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Guarda quer levar o mar para o interior do país

Logística emprega mais de nove mil pessoas na Guarda. Há 241 empresas do sector na região
Logística emprega mais de nove mil pessoas na Guarda. Há 241 empresas do sector na região
D.R.

Mercadorias: investimento de €11 milhões no porto seco, que alivia a pressão sobre os portos tradicionais, traz mais emprego até final do ano. Meta: fazer da região um centro logístico nacional

Francisco de Almeida Fernandes

Habitação mais barata, melhor qualidade de vida e apoio ao empreendedorismo são argumentos do município da Guarda para atrair talento para a região. A par da captação de recursos, é fundamental evitar a fuga dos jovens especializados que todos os anos são formados pelo Instituto Politécnico da Guarda (IPG). Para isso, acredita o professor e investigador André de Sá, é preciso “trazer empresas mais competitivas” para o distrito, por via da aposta na inovação, através de projetos como o CoLab LogIN. Trata-se de um laboratório colaborativo do IPG com o tecido empresarial para investigação de ponta aplicada à logística, que conquistou €1,3 milhões de financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia e que prevê a criação de um observatório do sector. “Vamos trabalhar assuntos da ferrovia e tudo isso será explorado ao nível da descarbonização e das tecnologias que podem mitigar as emissões de carbono”, exemplificou durante a conferência na Guarda que assinalou o 50º aniversário do Expresso.

Entre as organizações que integram o projeto estão startups com soluções para a previsão atempada, através de algoritmos, de problemas mecânicos nas frotas logísticas ou para a utilização de drones para o transporte aéreo de mercadorias. A veia disruptiva do concelho motiva investimento da Câmara Municipal da Guarda, que quer tornar a capital de distrito “um verdadeiro hub do interior”, da tecnologia e do empreendedorismo. “[Queremos potenciar] a atração dos nómadas digitais e das empresas de base tecnológica”, sublinhou Sérgio Costa, presidente da câmara.

Para materializar esta intenção, o município inaugurou, em novembro, o Espaço Tecnológico no centro histórico da cidade, que será, garante o edil, apenas um de muitos. No entanto, as empresas precisam de trabalhadores em quantidade e qualidade, missão com a qual o Politécnico está comprometido. “Temos estado recetivos às necessidades [formativas] do tecido empresarial”, assegura Joaquim Brigas, que tem procurado “trazer o saber prático para dentro da sala de aula”. A estratégia do presidente do IPG tem sido marcada pelo envolvimento de empresas da região, como a multinacional de cibersegurança Fortinet ou a tecnológica Merkle, no desenho dos currículos académicos. “A parceria que temos com o Politécnico é para a formação de pessoas nas áreas tecnológicas que trabalhamos, que não são dadas a nível académico. Isto tem sido muito importante”, refere o especialista em sales force da Merkle. Luís Baptista assinala que o apoio da instituição de ensino e do município permitiu à empresa passar de três para 82 colaboradores nos últimos quatro anos.

Logística é prioridade regional

Junto à fronteira com Espanha, a cidade da Guarda tem uma localização privilegiada para se afirmar “no panorama logístico nacional e ibérico”, defende o presidente da câmara, com olhos postos no “mercado potencial de 2,5 milhões de pessoas” em Castela e Leão. “A logística emprega cerca de nove mil pessoas aqui na Guarda. É um grande sector e muito importante”, assinala João Logrado, diretor-geral da Olano Portugal. Servida por duas autoestradas, a capital de distrito tem à disposição a ferrovia, através das Linhas da Beira Alta e da Beira Baixa, fatores considerados essenciais para a distribuição de mercadorias. A estas infraestruturas vai juntar-se, até ao final do ano, o Porto Seco da Guarda — um centro logístico que será capaz de aliviar a pressão dos portos de mar, como o de Leixões, e fazer a ligação às plataformas logísticas. Será uma forma, acrescenta Sérgio Costa, de “alargar a área de influência dos portos de mar e promover mais coesão territorial”, mas também de aproximar “o mar do interior”.

A concessão foi atribuída à Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo, que vai investir €11 milhões neste projeto, que permitirá duplicar o carregamento de contentores. O Politécnico tem vindo a preparar cursos técnicos e licenciaturas em áreas como a análise de dados e inteligência artificial para “antecipar” as necessidades de recursos humanos do porto seco. “Sou dos que acreditam piamente que a Guarda vai ser o maior centro logístico do país”, remata Joaquim Brigas.

Descentralizar a formação

Aprendizagem O Instituto Politécnico da Guarda tem vindo a apostar na disponibilização de cursos técnicos superiores profissionais (CTeSP) em vários concelhos do distrito. O objetivo é impedir a fuga de jovens da região e criar competências em áreas estratégicas para o desenvolvimento do território. Estes cursos têm uma duração de dois anos e não conferem grau académico.

11,2

é a percentagem de residentes que o distrito da Guarda perdeu desde 2011, segundo o Censos 2021. O concelho de Almeida foi o que mais encolheu em população (18,7%), enquanto Aguiar da Beira registou a menor descida entre os 14 municípios. Índice de envelhecimento aumentou para 368 idosos por cada 100 jovens.

Colaboração com as empresas

Competências Captar e fixar o tecido empresarial tem sido uma estratégia seguida no Instituto Politécnico da Guarda para aumentar a especialização dos alunos, mas também para potenciar a sua empregabilidade na região. A multinacional de cibersegurança Fortinet e a consultora tecnológica Noesis são exemplo de organizações que ali abriram escritórios.

300

milhões de euros é o montante total de investimento previsto para as obras da Linha da Beira Alta até 750 metros, que deverá permitir reduzir o tempo de viagem e facilitar a circulação de comboios de mercadorias.

Melhores frases

“Temos um peso muito forte do sector logístico no nosso concelho e a Guarda está, portanto, melhor posicionada para se afirmar no panorama logístico nacional e ibérico”

Sérgio Costa
Presidente da Câmara Municipal da Guarda

“Vão-se embora muito mais [jovens] do que gostaríamos. Uma das formas de os reter, e o Politécnico está a fazer esse trabalho, é através da capacitação de recursos”

Joaquim Brigas
Presidente do Instituto Politécnico da Guarda

“Estar na Guarda não foi negativo, foi diferenciador e positivo. Podemos ir a Lisboa em duas horas e meia ou a Madrid em três horas”

João Logrado
Diretor-geral da Olano Portugal

Conferências 50 anos

À boleia do roadshow que fez pelo país, inserido nas comemorações do 50º aniversário, o Expresso organizou várias conferências para perceber os desafios e as estratégias de desenvolvimento das diferentes regiões. Guarda foi a última paragem, em parceria com a sua Câmara Municipal.

Textos originalmente publicados no Expresso de 31 de março de 2023

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