5 Décadas de Democracia

Aposta nas exportações é o caminho para aumentar a produtividade?

Aposta nas exportações é o caminho para aumentar a produtividade?
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O Expresso e a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) juntam-se para debater as últimas cinco décadas de democracia em Portugal. Nos próximos meses, vamos escrever (no Expresso) e falar (na SIC Notícias) sobre 10 tópicos diferentes da sociedade à economia. Em outubro, o foco da análise é a produtividade

OS FACTOS

Na viragem do século, o total de exportações em Portugal representava 28,4% do produto interno bruto (PIB) – a venda de bens era responsável por 20,5% e a comercialização de serviços não ia além dos 7,9%. Em 2011, os valores do comércio com o exterior subiram para 35% do PIB e onze anos mais tarde, em 2022, correspondiam a 49,5%.

Se compararmos os números do comércio de bens e serviços no ano de 2000 e de 2022, a venda de produtos além-fronteiras passou a ser responsável por 31,3%, enquanto os serviços atingiram 18,2%.

Dados do Banco de Portugal referentes a 2022 mostram que Espanha (20,6%), França (12,4%) e Alemanha (10,8%) foram os três principais destinos de exportação, contribuindo para o aumento das vendas externas face a 2021 (23,1%).

Estados Unidos, Reino Unido, Itália, Países Baixos, Bélgica, Angola e Polónia completam o top 10 de compradores de produtos e serviços com origem em Portugal.

Ao longo das últimas décadas, a produtividade por hora trabalhada tem vindo a aumentar, mas não o suficiente para igualar a média europeia – em 2021, a produtividade portuguesa representava €24,3 contra €43,6 na União Europeia.

COMO CHEGÁMOS AQUI

A produtividade tem sido o calcanhar de Aquiles em Portugal, que frequentemente é colocado no cesto dos países do Sul da Europa rotulados como “preguiçosos”. Mas será que a falta de produtividade faz parte do ADN nacional? Filipe Grilo considera que não. “Quando se diz que Portugal tem baixa produtividade, a culpa é sempre dos trabalhadores que são preguiçosos. E, de facto, isto é errado”, defende o professor de economia da Porto Business School.

€78 mil milhões

é o montante total de bens e serviços vendidos por Portugal além-fronteiras em 2022, segundo dados do INE. No mesmo ano, as importações representaram mais de €109 mil milhões

Para os peritos ouvidos pelo Expresso, o problema é mais complexo e multifatorial. São sobretudo três os elementos que condicionam o desempenho português nesta matéria: as qualificações dos trabalhadores, a qualidade da gestão empresarial e o papel do Estado. José Alberto Ferreira não tem dúvidas de que a formação dos trabalhadores é importante, mas alerta que não é suficiente se o ambiente em que está inserido não for o ideal. “Se um engenheiro é o único num laboratório, é muito mais difícil fazer sozinho trabalho de inovação que, muitas vezes, é feito em equipa”, exemplifica o economista.

Filipe Grilo vê nas exportações uma das respostas para o aumento da produtividade, já que, de forma geral, as organizações que vendem em mercados externos conseguem gerar maior valor acrescentado. “Quando a empresa inicia o seu processo de internacionalização começa a vender para um mercado muito maior e consegue economias de escala. A margem de lucro vai ser maior e o valor acrescentado também”, explica.

“A resposta macro [para o aumento da produtividade] é canalizar recursos da economia para os sectores com maior potencial de inovação e de crescimento”, defende o economista José Alberto Ferreira

Por outro lado, existe “fraca qualidade de gestão” em Portugal que provoca um subaproveitamento dos recursos humanos, menor eficiência e, como consequência, menor produtividade. Mais uma vez, a exposição de um gestor nacional e da sua empresa a mercados mais competitivos e exigentes pode, considera o professor, contribuir para melhorar as capacidades dos gestores. “A exportação pode expor o gestor a este ambiente mais concorrencial e fazer com que comece a absorver competências que não tem”, diz.

PARA ONDE CAMINHAMOS

O aumento do peso das exportações no PIB é um dos grandes objetivos traçados pelo Governo, que tinha definido, em 2020, a meta de 53% a atingir até ao final desta década. Para isso é preciso continuar a apostar não apenas no aumento da venda de bens e serviços ao exterior, mas também na subida do preço médio e na multiplicação do número de empresas exportadoras.

Porém, a receita para o sucesso depende também de incentivos públicos, afirma Filipe Grilo, que dá como exemplo o alargamento do cheque-formação às chefias (atualmente direcionado para os trabalhadores). O economista insiste nesta ideia da qualidade dos gestores portugueses e da importância de os expor à concorrência internacional. “Cada vez mais artigos científicos têm colocado a nu a diferença da qualidade da gestão das empresas portuguesas domésticas em relação às empresas portuguesas multinacionais. Estas últimas têm qualidade de gestão ao nível das empresas alemãs”, aponta.

Para os especialistas, é importante que mais sectores da economia possam replicar o exemplo de transformação da indústria têxtil portuguesa, que passou de uma competição com base nos preços baixos para a exportação de produtos com elevado valor acrescentado. “Temos neste momento indústria do calçado que compete com calçado italiano em valor acrescentado”, acrescenta ainda o professor da Porto Business School.

O caminho rumo ao aumento da produtividade passa por criar empresas dinâmicas, com forte vocação para a inovação, apostadas na eficiência e capazes de competir ombro a ombro com organizações internacionais em mercados exigentes. Falta começar a trabalhar para recuperar o tempo perdido.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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