Na conferência estiveram a Deco, a Direção-Geral de Energia, o regulador, as agências de energia e os operadores de mobilidade elétrica
Inovação. A E-Redes concluiu, em novembro, a substituição dos 6,6 milhões de contadores por equipamentos inteligentes. Um trabalho “hercúleo” feito em quase 10 anos, mas que carece agora de uma aposta na literacia do consumidor
Já reparou que nunca mais lá foram a casa “contar a luz”? Que os valores que aparecem na fatura são reais e não estimativas? Que, quando lhe faltou ou lhe cortaram a eletricidade, resolveram o problema remotamente? Ou que lhe conseguem mudar a potência sem ter de agendar um técnico? Ou ainda que consegue saber a que horas é que consome mais ou menos eletricidade e estabelecer alertas sempre que passa um determinado valor? E já se questionou porque é que consegue fazer isto tudo? Já lhe ocorreu que tem a ver com o contador novo que lá foram pôr a casa ou ainda resmunga que o anterior estava em perfeitas condições e não valia a pena mudar?
Pois, é que mesmo sendo tratado com a empresa que lhe vende a eletricidade, é o contador inteligente que a E-Redes instalou que lhe permite fazer tudo isto. E estas são as vantagens mais imediatas, repara Ana Sofia Ferreira, coordenadora do gabinete de apoio ao consumidor da Deco. Há outras, acrescenta Luís Filipe Pereira, responsável pelas operações das redes inteligentes na E-Redes. Por exemplo, quando não paga a fatura o contador permite que, remotamente, lhe seja reduzida a potência para 1,5 kilovoltamperes (kVA) como forma de o incentivar a pagar antes do corte efetivo, que tem um custo para o consumidor. É que com 1,5 kVA dá para ligar a televisão, um computador ou o fogão para cozinhar. O forno, um aquecedor ou um secador já fazem o quadro disparar. Outra vantagem tem a ver com a mobilidade elétrica. Se morar num condomínio e, além de si, mais inquilinos tiverem um carro elétrico, é o contador inteligente que lhe permite ter uma fatura só sua.
É por isso que Bruno Martinho, managing director na Accenture Portugal, diz que o contador — como peça das redes inteligentes — é uma espécie de “parceiro silencioso” da transição energética, porque permite “uma aproximação ao consumidor”, que não só passou a poder controlar o que gasta e onde e quando quer gastar, como passou a ter a possibilidade de ser um produtor de energia.
600
milhões é a quantidade de registos que a E-Redes recebe por dia por causa dos contadores inteligentes. Recebe ainda 10 milhões de notificações de avarias possíveis ou reais
€330
milhões foi o montante investido na substituição de 6,6 milhões de contadores antigos por equipamentos inteligentes durante os quase 10 anos que levou todo o processo
Mas — e nisto da transição energética há sempre um mas — não basta mudar equipamentos para os consumidores perceberem o porquê da mudança e as vantagens que traz, repara Ana Sofia Ferreira. Por isso é que defende um maior acompanhamento ao consumidor, “para que ele possa perceber como tirar maior partido do contador inteligente e de toda a informação que ele disponibiliza”. Aliás, para Carlos Querido Santos, presidente da Associação das Agências de Energia e Ambiente (RNAE), “a grande aposta tem de ser na literacia. Não podemos fazer ruturas energéticas. Não é de um momento para o outro que se diz a uma pessoa que agora há painéis solares que aquecem a água quando ela está habituada a acender o esquentador com um fósforo”.
A importância para o gestor da rede
O conceito de “parceiro silencioso” encaixa bem nas vantagens para os consumidores, mas também nas que existem para quem gere as linhas de distribuição e garante que a eletricidade chega a todo o lado sem falhas. De facto, não foi porque os contadores antigos estivessem velhos ou avariados que a E-Redes passou os últimos 10 anos a testar e depois a instalar 6,6 milhões de contadores inteligentes em todas as casas e candeeiros de rua do país. Foi precisamente por eles serem essenciais na transição energética e numa maior eletrificação da sociedade.
É por causa deste tipo de equipamentos que se consegue perceber com mais detalhe em que zona do país é preciso fazer mais redes e, dessa forma, reduzir um investimento que tem de ser aprovado pelo regulador, porque é suportado por todos os consumidores nas tarifas. Além disso, repara Luís Filipe Pereira, ajuda no combate à fraude, porque “se se abrir a tampa do contador ele dispara um alerta”. E permite resolver avarias de forma remota, sem ter de enviar um técnico ao local, ou seja, de forma muito mais rápida. Aliás, assim que liga para o apoio ao cliente da E-Redes ou da empresa que lhe vende a eletricidade, o técnico sabe logo dizer se está ou não a entrar energia na rede ou se o problema é um eletrodoméstico avariado.
“Houve uma melhoria brutal da qualidade de serviço. Há 20 anos tínhamos um tempo de interrupção de 300 minutos [por ano] e agora são 48 minutos”, reparou Miguel Stilwell d’Andrade, CEO do grupo EDP, ao qual pertence a E-Redes, e que esteve na abertura da conferência que marcou a conclusão da instalação de contadores inteligentes em todo o país. Um processo que diz ter sido “hercúleo”, pela dimensão da empreitada e pelas dificuldades sentidas no terreno. É que mais de metade dos contadores estão ou dentro de casa ou em zonas exteriores inacessíveis sem autorização do cliente. E apesar de terem instalado 4,6 milhões de contadores inteligentes entre 2016 e 2022, nesse ano saiu um decreto-lei que obrigava a concluir tudo este ano, e, portanto, entre 2022 e novembro de 2024 instalaram mais de um milhão em cada ano, cerca de seis mil por dia. “Não foi uma campanha isenta de dificuldades, mas foi um sucesso. Não devemos ter falsas modéstias”, conclui o CEO da E-Redes, José Ferrari Careto.
FRASES DA CONFERÊNCIA
“O contador antigo dava para saber quanto se consumia num mês. Com os novos sabemos o que se consome, com detalhe, de 15 em 15 minutos”
Luís Filipe Pereira
Responsável pelas operações das redes inteligentes na E-Redes
“Há clientes que aceitam, outros não. É um trabalho enorme para ter acesso às casas”
Miguel Stilwell d’Andrade
CEO do grupo EDP
“A transição energética tem muito mais a ver com incerteza e dinamismo. Antes escrevíamos regulamentos na pedra, mas agora têm de ser feitos com base na incerteza”
Pedro Verdelho
Presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE)