Projetos Expresso

O turismo em Portugal “recuou dez anos”

O turismo em Portugal “recuou dez anos”
NUNO BOTELHO
Projetos Expresso. Prémio Nacional do Turismo: Entrevista a Rita Marques, Secretária de Estado do Turismo

Até ao final de setembro, o sector turístico nacional perdeu €7,7 mil milhões de receitas. Em valores, o país recuou dez anos, mas Rita Marques confia que Portugal vai recuperar até 2023 e subir a qualidade da oferta.

Estamos a dias do final do ano. Os dados disponíveis confirmam o pior cenário para o turismo nacional dos últimos anos?

Os dados existentes — até ao terceiro trimestre de 2020 — são manifestamente negativos. Através do E-Fatura é possível verificar quebras de faturação nas empresas do sector do turismo na ordem dos €7,7 mil milhões. Isto representa um decréscimo de receitas turísticas de 56%, o que equipara com os valores de há dez anos. Em resumo, Portugal recuou dez anos.

E quantos anos vão ser necessários para recuperar até aos valores de 2019?

Espero que em termos de receitas turísticas, em 2022 ou 2023 se consiga voltar aos valores do último ano. Mas é preciso pensar além das receitas e fazer com que o ano de 2020 seja encarado como uma janela de oportunidade. É necessário reposicionar o destino Portugal e subir uns furos na cadeia de valor.

Para tentar inverter esta situação que novas medidas vão ser aplicadas em 2021?

Uma vez que a retoma ocorrerá, provavelmente, no segundo semestre do próximo ano, as medidas já anunciadas vão perdurar, pelo menos, até ao final de junho, destacando-se o apoio à manutenção dos postos de trabalho, que será melhorado, e o apoio à tesouraria — Apoiar.pt —, que foi reforçado de €750 para €900 milhões. Neste momento estamos [Ministério da Economia] também a trabalhar num pacote de medidas para a capitalização das empresas, porque sabemos que há uma deterioração muito relevante nos capitais próprios na sequência da pandemia. Por outro lado, especificamente na área do turismo, vamos continuar a apostar no investimento no futuro do sector e recordo que, muito recentemente, foi anunciada uma linha de apoio à qualificação da oferta.

Está confiante de que a Páscoa vai ser o ponto de inversão na procura turística?

A vacina é um balão de esperança. Os planos de vacinação, em Portugal e na Europa, dão ao turismo a confiança suficiente para acreditar que a Páscoa vai marcar o início de uma fase com um maior fluxo turístico. Como exemplo, logo que foi anunciado o início da vacinação no Reino Unido foi possível verificar um acréscimo das reservas. Reconheço, em contraponto, que o primeiro trimestre de 2021 vai ser ainda duro para todo o sector.

Em que ponto está a iniciativa “IVAucher”, cujo arranque foi anunciado, precisamente, para o início do segundo trimestre, coincidente com a Páscoa?

A medida está vertida no Orçamento do Estado e está agora a ser regulamentada. Mas, apesar de ser apenas operacionalizada no segundo trimestre, começa já a funcionar para todas as despesas a partir de dia 1 de janeiro. É também intenção do Governo reativar, muito em breve, outra medida de incentivo ao turismo interno, a campanha “Visitar Muito por Pouco”, que oferecia experiências e serviços com descontos e que, entretanto, foi suspensa, por estar condicionada ao evoluir da pandemia.

Com o retomar gradual do turismo internacional, com todos os destinos concorrentes a apostar em estratégias agressivas de promoção, não receia que os operadores e o mercado obriguem a uma baixa de preços?

Honestamente, não acredito que isso aconteça. Viajar deixou de ser uma commodity para passar a ser algo reservado apenas a alguns. Neste sentido, a pressão para reduzir preços não está alinhada com esta tendência. Portugal tem vindo a construir uma imagem sólida que recentemente foi até reconhecida internacionalmente como a melhor do mundo.

A TAP sempre foi associada ao crescimento do turismo em Portugal. Teme que a reestruturação da companhia, por estar a acontecer agora, possa prejudicar a retoma do sector?

A TAP tem sido um parceiro absolutamente fundamental, em especial nas ligações de longo curso, como Brasil, África e Estados Unidos. Os dados indicam que 45% de todos os passageiros que aterram em Portugal viajam com a TAP, que também é essencial para os Açores e Madeira, tanto para o mercado turístico nacional como internacional. Posto isto, quero acreditar que, no futuro, a TAP vai continuar a ajudar e a apoiar a estratégia que gizamos para o turismo, independentemente da reestruturação. Uma TAP forte é fundamental para o turismo português.

Com a redução do tráfego aéreo devido à pandemia, o novo aeroporto de Lisboa parece ter deixado de ser uma prioridade. Tendo em conta o pós-pandemia esta não deveria ser uma prioridade para a retoma do turismo me Portugal?

A oferta aeroportuária, se for competitiva, é fundamental para a recuperação do turismo. Antes desta crise, o aeroporto de Lisboa já não estava com capacidade para dar resposta às necessidades. A crise aliviou esta situação, mas há uma certeza que tenho: a procura retomará e temos de estar preparados. Por isso, qualquer que seja a decisão tem de ser tomada em tempo útil para não estrangular o retomar e o crescimento do turismo.

Sustentável, inteligente e de confiança

A segunda edição do Prémio Nacional do Turismo contou com cinco novas categorias adaptadas aos tempos de pandemia, reflexo da estratégia delineada para o futuro do sector. Resultado das necessidades da atualidade na luta contra a covid-19, a distinção Turismo de Confiança foi atribuído ao selo “Clean & Safe”, uma iniciativa do Turismo de Portugal, que acabou por ser replicada em vários países. Igualmente com ecos além-fronteiras e reconhecido pelo Prémio Nacional do Turismo, a Certificação de sustentabilidade do destino turístico Açores venceu na categoria Turismo Sustentável. O projeto do Governo Regional aposta no turismo como uma atividade promotora de melhores condições de vida para as populações locais, contribuindo para o desenvolvimento económico e o equilíbrio ambiental. Com o objetivo de distinguir projetos que incrementam o conhecimento na área do turismo, a capacitação das equipas e uma maior eficiência dos negócios, a categoria Turismo Inteligente premiou o Envision @Pestana, um programa de inovação aberta para colaboradores do grupo Pestana que contribui para o desenvolvimento de produtos e serviços inovadores, como resposta a clientes mais exigentes na utilização de tecnologia. O Prémio Nacional do Turismo atribuiu ainda uma menção honrosa ao projeto Smart Resort, uma ferramenta de inteligência de negócio para apoio à gestão dos empreendimentos turísticos de Vale do Lobo, Dunas Douradas e Vale do Garrão. Book in Xisto (Turismo em Rede) e Casa de São Lourenço — Burel Mountain Originals (Turismo Autêntico) foram outros dos vencedores do Prémio Nacional do Turismo 2020, que distinguiu ainda a carreira de Mário Pereira Gonçalves, presidente da Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP).

Textos originalmente publicados no Expresso de 24 de dezembro de 2020

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