Internacional

“Pior piada de sempre do dia das mentiras”. Rússia torna-se este sábado presidente do Conselho de Segurança da ONU

Vassily Nebenzia, embaixador da Rússia nas Nações Unidas
Vassily Nebenzia, embaixador da Rússia nas Nações Unidas
Mohammed Elshamy / Anadolu Agency / Getty Images

A partir deste sábado e durante um mês, a Rússia preside ao Conselho de Segurança da ONU, um cargo cerimonial e rotativo entre os 15 membros do organismo. A Ucrânia e os Estados Unidos são da opinião que a Rússia nem sequer devia ter assento nos cinco lugares do Conselho Permanente mas não há qualquer via legal prevista nas normas da ONU que permita expulsar um membro

Apesar de todas as críticas, da Ucrânia e não só, a Rússia vai passar um mês à frente do Conselho de Segurança da ONU. Assim mandam as regras e não há nada que se possa fazer para as alterar - sem o consenso entre todos os membros permanentes do Conselho de Segurança (Estados Unidos, China, Reino Unido, França e Rússia), algo impossível há muitos anos anos e muito mais difícil agora que o mundo se voltou a bipolarizar.

É um cargo cerimonial, que não confere nenhum poder especial ao país que o ocupa, ainda assim a embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Linda Thomas-Greenfield, disse, em entrevista à agência de notícias France Presse na sexta-feira que a Rússia “nem deveria ser membro do Conselho de Segurança”, justificando a opinião com o que está a acontecer na Ucrânia. “O problema é que a Carta da ONU não permite uma mudança nos seus membros permanentes”, acrescentou.

Cada um dos 15 membros do Conselho de Segurança assume a posição, de forma rotativa, a cada mês. A última vez que Rússia assumiu a presidência rotativa, em fevereiro de 2022, decidiu marcar o mandato com a invasão de um país vizinho. A partir deste sábado, o Conselho de Segurança das Nações Unidas é liderado por um país com um Presidente que tem sobre si um mandado de captura do Tribunal Penal Internacional (TPI) por suspeita de crimes de guerra ligados à alegada deportação ilegal de ucranianos, principalmente de crianças, para territórios ocupados.

Também na sexta-feira, o embaixador russo nas Nações Unidas negou, numa entrevista à agência de notícias russa TASS, que a Rússia tenha deliberadamente retirado crianças da Ucrânia ou permitido que fossem adotadas na Rússia. Vassily Nebenzia garantiu que todas as crianças que estão a ser levadas da Ucrânia viajam, na maioria dos casos, com as suas próprias famílias. “Estamos a falar de uma retirada em total conformidade com as obrigações do direito humanitário internacional, bem como da Convenção sobre os Direitos da Criança. Milhões de pessoas foram salvas, incluindo crianças que, na esmagadora maioria dos casos, chegam a território russo com seus pais ou tutores”.

“Pior piada de sempre” e “violação do direito internacional”

É este mesmo homem que deverá agora liderar a presidência de um mês da Rússia, e pelas indicações que tem dado não parece estar pronto a deixar passar os próximos trinta dias sem de fazer notar. Na mesma entrevista em que nega as razões dos procuradores do TPI para a emissão do mandado, Nebenzia disse que quer “presidir a alguns debates”, incluindo sobre os mecanismos de controlo mútuo de armamento.

No seguimento da nova estratégia para a politica internacional que foi revelada pelo ministro nos Negócios Estrangeiros russos, Sergei Lavrov, nos últimos dias, também o embaixador promete discutir na ONU “a nova ordem mundial”, que, espera Nebezia, possa substituir “a ordem unipolar”.

A Ucrânia não está de todo satisfeita com esta presidência rotativa e, já este sábado, o ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano usou o dia 1 de abril, que é dia das mentiras mais ou menos em todo o mundo, para brincar com a situação. “É a pior piada de sempre do dia das mentiras”. Dmytro Kuleba, disse ainda, numa entrevista na Chatham House, da qual o “The Guardian” tem um vídeo, que este dia “serve como lembrança de que algo está errado com a maneira como a arquitetura de segurança internacional está feita”.

Um dos conselheiros do Presidente Zelensky, Mykhaylo Podolyak, disse que a medida é “outra violação do direito internacional, cometida pelo principal órgão de segurança do mundo”.

O próprio Volodymyr Zelensky pediu no ano passado que o Conselho de Segurança se reformulasse, ou então se “dissolvesse completamente”, depois de “falhar” em aprovar “medidas suficientes para impedir a invasão russa”. Porém, não há nada que os aliados da Ucrânia nesta guerra possam fazer, toda a estrutura do Conselho de Segurança, as regras que estão na base da formação, tudo foi desenhado precisamente para que um bloco mais poderoso em algum momento da História não pudesse impor as suas decisões a outros países. Nem os Estados Unidos nem qualquer outro membro permanente do Conselho de Segurança pode remover a Rússia desta posição.

Para que uma resolução seja adoptada na ONU é preciso que todos os membros permanentes desde conselho votem a favor. Em fevereiro de 2022, a Rússia vetou uma resolução onde se exigia a remoção das tropas russas da Ucrânia, e outra, em setembro, que pedia a reversão da anexação dos territórios que conquistou pela força, indo contra a lei internacional. Para que uma resolução seja aprovada são precisos nove votos, mas nenhum dos cinco membros do Conselho Permanente pode votar contra. “Infelizmente, a Rússia é um membro permanente do Conselho de Segurança e não há nenhum caminho legal exequível para mudar essa realidade”, disse a porta-voz da Casa Branca Karine Jean-Pierre esta semana. Os Estados Unidos esperam que a Rússia “continue a usar o seu assento no Conselho para espalhar desinformação sobre a Ucrânia”.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: afranca@impresa.pt

Comentários

Assine e junte-se ao novo fórum de comentários

Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes

Já é Assinante?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate
+ Vistas