A presidente da TAP, Christine Ourmières-Widener, esteve reunida com membros do grupo parlamentar do Partido Socialista e elementos do Governo um dia antes de ter ido ao Parlamento ser questionada, pela primeira vez, sobre a indemnização de 500 mil euros para que Alexandra Reis saísse da administração da empresa.
Esse encontro foi a 17 de janeiro, um dia antes da audição parlamentar em sede de comissão de Economia, segundo denunciou o deputado da Iniciativa Liberal Bernardo Blanco na audição desta terça-feira, 4 de abril, na comissão parlamentar de inquérito à TAP.
Christine Ourmières-Widener começou por não ter a certeza e pediu para consultar a sua agenda, onde acabou por encontrar as indicações de que a reunião teve lugar. Houve membros do grupo parlamentar, bem como elementos do governo “juniores”, ou seja, não governantes, mas chefes de gabinete e adjuntos, não só do Ministério das Infraestruturas como também dos Assuntos Parlamentares, segundo Bernardo Blanco. A CEO da TAP confirmou que não havia ministros nem secretários de Estado.
Perguntas não foram combinadas, garante
Questionada pelo deputado liberal sobre se houve combinação de perguntas e respostas para a audição, Christine Ourmières-Widener recusou: “Não me lembro de qualquer combinação de perguntas, apenas respondi a questões sobre o processo”.
Nessa audição, a CEO da TAP acabou por nunca responder concretamente se Alexandra Reis tinha sido demitida ou se se tinha demitido (um ponto fulcral já que na altura ainda decorria a avaliação da Inspeção-Geral de Finanças que acabou por considerar o acordo para a saída como indevido).
Se o encontro era ético, a CEO escusou-se a responder a Bernardo Blanco. “Não fiz qualquer julgamento”.
Christine Ourmières-Widener diz que o encontro com o PS e elementos da equipa governamental foi recomendado pelo Ministério das Infraestruturas, não tendo ficado totalmente claro se partiu de Pedro Nuno Santos e da sua equipa, ou já de João Galamba, que em janeiro já tinha assumido a pasta.
Gabinete de Ana Catarina Mendes envolvido
O que se sabe, segundo disse a CEO da TAP, é que é que o convite para a reunião, que ocorreu por Teams, foi enviado por uma adjunta de Ana Catarina Mendes, a ministra dos Assuntos Parlamentares. Também João Bezerra, chefe de gabinete da ministra, estava na lista de convidados para o encontro.
A chefe de gabinete de Galamba na Energia, Eugénia Cabaço, o adjunto de Pedro Nuno Santos, Frederico Pinheiro, foram alguns dos nomes convidados para o encontro - a presidente da companhia aérea não confirmou que estiveram efetivamente presentes, tendo em conta que podem ter recebido o convite, mas não participado.
Na sala, quando o deputado da IL falou, os deputados Carlos Pereira e Hugo Costa, do PS, pegaram nos telemóveis enquanto o tema era discutido.
PSD questiona deputados do PS
No decorrer da audição, o PSD quis saber se algum dos deputados socialistas na comissão de inquérito esteve nesse encontro, que decorreu por Teams, a 17 de janeiro, antes da audição de dia 18 na comissão de Economia, grupo de que fazem parte os deputados Carlos Pereira e Hugo Costa.
“O PSD solicita que, a haver membros do grupo parlamentar que tenham participado, se abstenham hoje de questionar a Eng.ª Christine”, disse Paulo Moniz, do PSD. O Chega, por Filipe Melo, juntou-se a esta posição.
O presidente da comissão de inquérito, o socialista Jorge Seguro Sanches, considerou que não havia qualquer incompatibilidade em relação a este tema, e que não fazia sentido questionar.
Quando chegou a vez do PS começar a fazer perguntas, Carlos Pereira não clarificou a questão: “O PS não está a ser inquirido, não faz muito sentido estas declarações anteriores”. Além disso, insinuou que os outros partidos receberam informação da CEO da TAP. E avançou com as questões à CEO da TAP.
Coordenador do grupo do PS esteve na reunião
Mas a cena não ficou por aqui. Quando chegou o momento para a sua inquirição, o PSD voltou ao assunto. A Christine Ourmières-Widener questionou se reconhecia algum deputado presente na sala que tivesse estado nessa reunião prévia à comissão parlamentar de economia. “Reconheço uma pessoa. Carlos Pereira”. “Pode repetir?”, questionou o deputado. “Carlos Pereira”, disse.
“O grupo parlamentar do PSD não pode permitir que os trabalhos continuem quando aquilo que avisadamente questionámos o sr. presidente antes de passar a palavra ao grupo parlamentar do PS veio a acontecer. Quem interveio foi quem esteve na reunião prévia. Era algo que estávamos a prever, e que o sr presidente benevolentemente permitiu que acontecesse”, declarou o social-democrata Paulo Moniz.
Jorge Seguro Sanches considerou que não se podia atacar o deputado socialista, porque também ele, que integra a comissão de saúde, se reúne com membros da administração de entidades daquela área.
Ex-secretário de Estado não quis Marcelo como inimigo
Outro tema trazido pelo deputado liberal esteve ligado ao Presidente da República, por a TAP ter recebido um pedido de alteração de um voo em que estaria Marcelo Rebelo de Sousa.
Segundo relatou Bernardo Blanco, a CEO enviou um e-mail ao secretário de Estado das Infraestruturas em funções na altura, Hugo Mendes, da equipa de Pedro Nuno Santos, em que pedia a sua opinião em relação à resposta que deveria ser dada – o que pretendia responder era “não”.
Hugo Mendes terá respondido que seria preciso responder afirmativamente à mudança, porque Marcelo podia ser “incómodo”. “Não podemos perder o apoio político do Presidente. Ele é o nosso principal aliado político, mas pode transformar-se no nosso pior pesadelo”, citou o responsável. Christine Ourmières-Widener garantiu que o voo não foi alterado, e que o Presidente arranjou outra solução.
Hugo Mendes demitiu-se na sequência da indemnização de meio milhão a Alexandra Reis com base num acordo que foi considerado indevido pela Inspeção-Geral de Finanças. Na mesma altura, Pedro Nuno Santos demitiu-se de ministro das Infraestruturas.
Em relação a estes temas, a presidente executiva da TAP, demissionária mas ainda em funções, disse que a “pressão política faz parte do negócio”, mas não esperava que fosse tão intensa quando depois verificou. “Foi muito difícil”, qualificou, não só para si, mas para a equipa e para os trabalhadores “manter o foco no dia-a-dia”.
(Notícia atualizada pela última vez às 22h18)
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