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Reino Unido: Liz Truss apresenta demissão, esteve seis semanas no cargo. Oposição pede eleições “agora”

A primeira-ministra do Reino Unido tentou explicar a reversão de algumas das suas medidas económicas depois de uma reação adversa dos mercados
A primeira-ministra do Reino Unido tentou explicar a reversão de algumas das suas medidas económicas depois de uma reação adversa dos mercados
DANIEL LEAL/Getty Images

Ao fim de seis semanas, Liz Truss demitiu-se esta quinta-feira depois de uma série de decisões que lhe valeram críticas pesadas, vindas de todos os lados, que em pouco tempo erodiram qualquer réstia de reputação que pudesse ter junto dos eleitores e deputados conservadores. Líder do Partido Trabalhista pede eleições “agora”

Liz Truss demitiu-se do cargo de primeira-ministra do Reino Unido, mas assegurou que dentro de uma semana o Partido Conservador terá novo líder. Isso faz antever que a votação possa ser apenas junto do grupo parlamentar, o que representaria uma mudança significativa na forma como tem sido escolhido o chefe dos tories até agora, envolvendo sempre todos os membros do partido.

Mas os tempos são de emergência e o país não pode ficar dois meses à espera de um primeiro-ministro. Pelo menos parece ser essa a mensagem transmitida pelos deputados que até agora comentaram a saída de Truss.

Truss ficou apenas seis semanas no cargo e já informou o rei Carlos III que vai abandonar o n.º 10 de Downing Street. Admitiu, num discurso muito curto, esta quinta-feira, precisamente à porta da sede do Governo, não ter sido capaz de “cumprir o mandato” para o qual foi eleita.

A eleição do sucessor é só o último grande desafio na história recente do Partido Conservador, que vive um dos anos mais difíceis de sempre. Depois do escândalo das festas de Boris Johnson durante a pandemia — que provocou uma onda de indignação entre britânicos de todas as simpatias políticas dada a severidade das medidas restritivas que o ex-primeiro-ministro impôs ao país mas não a si mesmo —, passando pela aprovação de um plano económico apoiado em mais empréstimos e, por isso mais, dívida que os mercados rejeitaram assim que Truss o anunciou, a confiança dos britânicos numa liderança conservadora pode ter saído profundamente abalada.

“Eleição geral agora”, pede líder trabalhista

Por isso mesmo, a oposição não perdeu tempo a pedir eleições legislativas “agora”. Keir Starmer, líder do Partido Trabalhista, emitiu um comunicado nesse sentido e o líder dos Liberais Democratas, Ed Davey, juntou-se aos apelos.

“Os britânicos devem ter a hipótese de comparar o caos dos conservadores com os planos do Partido Trabalhista para resolver esta confusão, melhorar a economia para os trabalhadores e reconstruir o país na direção de um futuro mais justo e verde. Precisamos de uma eleição geral agora”, defendeu Starmer.

"Após 12 anos de fracasso dos conservadores, o povo britânico merece muito mais do que esta porta giratória de caos. Nos últimos anos, os conservadores aumentaram impostos, destruíram as nossas instituições e criaram uma crise no custo de vida. E agora conseguiram destruir a economia a tal ponto em que pessoas estão a enfrentar aumentos de 500 libras por mês nos seus empréstimos à habitação. O dano que causaram vai demorar anos a ser reparado”, escreveu ainda o líder dos trabalhistas.

Os membros do Partido Conservador perfazem apenas 0,3% dos eleitores do país e os jornalistas têm estado a perguntar aos deputados se convocar legislativas não seria a forma mais clara e direta de escolher um novo Governo. Mas os conservadores nem querem ouvir falar dessa possibilidade, quando todas as sondagens mostram as intenções de voto nos trabalhistas 20 pontos percentuais acima das suas.

Davey não divergiu muito na mensagem. “Boris Johnson falhou ao país e Liz Truss destruiu a economia. Os conservadores provaram repetidas vezes que não são o partido adequado para liderar este grande país”, escreveu o líder dos Liberais Democratas.

Problema de sucessão

Nada faz antever que desta vez o Partido Conservador consiga unir-se à volta de um candidato, para evitar a acrimónia que manchou as campanhas de Truss e Rishi Sunak, ex-ministro das Finanças que foi seu oponente na última corrida. A arena dos egos nunca chegou a desmontada e até o ex-primeiro-ministro Boris Johnson parece pronto a concorrer, escrevem “The Times” e “The Telegraph”, jornais próximos dos tories.

Rachel Cunliffe, da revista “New Statesman”, deu à Sky News um bom exemplo da falta de entendimento nas trincheiras dos conservadores. “Após um período de instabilidade, precisavam de se unir à volta de um candidato, mas não foi isso que aconteceu. O partido pareceu considerar que seria mais prejudicial deixar ficar Truss no lugar do que fazê-la partir, mesmo sem terem um plano para a sucessão”.

No mesmo painel de comentário estava o escritor e analista conservador Benedict Spence, que admitiu sentir-se “aliviado”, mas também “irritado”. “Estamos no meio da tempestade. O partido sabe há muito que estes problemas iam acontecer, as contas de energia altíssimas e tudo mais. O facto de tudo isto ter sido permitido é frustrante e a opinião pública não vai perdoar-lhes se houver ainda mais lutas internas, mais problemas, mais ofuscação, mais facadas nas costas. Mais vale marcar uma eleição geral, porque será inevitável de qualquer forma”.

Ainda assim, Spence considera essencial que se consultem os militantes do Partido Conservador, e não apenas os deputados. “Não pode haver uma eleição apenas entre os deputados, porque se da opção de ouvir o país todo passamos para a opção de ouvir os militantes, e dessa passamos para a eleição de um líder apenas com o voto do grupo parlamentar, qual é o próximo passo? Colocar um tecnocrata no lugar de primeiro-ministro de cada vez que outro cai? As pessoas não vão aceitar.”

Uma eleição geral é, para já, pouco mais do que um longínquo sonho trabalhista. Com maioria absoluta na Câmara dos Comuns, os conservadores vão resistir até ao último minuto, apesar de mensagens privadas trocadas entre deputados conservadores no WhatsApp, e publicadas pela imprensa britânica, darem conta de que até eles repudiam a ideia de continuar a escolher líderes sem consultar todo o povo britânico. Seria uma transferência de poder “próxima da ditadura”, nas palavras da deputada conservadora Nadine Dorries.

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