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“Qual é a pegada carbónica de um pacote de sumo?”: há uma aplicação para medir as emissões de dióxido de carbono em tempo real

Uma aplicação portuguesa de gestão energética ajuda as empresas a registar os consumos energéticos e a calcular as emissões de CO2 em tempo real, de forma a conseguirem reduzi-las e alcançarem as metas de sustentabilidade

“Qual é a pegada carbónica de um pacote de sumo?”: há uma aplicação para medir as emissões de dióxido de carbono em tempo real

Eunice Parreira

Jornalista

Alcançar a neutralidade carbónica é um dos maiores desafios nos próximos 25 anos para a União Europeia (UE). Se as empresas não adotarem estratégias que otimizem os consumos energéticos e reduzam as emissões de gases com efeito de estufa (GEE), esta meta torna-se mais difícil de atingir. Para ajudar a medir e monitorizar as emissões de CO2 em tempo real foi criada a aplicação ACCEPT Energy.

A aplicação recorre a algoritmos de machine learning e inteligência artificial para analisar dados históricos de forma a simular e prever os custos energéticos e as emissões dos GEE. Também recolhe estes dados, em tempo real, para ajudar as empresas a reduzir a sua pegada ambiental e utilizarem fontes de energia mais sustentáveis.

O projeto desenvolvido pela empresa SINMETRO, contou com o financiamento de quase 780 mil euros através do programa COMPETE 2030, dos quais quase 497 mil euros provieram do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER). Por trabalharem com empresas integradas no Comércio Europeu de Licenças de Emissão, a SINMETRO decidiu expandir o sistema, já existente, ACCEPT – Quality Control Solutions, para integrar um modulo capaz de gerir e prever as suas emissões de CO2.

“Em algumas indústrias já é obrigatório o cálculo das emissões de CO2, por exemplo, como um lote de combustíveis ou de biocombustíveis. Nos produtos finais, isso ainda não é obrigatório, mas já temos muitas empresas que pretendem calcular a pegada carbónica associada aos seus produtos de consumo”, explica Cristina Barros, sócia fundadora da empresa.

Finalizada há cerca de seis meses, esta aplicação está implementada em parceiros na SINMETRO e já recebeu várias propostas de interessados nesta ferramenta. “Entre setembro e novembro, recebemos muitas perguntas e, sempre que mostrávamos a área que estávamos a trabalhar, havia muito interesse”, recorda Gonçalo Martins, também sócio fundador da empresa.

Como surgiu a ideia de criar o ACCEPT Energy?

Cristina Barros: Nós queríamos adquirir dados diretamente das fontes de medição, onde nós conseguimos medir os diferentes consumos energéticos que a empresa tem e traduzir esses consumos quer em kilowatts por exemplo, quer depois em toneladas de CO2. Nós quisemos desenvolver esta ferramenta para ajudar os nossos clientes a adquirir esses dados, a centralizar e a tratar essa informação e a ajudá-los na emissão dos relatórios que têm de organizar para avaliar as emissões e ajudá-los a controlá-las, porque se eles ultrapassam o limite de emissões por ano que lhes é atribuído, têm de ir à bolsa comprar emissões para continuar a produzir. As empresas têm de fazer este controlo em tempo real e precisam destas ferramentas em tempo real.

Outro aspeto muito importante é poderem também fazer estimativas, previsões dos consumos em função do plano de produção e em função do histórico, fazer uma análise preditiva daquilo que serão os consumos, se têm de ir à bolsa de emissões, comprá-las ou se até as podem vender, porque isto é uma bolsa de compra e venda. As empresas podem otimizar este processo, com o objetivo de reduzir essas mesmas emissões e perceberem qual é o impacto das estratégias de descarbonização que estão a adotar e se estão a cumprir as metas, porque uma das metas é reduzir em 30% as emissões de CO2, o que é extremamente ambicioso e exige uma mudança radical do mix energético que as empresas estão a adotar. Se não houver essa medição e essa monitorização, é impossível depois conseguirmos avaliar os impactos.

