Internacional

27 solidários com a Grécia, a tentar demover Ancara, mas sem solução conjunta para migrantes na fronteira

27 solidários com a Grécia, a tentar demover Ancara, mas sem solução conjunta para migrantes na fronteira
BULENT KILIC/Getty Images

O Presidente do Conselho Europeu foi a Ancara tentar convencer Erdogan a parar de empurrar milhares de migrantes para a fronteira grega, numa visita que deixa porta aberta a novas transferências financeiras. Em Bruxelas, os relatos e imagens de violência com migrantes geram mais embaraço do que condenação clara

27 solidários com a Grécia, a tentar demover Ancara, mas sem solução conjunta para migrantes na fronteira

Susana Frexes

Correspondente em Bruxelas

De Ancara ainda não sai fumo branco. Depois de visitar a Grécia e a Bulgária - que também faz fronteira com a Turquia - o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, foi à capital turca reunir-se com o presidente Recep Erdogan. "A reunião foi franca e necessária", disse Michel em comunicado. Os dois líderes falaram da pressão nas fronteiras e da crise na Síria, no entanto, a ausência de mais explicações deixa claro que o braço de ferro com Ancara ainda não tem solução ou fim à vista.

A União Europeia (UE) quer que a Turquia respeite o acordo fechado há quatro anos para travar o fluxo migratório em direção à Europa - e pelo qual recebeu muitos milhares de euros - e pare de empurrar milhares de migrantes e refugiados para a Grécia. Mas Erdogan tem ligado a solução à questão Síria e a um apoio europeu à intervenção militar no país. O escalar do conflito em Idlib, no noroeste sírio, provocou baixas no exército turco e está a gerar milhares de deslocados.

Em Ancara, esteve também o alto representante da UE para a política externa. Josep Borrell aproveitou para anunciar mais 170 milhões de euros para a ajuda humanitária à Síria, dos quais 60 milhões serão para ajudar a fazer face à crise no noroeste do país.

Em resposta aos jornalistas, Borrell esclareceu ainda que, dos 6 mil milhões de euros previstos no acordo com a Turquia, 4,7 mil milhões foram já contratualizados (e 3,2 mil milhões pagos) e o resto "será desembolsado durante este ano". Ao mesmo tempo, o alto representante deixa clara a possibilidade de extensão deste mecanismo.

"Tem sido muito útil para apoiar refugiados na Turquia e é algo que, seguramente, não vai acabar no final deste ano, porque o problema não está resolvido", argumenta, reforçando a ideia de que a UE está disponível para "partilhar" o fardo do acolhimento de refugiados com a Turquia, em solo turco.

O embaraço face à violência com migrantes

As imagens e relatos de violência com migrantes que chegam da fronteira entre a Grécia e a Turquia e junto às ilhas gregas criam embaraço nas conferências de imprensa em Bruxelas.

A linha da União Europeia é "a da solidariedade" e apoio à atuação das autoridades helénicas. Sem enveredar pela condenação ou reconhecimento dos alegados abusos, incluindo por parte da Guarda Costeira grega, a Comissão Europeia e os ministros do interior e administração interna preferem sublinhar, antes, que os direitos humanos devem ser sempre respeitados.

"Claro que temos de proteger as nossas fronteiras e claro que isso tem de ser feito de forma proporcional e em total respeito pelos direitos fundamentais", afirma a sueca Ylva Johanson, comissária responsável pelos Assuntos Internos. O colega grego que tem a pasta "da promoção do Modo de Vida Europeu" concorda com ela, mas recomenda aos jornalistas que tenham "um certo cuidado" com "as várias histórias a circular, especialmente nas redes sociais".

Margaritis Schinas, que foi chefe dos porta-vozes na Comissão de Jean-Claude Juncker e agora é um dos vice-presidentes de Ursula von der Leyen, argumenta que esteve no terreno e que a avaliação que faz é com base no que viu e não nos vídeos que circulam. O grego reforça a linha do governo de Atenas, que nega estar a disparar sobre migrantes e acusa a Turquia de "disseminar fake news".

"Lamentamos toda e qualquer vida humana perdida, mas também é verdade que as pessoas estão a ser atraídas para uma situação muito perigosa, com falsas promessas e através de manipulação e instrumentalização", acrescenta ainda Schinas, numa acusação clara a Ancara, de estar a empurrar milhares para as fronteiras europeias.

Mas várias imagens continuam por justificar, num dia em que a Amnistia Internacional e outras organizações humanitárias voltaram a pedir à União Europeia que encontre uma solução conjunta para o que consideram ser uma nova "crise humana na Europa". E apelam à condenação de "qualquer uso excessivo de força contra pessoas".

Um apelo que é também dirigido aos ministros da administração interna dos 27, que esta quarta-feira estiveram em Bruxelas para uma reunião extraordinária sobre a situação na fronteira com a Turquia.

Do encontro sai uma mensagem alinhada com o que disseram os presidentes da Comissão Europeia e do Conselho Europeu durante a visita à Grécia. O foco continua na proteção "determinada e efetiva das fronteiras externas da UE". Diz ainda o comunicado do final do encontro que "travessias ilegais não serão toleradas" e que os "estados-membros tomarão as medidas necessárias de acordo com a lei internacional".

Portugal envia cobertores e kits de higiene para a Grécia

À saída da reunião, o ministro português da administração interna mostrou-se solidário com as autoridades gregas, na "salvaguarda das fronteiras externas". Sem também ele entrar em comentários sobre eventuais abusos da parte da Grécia, deixou antes a garantia de que "Portugal não participará em ações de contenção em fronteiras terrestres" gregas.

Quanto à presença do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, da Polícia Marítima portuguesa e da Guarda Nacional Republicana nas ilhas gregas - através da Frontex - garante que a atuação será feita "com uma preocupação de defesa de fronteira, mas também salvaguarda de princípios humanitários".

A contribuição de Portugal será ainda outra. Cabrita anuncia que o país vai enviar "tendas de campanha, cobertores e kits de higiene pessoal" para a Grécia, através do Mecanismo Europeu de Proteção Civil.

Quanto a uma política comum de migração e à revisão do sistema europeu de asilo não há sinais de avanço. O ministro português diz que a Comissão deverá avançar com uma proposta nos próximos seis meses, que terá depois de ser avaliada.

Portugal até é dos países que defende a partilha de responsabilidade, face à pressão com a entrada de refugiados e migrantes, mas, na negociação a 27, este dossiê tem estado paralisado. O que existe é um entendimento bilateral com a Grécia e a disponibilidade para acolher mil pessoas. No entanto, Eduardo Cabrita diz que as vagas estão por preencher e aponta responsabilidades a Atenas.

"Eu diria que a iniciativa está do lado grego, não está do lado português. Estamos à espera que a Grécia indique os perfis, quem são esses migrantes", afirma o ministro português, para quem "sem o preenchimento desses lugares, não tem sentido discutir um esforço adicional", conclui.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate