BE. Catarina decreta novo mapa político à esquerda (com ganhos ao PCP)
O Bloco ensaiou no fim da campanha e levou à cena na noite eleitoral o discurso do “novo mapa político à esquerda”. Mas face ao PS, até está ligeiramente mais longe. Crescimento só em relação ao PCP. Tréguas entre bloquistas e comunistas com os dias contados?
No quartel-general do BE, antes das projeções dos resultados feitas pelas televisões, ainda se acreditava na eleição do terceiro eurodeputado (Sérgio Aires). Seria sempre à tangente - tal como aconteceu há 10 anos com Rui Tavares. Só no dia seguinte às eleições ele viu confirmado o seu mandato, quando foram recebidos os votos da emigração.
Neste domingo, minutos antes da intervenção de Catarina Martins, que no penúltimo dia de camanha pedira expressamente o voto para Sérgio Aires, já o Bloco havia despertado para a realidade. O “reforço da representação”, único objetivo efetivamente fixado, seria conseguido, mas apenas com a eleição de José Gusmão.
Mesmo assim, perante os resultados, a líder do Bloco cantou vitória: "O Bloco cresceu em percentagem de votos e cresceu em todo o território, do Norte a Sul, do Litoral ao Interior, e é hoje a terceira força política do país". A lista liderada por Marisa Matias passou de cerca de 150 mil votos nas últimas europeias para mais do dobro neste domingo.
Catarina Martins, reiterando o que já havia dito Marisa Matias na noite eleitoral, afirmou mesmo que os resultados “reconfiguram o mapa político” português.
António Pedro Ferreira
Ora o mapa político que o Bloco diz alterar-se não é muito diferente daquele que foi traçado nas legislativas de 2015 – no qual o BE já foi a terceira força política na contagem de votos, a seguir à coligação PSD/CDS e ao PS.
No jogo de forças da esquerda, levando em conta os resultados dessas legislativas (quadro de referência para analisar o atual panorama político e perspetivas as legislativas de 6 de outubro), o Bloco até vê fugir-lhe o PS.
Há quatro anos, os bloquistas tiveram uma votação na casa dos dois dígitos (10,19%). Agora passaram para 9,81% (quando falta contar os dados de 9 consulados). Para aumentar o ‘gap’, o PS subiu cerca de um ponto percentual, estando agora com 33,38% (ainda sem os resultados totais da emigração).
No discurso às dezenas de apoiantes que estavam no Teatro Thalia, Catarina Martins salientou a “derrota da direita” e meteu todas as fichas nas mãos da esquerda.
"Este país percebe que a disputa das soluções concretas para a vida das pessoas, a disputa política, está na esquerda, nos projetos que a esquerda tenha capacidade de apresentar", disse.
António Pedro Ferreira
“Em nenhumas das grandes questões” em que “o debate está em aberto - emprego, a saúde, as pensões, a habitação, o clima – será a direita a dar resposta. É a esquerda que vai decidir esse debate”, acrescentou.
Esse desafio não é para um tempo longínquo nem para lugares incertos. Ele será travado, afirmou a coordenadora do BE, "no Parlamento Europeu, seguramente, e na Assembleia da República também, no tempo que ainda temos".
Ou seja, Catarina Martins remete a aplicação do novo mapa político já no imediato e para o Parlamento nacional. Ora isso vai colocar em confronto bloquistas e comunistas, estes os grandes perdedores à esquerda (viram fugir quase 200 mil votos).
Quando lançou no último dia de campanha a previsão de novas coordenadas à esquerda, o Bloco pensava numa votação superior e tinha em mente uma aproximação ao PS. Esta não se verificou e uma nova correlação de forças só acontece com o PCP. Até aqui, os pratos da balança estavam nivelados, mas agora ficam desequilibrados.