Como funciona o sistema ACCEPT Energy?

Cristina Barros: Nós queremos integrar o nosso sistema com os principais sistemas ou equipamentos que fazem a aquisição dos dados na indústria. Existem sistemas típicos neste tipo de indústrias, que são os sistemas de SCADA, que reúnem um conjunto de sensores no processo industrial para adquirir, por exemplo, consumos de combustível, mas também outros parâmetros de processo, como temperaturas, pressões, etc. Nós queremos sempre integrar com aquilo que a empresa já tem, que são os sistemas de medição, para medirmos em tempo real estes consumos, caso contrário, nós não estamos a otimizar. Imagine, eu tenho uma aplicação, mas alguém na fábrica tinha de ir ver quais eram os consumos com alguma regularidade e registar esses consumos para depois fazermos a transposição do cálculo.

É possível obter outros dados através do sistema?

Cristina Barros: Há aqui outro aspeto que é irmos além do cálculo das emissões relacionada apenas aos consumos de energia e levarmos o cálculo das emissões de CO2 a um produto final porque esse produto envolve uma pegada carbónica ao longo da sua cadeia de valor, desde as matérias-primas às emissões do processo. Por exemplo, num pacote de sumo: qual é a pegada carbónica de um pacote de sumo? Como podemos calcular essa pegada carbónica? Há aqui uma informação prévia que nós também podemos integrar, que depende daquilo que é a análise do ciclo de vida do produto, e hoje há um conjunto de regras que nós podemos incorporar para fazer o cálculo de emissões associadas a um bem de consumo.

Quais são as vantagens do sistema desenvolvido?

Gonçalo Martins: Sempre que nós desenvolvemos novos módulos ACCEPT, estes são integrados na mesma plataforma comum, uma aplicação industrial pensada para chão de fábrica e laboratórios para fazer o controlo do início ao fim de toda a cadeia produtiva e está lado a lado com o controle da qualidade e o controle da eficiência produtiva. Isso é uma mais-valia que os clientes também apreciam bastante porque têm no mesmo pacote diferentes soluções, não têm uma solução específica para um problema e outra específica para o outro. Com o crescimento do ACCEPT, apesar de termos começado por um âmbito muito específico, temos alargado e é uma das mais valias que o ACCEPT permite. Por exemplo, na questão da monitorização dos consumos das máquinas, eles podem estar a produzir um determinado produto e em tempo real estão a ver não só os tempos e as quantidades e a eficiência da máquina, mas também a energia gasta e, eventualmente, depois traduzir isso na questão do CO2. O facto de estar integrado na nossa plataforma de base industrial é uma mais-valia também muito grande, porque permite-nos cruzar diferentes mundos que dificilmente seriam possíveis em tempo real.

Cristina Barros: Nós, por exemplo, temos desenhado uma série de ecrãs para estarem no chão de fábrica, para que as empresas possam perceber como estão a aproveitar as diferentes fontes de energia para conseguirem otimizar este mix energético, ver aquilo que estão a produzir para autoconsumo, o que não tem emissões por via de fotovoltaicos ou por via eólica, e o que estão a consumir da rede elétrica ou da rede de gás. O facto de nós estarmos a mostrar em tempo real como está a ser o seu consumo é extremamente fundamental, porque nós só conseguimos controlar aquilo que medimos. Se não estamos a medir, não estamos a ver.

É uma ferramenta para ajudar a diminuir as emissões de CO2?

Gonçalo Martins: O ACCEPT não vai garantir o cumprimento do critério legal, nem vai ajustar o processo, mas vai dar evidências e vai tornar claro como está o processo, que linhas, lotes ou produtos estão a cumprir os critérios legais, quais têm maior variabilidade e permitir às empresas atuar. Isto acontece no âmbito do controle de processo, de controle de eficiência das máquinas e aqui na questão energética é muito semelhante porque garante que as empresas têm os meios para poderem atuar e saber em que áreas tem de mexer.

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