Internacional

Arménia. Deputados querem queimar ativista transsexual que falou no parlamento

A intervenção de Lilit Martirosyan numa comissão de direitos humanos ofendeu muita gente, no parlamento e fora dele. O discurso não foi longo, mas rapidamente correu mundo. Martirosyan falou da discriminação que as pessoas como ela sofrem a muitos níveis e, a certa altura, referiu os 283 ataques registados contra pessoas dessa comunidade

Luís M. Faria

Jornalista

"Torturados, violados, raptados, sujeitos a violência física, queimados, imolados, esfaqueados, sujeitos a tentativas de homicídio, mortos, exilados e roubados". Foi assim que Lilit Martirosyan, uma ativista transsexual arménia, descreveu aquilo a que pessoas como ela têm sofrido em anos recentes no seu país. A intervenção teve lugar a 5 de abril no parlamento, durante uma audiência pública sobre direitos humanos, e foi relativamente curta. Mas logo que o vídeo começou a ser partilhado na internet, as reações explodiram, tanto no parlamento como fora dele.

Martirosyan foi a primeira cidadã transsexual a falar num fórum àquele nível na Arménia, um país socialmente conservador. A presidente da Comissão de Direitos Humanos do parlamento disse logo que não devia ter falado ali, pois a audiência era sobre direitos de crianças e deficientes, bem como reformas no sistema jurídico do país. Outros deputados foram mais agressivos. E dias depois, numa manifestação de protesto em frente ao parlamento, líderes religiosos ofereceram-se para "purificar" espiritualmente o edifício.

Os vários partidos têm tentado culpar-se uns aos outros por Martirosyan ter falado naquela comissão. Falam do "vício" que ela representa, associando-o à homossexualidade - resultado de influências ocidentais no país, garantem. No meio dos ataques, acusam-na de ter desrespeitado o parlamento e há deputados a defender que deve ser queimada.

O seu discurso no parlamento, que não foi longo, rapidamente correu mundo. Martirosyan falou da discriminação que as pessoas como ela sofrem a muitos níveis - no emprego, nos tribunais nos hospitais. A certa altura referiu os 283 ataques registados contra pessoas dessa comunidade e disse: "Para mim, significa que há 283 criminosos na Arménia a viver junto a mim e a vocês. E quem sabe, talvez o 284º esteja amanhã a cometer o seu crime".

No ambiente atual, a sua exigência de que as autoridades façam mais para proteger os transgénero não parece ter grandes possibilidades de sucesso. Segundo explicou depois ao jor4nal "Guardian", já houve um homem que apareceu no parlamento com uma faca a dizer que a queria matar, para além de todas as outras pessoas que têm feito ameaças semelhantes no Facebook e noutros espaços.

Em sentido contrário vão os apelos de entidades internacionais como a ONU e a União Europeia. Esta última lembrou que "discursos de ódio, incluindo ameaças de morte dirigidas à senhora Lilit Martirosyan, às suas colegas e à comunidade LGBT no seu todo, constituem discriminação proibida pela Convenção Europeia dos direitos humanos e liberdades fundamentais, da qual a Arménia faz parte, e que surge refletida na Constituição da Arménia".

A porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros arménio rejeitou essas afirmações, dizendo que os outros países devem mostrar "mais respeito e sensibilidade" pela sociedade arménia.

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