Um dos locais mais sagrados para os cristãos de todo o mundo está de porta fechada a peregrinos, turistas e público em geral por tempo indeterminado. No domingo, em frente à pesada porta de madeira do Santo Sepulcro, na Cidade Velha de Jerusalém, os líderes das três maiores comunidades cristãs representadas no seu interior justificaram a medida com a necessidade de protestarem contra a política “discriminatória” de Israel, que atenta contra a presença cristã na Terra Santa.
No centro da polémica está uma decisão do município de Jerusalém que acaba com a isenção do pagamento do imposto municipal relativo a propriedades eclesiásticas. “Há uma dívida acumulada ao longo de anos. Fizemos o que faríamos com qualquer outro cidadão”, defendeu o presidente da Câmara, esclarecendo que a medida visa apenas propriedades comerciais detidas pelas igrejas (como hotéis) e não terrenos onde existam locais de culto. “Se não está satisfeita, a Igreja está convidada a recorrer ao tribunal. Estou surpreendido que não o tenham feito”, disse Nir Barkat, citado pelo jornal “The Jerusalem Post”.
As igrejas cristãs reclamam a existência de um acordo antigo que as isenta do pagamento de impostos municipais. Datado da era otomana, recordam, foi respeitado por britânicos (que detiveram o mandato da Palestina), jordanos (que ocuparam e anexaram Jerusalém Oriental após a guerra israelo-árabe de 1948) e sucessivos governos israelitas (após a ocupação na guerra de 1967).
“Estas ações violam acordos existentes e obrigações internacionais, que garantem direitos e privilégios às igrejas, no que parece ser uma tentativa de enfraquecimento da presença cristã em Jerusalém”, defenderam os líderes cristãos, à entrada do Santo Sepulcro, numa posição de unidade inédita, tendo em conta a rivalidade e, por vezes, conflitualidade entre monges de diferentes sensibilidades cristãs, no interior do templo.
Outra medida recente que indignou os responsáveis cristãos prende-se com um projeto de lei que viabiliza — com efeitos retroativos — a expropriação de terrenos vendidos por igrejas a privados. Previsto para ser debatido no domingo, na habitual reunião semanal do Governo de Telavive, essa discussão foi adiada uma semana para que seja possível “trabalhar com as Igrejas” e tentar resolver o conflito, disse a deputada proponente Rachel Azaria, do partido Kulanu (sionista).
E se fosse com sinagogas?
Em estilo provocatório, o diário israelita “Haaretz” questionava no domingo: “Uma questão relevante é o que Israel diria se uma medida deste género fosse tomada noutro país relativamente a propriedades de sinagogas”. Em declarações ao Expresso, Adeeb Jawad Joudeh Alhusseini, o muçulmano que, diariamente, guarda as chaves do Santo Sepulcro, recorda que não é a primeira vez que a igreja é encerrada numa ação de protesto. Isso já aconteceu a 27 de abril de 1990, “durante 48 horas, quando colonos [judeus] ocuparam o Hospício de S. João”, no bairro cristão.
O Santo Sepulcro é local de visita obrigatória para qualquer cristão em peregrinação à Terra Santa. No seu interior, situa-se o Calvário, onde Jesus Cristo foi crucificado, e também o Edículo, uma construção em madeira que envolve o túmulo onde foi sepultado.
Na igreja, estão representadas seis sensibilidades cristãs — ortodoxos gregos, ortodoxos arménios, católicos romanos (franciscanos), coptas, siríacos e etíopes. Situa-se na parte leste (árabe) de Jerusalém, conquistada por Israel na Guerra dos Seis Dias (1967) e anexada em 1980, após aprovação do Parlamento de Israel.
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