Trabalho

Estafetas da Uber, Glovo e Bolt param de novo em protesto contra as plataformas

Estafetas da Uber, Glovo e Bolt param de novo em protesto contra as plataformas
JOSÉ FERNANDES

Falta de condições de trabalho e baixos salários estão no centro da contestação dos trabalhadores de entregas das plataformas Glovo, Uber e Bolt que param esta sexta-feira a partir das 18h

Estafetas da Uber, Glovo e Bolt param de novo em protesto contra as plataformas

Cátia Mateus

Jornalista

Os trabalhadores das plataformas UberEats, Glovo e Bolt voltam a suspender as entregas esta noite, entre as 18 horas e a meia noite, nas principais cidades do país, em protesto por melhores condições de trabalho e salariais. A paralisação foi convocada conjuntamente pelo Movimento Estafetas em Luta e pela União Nacional dos Trabalhadores Independentes por App, através de um grupo de WhatsApp, que conta com mais de 1200 estafetas.Os trabalhadores acusam a Glovo de já ter aumentado o valor do pagamento aos estafetas que decidam trabalhar durante o período para paralisação.

Na base da contestação dos estafetas está a melhoria das condições de trabalho, mas também outras reivindicações. Na lista partilhada no grupo de Whatsapp onde foi convocada a paralisação, e a que o Expresso teve acesso, os estafetas exigem um pagamento mínimo garantido de três euros por qualquer entrega, além de um adicional de 50 cêntimos por cada quilómetro percorrido em distâncias de 2 a 4,9 quilómetros de distância e um euro extra por quilómetro a partir dos 5 quilómetros de distância.

Em declarações ao Expresso, Marcel Borges, porta-voz do Movimento Estafetas em Luta, um dos movimentos que convoca a paralisação, fala numa “paragem pacífica nas principais cidades do país, com o objetivo de chamar a atenção para as condições em que continuam a trabalhar os estafetas no país”. Em Portugal estão registados cerca de 50 mil estafetas a trabalhar para plataformas como a UberEats, Glovo ou Bolt.

Plataformas aumentam pagamento para minimizar adesão

O porta-voz dos estafetas diz não conseguir estimar o número de trabalhadores que poderão aderir a este protesto. Mas realça que "a Glovo já anunciou na app que vai duplicar o valor pago aos estafetas durante o horário do protesto, e as outras plataformas deverão fazer o mesmo, o que pode desincentivar a adesão". Situação que Hans Melo, porta-voz da União Nacional de Trabalhadores Independentes por App, já tinha também denunciado em declarações ao Jornal de Notícias, referindo que os multiplicadores que definem o valor a pagar por entrega já estavam, ao início da manhã, em mais do dobro na Glovo e que o mesmo deveria replicar-se à Uber e à Bolt.

Questionada pelo Expresso, a Glovo remeteu esclarecimentos para a Associação Associação Portuguesa das Aplicações Digitais (APAD), que agrega as várias plataformas a operar em Portugal. Numa nota enviada por e-mail, a APAD não comenta a acusação dos estafetas relativa ao aumento do valor por entrega a pagar aos estafetas esta noite, referindo apenas que respeita “o direito que todos têm de se manifestar, com respeito pela segurança e ordem públicas”.

Diz ainda que “a flexibilidade dos serviços prestados pelas plataformas permite aos estafetas utilizar as aplicações quando, onde e como quiserem” e que "as plataformas digitais a operar em Portugal ouvem constantemente os estafetas, e continuarão a fazê-lo, de modo a melhorar a sua experiência”. Algo que os movimentos contestam: “Ninguém chama os estafetas para conversar. Os estafetas não são ouvidos”, acusa Marcel Borges.

Alterações à lei intensificaram contestação

Recorde-se que com as alterações legislativas aprovadas em maio de 2023, nomeadamente a criação de um novo princípio de presunção de laboralidade aplicado às plataformas digitais, as plataformas alteraram o seu modo de funcionamento. Uma das alterações introduzidas foi a eliminação da obrigatoriedade que vigorava em algumas plataformas do estafeta ter de registar previamente o horário em que estaria ativo e a fazer entregas.

Esse pré-registo era um dos fatores que podia influenciar o multiplicador usado para definir o valor a pagar ao estafeta por serviço. Tipicamente em momentos em que o número de estafetas disponíveis fosse mais reduzido, o multiplicador poderia aumentar. Esse pré-registo deixou de existir, mas as plataformas continuam a ter acesso a métricas de atividade que lhes permitem antecipar picos de pedidos, como os que normalmente ocorrem às sextas-feiras à noite e sábados podendo assim ajustar o multiplicador em função dos fluxos previstos.

A par com as alterações legislativas, a luta dos estafetas que fazem entregas para as plataformas digitais têm-se intensificado no país. Há um mês estes trabalhadores protagonizaram outra paralisação e os movimentos que estão por detrás destas paragens garantem que a luta vai continuar. Pedem uma transformação profunda do sector, com reforço das condições de trabalho e salariais dos profissionais.

Recorde-se que desde maio de 2023 o Código do Trabalho passou a prever um leque específico de indícios de presunção de laboralidade (mecanismo de reconhecimento da existência de contrato de trabalho) para trabalhadores das plataformas digitais. Na sequência da aprovação da nova lei, a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) levou a cabo uma ação inspetivade âmbito nacional que originou mais de 800 notificações de reconhecimento de contrato de trabalho às plataformas, com vista à integração destes trabalhadores. As plataformas têm contestado e os processos acumulam-se em tribunal.


Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: cmateus@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate