IGF desresponsabiliza gestor financeiro e Ministério das Finanças na saída de Alexandra Reis da TAP
Antonio Pedro Ferreira
Pedro Nuno Santos e Hugo Mendes tiveram uma “inegável” intervenção no processo de saída de Alexandra Reis da administração da TAP, mas atuaram acreditando na “conformidade legal”, defendeu o inspetor-geral de Finanças
A TAP fechou um acordo de pagamento de 500 mil euros à sua antiga administradora Alexandra Reis em fevereiro de 2022, sem que o administrador com o pelouro financeiro da companhia aérea tivesse qualquer intervenção nesse processo. A informação foi transmitida pelo líder da Inspeção-Geral de Finanças (IGF), na primeira das audições da comissão parlamentar de inquérito à TAP, que teve lugar esta quarta-feira, 29 de março.
“Quanto ao CFO [administrador com o pelouro financeiro, na sigla inglesa] da TAP, [a conclusão é] que não esteve relacionado com o processo, uma vez que toda a negociação terá ocorrido à margem do conselho de administração e da comissão executiva, não existindo evidência de que o CFO tenha tido conhecimento do mesmo”, disse António Ferreira dos Santos na sua intervenção inicial na comissão de inquérito.
Gonçalo Pires será a segunda pessoa a ser ouvida pelos deputados, numa audição agendada para esta quinta-feira, dia 30. Segundo o responsável da IGF, que realizou o relatório de apuramento de responsabilidades sobre a saída de Alexandra Reis e que esteve na base do afastamento dos presidentes da TAP, o administrador financeiro “não terá tido intervenção no pagamento da indemnização”. “Uma matéria que nos abstemos de qualificar”, disse, acrescentando que a ideia inicial da IGF era que ele, enquanto gestor financeiro, tivesse um papel nesta saída, que não se confirmou.
IGF não apurou se CFO viu tudo
Confrontado pelo deputado do PSD Hugo Carneiro, António Ferreira dos Santos teve de ler a ata da reunião que a IGF teve com Gonçalo Pires (ainda não disponibilizada), em que relatou que o CFO não teve “dúvidas” sobre a saída porque dele não saiu.
“Sobre o pagamento da indemnização: os pagamentos relacionados com recursos humanos são enviados num ficheiro encriptado, pelo que não há conhecimento dos montantes e destinatários”, disse o líder da IGF, admitindo, no entanto, que a entidade de auditoria não apurou se foi o CFO que “carregou no botão” para se processar o pagamento, nem tão pouco se Gonçalo Pires notou uma variação do montante a pagar para perceber os 500 mil euros pagos a Alexandra Reis.
António Pedro ferreira
Sem mais assinaturas comprometedoras
Para a IGF, as entidades às quais é possível assacar responsabilidades são o presidente do conselho de administração, Manuel Beja, e a presidente da comissão executiva, Christine Ourmières-Widener, “o que encontra justificação no facto de ambos serem outorgantes do acordo”. Foi nesse acordo para a saída de Alexandra Reis, que lhe deu direito à indemnização de 500 mil euros para deixar o cargo, que a autoridade de auditoria considera que não era devida compensação em nenhuma situação.
Segundo António Ferreira dos Santos, não existe “outro documento oficial que implique outros intervenientes no processo de tomada de decisão”.
Daí que seja à CEO e ao chairman da TAP que a IGF pede que o Tribunal de Contas faça um apuramento de responsabilidades financeiras, abrindo a porta à aplicação de multas. E foi com base nisso que o Governo determinou o seu afastamento da companhia aérea.
António Pedro ferreira António Pedro ferreira António Pedro ferreira
Sobre o trabalho que fez no âmbito da auditoria, a CEO da TAP foi sempre muito critica da IGF, já que nunca foi ouvida presencialmente, ao contrário do presidente da administração ou de Alexandra Reis, tendo apenas sido pedidos esclarecimentos por escrito.
Sobre este tema, António Ferreira dos Santos disse que um dos motivos para tal audição presencial não ter ocorrido foi a língua, mas lamentou que Christine Ourmières-Widener não tenha pedido que fosse realizada uma audição presencial nem tenha transmitido à IGF as razões pelas quais considera ter saído lesada.
Ministros com “inegável” papel, mas sem culpa
Em relação ao poder político, que a IGF iliba no seu relatório, António Ferreira dos Santos considera que Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas, e Hugo Mendes, secretário de Estado das Infraestruturas, “tiveram uma inegável intervenção no processo”, mas sublinhou que esse papel esteve “revestido num elevado grau de informalidade”.
João Leão, Pedro Nuno Santos e Miguel Cruz
MÁRIO CRUZ/LUSA
Atuaram, disse, com base no “pressuposto de conformidade legal” transmitida pelos presidentes da TAP. “Os membros do Governo envolvidos não tiveram essa preocupação, uma vez que isso lhes foi de alguma forma assegurado, o enquadramento legal nunca sequer foi posto em causa”, disse.
Em relação ao assentimento da tutela, António Ferreira dos Santos considerou que não tem dados que indiquem que houve uma “concordância explícita” ao pagamento da indemnização. Aliás, segundo avançou, há notas que transcrevem a troca de Whatsapp entre membros do Governo, mas “muitas vezes são símbolos” que lá constam.
O gabinete de Infraestruturas liderou este processo, mas não partilhou com as Finanças. Aliás, há uma total absolvição, na lógica da IGF, de João Leão, que era o ministro das Finanças na altura da saída de Alexandra Reis, em fevereiro de 2022, e de Miguel Cruz, o secretário de Estado do Tesouro de então, bem como do atual responsável das Finanças, Fernando Medina. “Mais nenhum membro do Governo teve envolvimento prévio do processo”, comentou.
E tinham as Finanças de saber? “No quadro legal não tinha essa necessidade”, disse António Ferreira dos Santos.
(notícia atualizada às 18h30 com mais informações)
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