Geração E

Israel: uma guerra mortífera mas sem vitórias

Israel: uma guerra mortífera mas sem vitórias

António Valentim Domingos

Consultor em Public Affairs

Para Israel, o Hezbollah sempre representou uma ameaça real. Atualmente, o grupo tem capacidade para atingir as principais cidades, infraestruturas civis e militares israelitas. Ciente disso Telavive optou retaliar de forma faseada

Passado um ano desde o início da Guerra em Gaza, Israel não alcançou os objetivos que traçou. Gaza é um desastre humanitário, o Hamas não foi derrotado, a guerra alastrou ao Líbano e a probabilidade de termos uma guerra em larga escala no Médio Oriente é elevada.

Após os ataques do Hamas a 7 de outubro, Netanyahu traçou 3 objetivos estratégicos irrealistas para a Guerra em Gaza: desmilitarizar o Hamas e a Jihad Islâmica, resgatar os reféns e impedir que o território voltasse a ser uma ameaça à segurança de Israel. Não alcançou nenhum.

Face a uma clara superioridade numérica e tecnológico-militar, porque é que Israel ainda não alcançou os seus objetivos?

Sem dúvida que o exército israelita enfraqueceu a capacidade militar do Hamas, mas não conseguiu erradicá-lo como havia prometido. A guerra convencional de Benjamin Netanyahu falhou. Deveu-se, em parte, a um erro de cálculo brutal quanto à determinação e sobrevivência do Hamas. Israel está a perder, porque estabeleceu objetivos políticos com recurso ao uso da força militar, num território extremamente povoado onde a sua presença não é bem-vinda.

O Hamas não vencerá Israel por ser militarmente superior, mas sim porque o não-regresso dos reféns dificulta a posição de Telavive em afirmar que a operação em Gaza foi um sucesso. Netanyahu cometeu um erro colossal quando o afirmou, ainda que a sua sobrevivência política dependa disso.

Israel cometeu o mesmo erro em 2006, quando o Hezbollah atacou uma patrulha de soldados israelitas na fronteira com o Líbano e capturou dois soldados. Dias depois, o então Primeiro-Ministro israelita, Ehud Olmert, anunciou uma guerra rápida contra o grupo terrorista e prometeu o resgate dos militares. Bastou ao Hezbollah esconder os prisioneiros, para que Israel nunca pudesse reclamar uma vitória, ainda que tenha terraplanado o sul do Líbano.

Apoiado pelo Irão, o Hezbollah, surgiu durante o caos da Guerra civil libanesa (1975-1990), para resistir à invasão das tropas israelitas no sul do Líbano em 1978 e 1982. Desde o ataque de 7 de outubro, o Hezbollah lançou uma guerra não provocada de baixa intensidade contra Israel tendo obrigado ao deslocamento para sul de 60 mil civis israelitas. Tanto o Hezbollah como o Irão acreditavam que Telavive hesitaria em entrar novamente num conflito direto com o grupo.

O que mudou no cálculo estratégico israelita?

Para Israel, o Hezbollah sempre representou uma ameaça real. Atualmente, o grupo tem capacidade para atingir as principais cidades, infraestruturas civis e militares israelitas. Ciente disso Telavive optou retaliar de forma faseada.

Começaram por neutralizar as comunicações do Hezbollah através de ataques aos sistema de pagers e walkie-talkies, seguindo-se a destruição de depósitos de armamento. A 27 de setembro, Israel atingiu o complexo onde se encontrava o líder Hassan Nasrallah e grande parte dos comandantes secundários, desarticulando temporariamente a liderança do grupo xiita. Esta ofensiva permitiu às tropas israelitas ganhar uma vantagem tática inicial, abrindo caminho para a incursão terreste limitada, atualmente em curso.

O alastramento da guerra ao Líbano e escalada crescente entre o Irão e Israel, resultante do ataque iraniano de 1 de outubro, em retaliação às mortes de Ismail Haniyeh, líder político do Hamas assassinado em Teerão, e de Hassan Nasrallah, pode atirar os dois países para um conflito direto e arrastar o Médio Oriente para uma situação ainda mais dramática. Resta saber a dimensão da resposta de Israel ao Irão.

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