Geração E

Israel - Hamas: uma no Cravinho e outra na brandura

Aqueles que se posicionavam contra tudo o que é radical não estão a ter grande pudor em apoiar a escalada

O Ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, foi entrevistado na CNN no último sábado e declarou que considerava "importante que não haja uma matança descontrolada de palestinianos em Gaza". Ou seja, conclui-se que Gomes Cravinho não se opõe à matança per se; solicita apenas que a que ocorrer seja controlada.

O homem que tutela as relações externas do país prossegue, revelando que, numa conversa com o seu homólogo israelita, sublinhou a "importância de se evitarem - ou de se minimizarem - perdas de civis". É uma correção significativa. Evitar? Calma, isso é pedir muito. Pronto, minimizem.

Cravinho é uma espécie de nutricionista do emagrecimento de populações. "O senhor tem de cortar os hidratos! Vá, basta reduzir". É também relevante que o termo utilizado seja "perdas" e não "assassinatos". E que, nessa mesma entrevista, tenha falado em "momento militar" e não em "crimes de guerra".

A frase mais reveladora de Cravinho incluiu uma conjugação do verbo condenar. Só que, em vez indesculpavelmente sucedida de um "mas"; compreensivelmente precedida de um "não". Disse Cravinho, "eu não quero condenar Israel por aquilo que se pensa que possa vir a ocorrer". Portanto, passámos muito rapidamente do "e tu, não condenas?" para "longe de mim condenar". Mais, o MNE não só não condena, como não estabelece um limite temporal ou material para a sua não-condenação. É uma carta branca. Isto não é diplomacia, é mesmo só maciez.

Estamos perante a inversão do argumento do "mas". Primeiro, "não podemos condenar violência com um mas". Agora, "não condeno a violência, mas façam o favor de levar a cabo somente a chacina que seja estritamente necessária".

Durante uma semana, imputou-se justamente radicalismo àqueles que não condenaram sem reservas o assassínio de inocentes israelitas. Neste momento, considera-se que condenar sem reservas o assassínio de inocentes palestinianos talvez seja radicalismo. "Terraplenem, mas na desportiva". Por falar em desporto, aqueles que se posicionavam contra tudo o que é radical não estão a ter grande pudor em apoiar a escalada.

O bárbaro massacre de dia 7 e a desumana retaliação que está em curso podem representar as primeiras nuvens de uma intempérie sem precedentes naquela região. É capaz de não ser boa altura para pôr roupa a lavar - sobretudo, se for uma máquina de branqueamentos.

Por outro lado, talvez não seja justo censurar João Gomes Cravinho por estar a ignorar os sinais. É provável que ande a dormir mal por causa de outra Tempestade Perfeita

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