia e Estado de Direiro”).

“Vivemos num momento em que os valores democráticos estão a ser ameaçados”, considerou.

Conselho avança com registo de danos causados pela invasão russa

A principal decisão da cimeira prendeu-se com a criação de um Registo de Danos sofridos na Ucrânia. Esta será a “primeira componente de um futuro mecanismo de compensação”. Para isso vai reunir dados sobre os danos, perdas e ferimentos causados pela invasão.

Em Reiquiavique, “os chefes de Estado e de Governo comprometeram-se em participar nas iniciativas internacionais que visem desenvolver esse mecanismo, que pode incluir uma comissão de reivindicações e um fundo de compensação, enfatizando a obrigação da Federação Russa de pagar pelos danos causados ​​por sua guerra de agressão”, explica o comunicado enviado ao Expresso.

A medida foi apoiada por 46 estados, incluindo tanto membros do CoE como estados terceiros (Canadá, Japão, EUA) e a União Europeia.

Na conferência de imprensa, Katrín Jakobsdóttir considerou que era “previsível” que nem todos os países iam aderir. Ainda assim, salienta que a adesão foi superior ao esperado quando o processo foi iniciado e que há países que ainda têm de ter processo interno antes de aderirem.

A falar na mesma conferência, o primeiro-ministro da Ucrânia defendeu que todos os envolvidos na invasão devem ser responsabilizados, desde os oficiais de topo aos soldados que participam na invasão.

Pensando no futuro, Denys Shmygal defendeu que são necessárias garantias para que a agressão não volte repetir-se e que essas são a base do que é defendido na fórmula ucraniana para a paz. Assim, a ambição é a de criar um precedente internacional “para que possíveis agressores saibam que vão ser responsabilizados”.

Também a secretária-geral do CoE sublinhou precisamente este compromisso com a responsabilização. “Não é possível pôr por palavras o choque com o horror vivido na Ucrânia”, afirmou Marija Pejčinović Burić.

“Não pode haver paz sem responsabilização. Todos desejamos a paz, mas quando a guerra acontece, então todos temos de trabalhar para uma paz e a responsabilização é um passo fulcral para chegar lá”.

Conselho apela a libertação de civis e crianças, assim como a retirada da Ucrânia, Geórgia e Moldávia

O CoE irá também apoiar a reconstrução da Ucrânia, “inclusive através do financiamento e implementação do Plano de Ação do Conselho da Europa para a Ucrânia ‘Resiliência, Recuperação e Reconstrução’, e compromete-se a usar todos os meios disponíveis no Conselho, inclusive por meio do Banco de Desenvolvimento do Conselho da Europa”.

A declaração final da cimeira posiciona-se favoravelmente também quanto à criação de um tribunal especial para julgar os crimes de agressão cometidos no decorrer da invasão russa (que caem fora da jurisdição do Tribunal Penal Internacional). “O Conselho da Europa deve participar, conforme o caso, nas consultas e negociações relevantes e fornecer apoio especializado e técnico concreto ao processo”, afirma o documento.

“Apelamos, coletivamente, à Federação Russa para que cumpra com suas obrigações internacionais e retire imediatamente, completa e incondicionalmente, suas forças da Ucrânia, Geórgia e República da Moldávia. Reafirmamos nosso apoio inabalável à sua soberania, independência e integridade territorial, dentro de suas fronteiras reconhecidas internacionalmente”, exorta a declaração.

Os membros do CoE apelam à “libertação imediata de todos os civis que foram transferidos à força ou deportados ilegalmente para o território da Federação Russa ou para as áreas temporariamente controladas ou ocupadas”, sobretudo dos menores.

Especificamente sobre a situação das crianças na Ucrânia, o CoE adotou também uma declaração na qual apela ao apoio às autoridades ucranianas para “garantir o retorno imediato” de todos os que foram ilegalmente transferidos ou deportados pelas forças russas. A declaração defende também o apoio aos Estados que estão a acolher temporariamente as crianças ucranianas.

“Estamos totalmente empenhados em lutar contra a impunidade dos autores de crimes cometidos contra crianças, incluindo a deportação de crianças, continuando o nosso apoio às jurisdições nacionais e internacionais que investigam estes crimes.”

Conselho aprova “Princípios da Democracia de Reiquiavique”

Manifestando preocupação com a tendência em vários países de retrocesso democrático, o CoE avançou também com a adoção de um conjunto de princípios democráticos.

Assim, os estados-membros reiteraram o seu compromisso com princípios como a participação democrática, independência dos parlamentos e instituições democráticas, separação de poderes, imparcialidade dos órgãos judiciais, luta contra a corrupção e liberdade de expressão.

Em Reiquiavique, os países reafirmaram também o seu compromisso com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, documento que é a pedra basilar do Conselho da Europa. Apontado a Convenção como um “mecanismo de promoção da paz e estabilidade na Europa”, os estados reafirmam “a sua obrigação incondicional de acatar as sentenças definitivas pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem”.

“Não há forma a la carte de implementar decisões do tribunal”, defendeu a secretária-geral do CoE. Marija Pejčinović Burić garante que existe vontade política necessária para assegurar tanto o funcionamento do sistema da convenção e cumprimento das decisões do tribunal.

Conselho reconhece direito a ambiente sustentável como direito humano

Das decisões da cimeira, destaca-se também o reconhecimento político do direito a um ambiente limpo, saudável e sustentável como um direito humano.

O Conselho da Europa reconheceu também como prioridades “a adesão da União Europeia ao Conselho da Europa, o estabelecimento de novos standards para salvaguardar os Direitos Humanos na era digital (sobretudo relativamente à inteligência artificial), a promoção dos direitos sociais na Europa através da Carta Social, cooperação contínua com as forças de oposição democrática da Bielorrússia, bem como com os defensores dos direitos humanos da Bielorrússia e da Rússia, os meios de comunicação

Na conferência de imprensa final, o primeiro-ministro da Letónia (que assume a partir desta quarta-feira a presidência rotativa do CoE) garantiu que uma das prioridades da presidência letã será a aplicação das decisões da cimeira.

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