Speaker da Câmara dos Comuns anuncia retirada
John Bercow anunciou que sairá do Parlamento no final de outubro ou mais cedo, se houver eleições antecipadas
John Bercow anunciou que sairá do Parlamento no final de outubro ou mais cedo, se houver eleições antecipadas
Editor da Secção Internacional
Famoso pelos gritos de “Order!” com que conduz os trabalhos, o speaker da Câmara dos Comuns do Reino Unido anunciou esta segunda-feira que vai abandonar o cargo em breve. John Bercow ocupa desde 22 de junho de 2009 aquele cargo, para o qual foi eleito pelos seus pares.
Deputado pelo círculo de Buckingham há 22 anos, inicialmente conservador mas apartidário desde que foi escolhido para a posição atual, Bercow recordou ter prometido à mulher e aos três filhos que as eleições de 2017 seriam as últimas a que concorreria. As suas palavras foram seguidas de uma ovação em pé de deputados de todos os quadrantes políticos, que o ainda speaker agradeceu de olhos húmidos.
Caso o Parlamento aprove o pedido de eleições antecipadas feito pelo Governo (para 15 de outubro), Bercow não se candidatará às mesmas. Caso contrário, demitir-se-á a 31 de outubro, pois previsivelmente terminarão nessa semana os debates sobre o Discurso da Rainha. Este é o discurso que Isabel II lerá no Parlamento, escrito pelo Executivo, a delinear o seu programa para o ano seguinte.
Com o ramo legislativo suspenso a partir desta noite por ordem do primeiro-ministro Boris Johnson, os trabalhos serão retomados a 14 de outubro com a presença da monarca. Bercow considera que é preciso um speaker experiente nessa ocasião. Seguir-se-á a eleição do sucessor pelos 650 deputados que então estiverem nos Comuns.
Bercow ocupou a cadeira central da câmara baixa ao longo dos mandatos de quatro primeiros-ministros: o trabalhista Gordon Brown e os conservadores David Cameron, Theresa May e Boris Johnson. Foi quem mais tempo durou no cargo desde Edward FitzRoy, speaker durante 15 anos entre 1928 e 1943.
Cioso de fortalecer o papel de supervisão e escrutínio da atividade governativa que cabe aos deputados, Bercow irritou os conservadores mais eurocéticos ao assumir posições europeístas e ao permitir iniciativas dos parlamentares para impedir uma saída do Reino Unido da UE sem acordo. Deu força aos deputados backbenchers, isto é, os que não ocupam cargos no Governo nem na direção das bancadas opositoras.
Tanto assim foi que o Partido Conservador se preparava, nas próximas eleições, para quebrar uma regra não-escrita segundo a qual as forças políticas não apresentam candidatos contra o speaker, que se recandidata ao Parlamento em nome próprio (sem sigla partidária). Os tories iam lançar alguém para tirar o lugar ao ex-companheiro de partido, disputa que já não acontecerá devido ao anúncio hoje feito por Bercow.
Bercow “alterou por completo a forma como o cargo é exercido”, considerou o líder do Partido Trabalhista, ao reagir à notícia, em pleno Parlamento. “Andou pelo país e falou em escolas e fábricas”, recordou. Jeremy Corbyn diz que, sendo ele próprio alguém que aspira a funções executivas (quer ser primeiro-ministro), valoriza um Parlamento poderoso que responsabilize os governantes.
O próprio Executivo de Boris Johnson, com quem Bercow teve fricções, louvou Bercow. Michael Gove, cujo cargo é equivalente ao de ministro Adjunto, inseriu o homem que agora se despede na “melhor tradição dos speakers”. Outros deputados pediram a palavra para se associarem a estes louvores.
A passagem do deputado pelo cargo cimeiro da instituição não foi, contudo, isento de polémicas. Deixando de lado as questões europeias, Bercow foi responsabilizado num relatório, em 2018, sobre maus-tratos a empregados do Parlamento, que a liderança do mesmo não estaria a combater adequadamente. O documento foi encomendado pelo próprio speaker depois de ter sido pessoalmente acusado de bullying por um antigo secretário.
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